USP: Linha de pesquisa analisa os efeitos ambientais da pesca

Objetivo é reverter prejuízos causados pelo "manejo monoespecífico", que se preocupa apenas com a espécie alvo da pesca

seg, 15/05/2006 - 20h01 | Do Portal do Governo

O Instituto Oceanográfico (IO) da USP está implementando uma alternativa para estudos sobre a pesca. Trata-se da “abordagem ecossistêmica”, uma linha de pesquisa que irá analisar como a pesca altera o ecossistema, e vice-versa. Essa proposta avalia as populações de animais marinhos sujeitos à exploração como um todo, ao contrário do chamado “enfoque monoespecífico”, que leva em conta apenas a espécie alvo da pesca. Essa nova modalide de estudo teve início no IO em outubro de 2005, sob a coordenação da professora Maria de los Angeles Gasalla.

Segundo a professora, cerca de 75% dos estoques pesqueiros do mundo estão comprometidos. “Isso mostra que há uma grande diminuição das populações de recursos pesqueiros, trazendo prejuízos ambientais, sociais e econômicos”. Ela explica que o enfoque monoespecífico tradicional não leva em consideração os efeitos da pesca em determinados locais sobre as demais espécies (influências sobre a cadeia alimentar, por exemplo). “Há chances de que os prejuízos causados pelo manejo (gestão da pesca) monoespecífico não sejam revertidos”, alerta.

Maria conta que, no mundo, tem havido um aumento na aplicação da abordagem ecossistêmica, tanto em análises e estudos quanto no manejo da pesca. “Trata-se de algo relativamente novo em termos de implementação. Começou em fins da última década, com a experiência australiana. Atualmente vários países têm feito esforços para inserir esse tipo de abordagem na legislação e no manejo da pesca, com bons resultados iniciais. No Brasil, isso ainda não ocorre.”

Ela destaca que o impacto da sobrepesca e das alterações nos ecossistemas não é apenas ambiental, mas também sócio-econômico: a diminuição de determinadas populações de peixes acaba afetando as pessoas que vivem da pesca dessas espécies e, com isso, o mercado consumidor.

Pesquisas no IO

Em seu doutorado, concluído em 2004 na USP, Maria estudou os impactos da pesca sobre o ecossistema da plataforma sudeste do Brasil. Durante suas análises, além da modelagem do ecossistema pesqueiro e da simulação de diferentes cenários de pesca, ela entrevistou pescadores e concluiu que suas percepções sobre as alterações nos ecossistemas (lembranças sobre uma espécie que não é mais encontrada, por exemplo) têm grande utilidade para as pesquisas na área. “Propomos que o manejo seja adaptativo e cooperativo. Adaptativo porque é um processo de aprendizagem. Cooperativo porque deve ser feito em conjunto entre o setor pesqueiro, os órgãos de gestão e os cientistas.”

No recém-fundado Laboratório de Ecossistemas Pesqueiros (LabPesq) do IO, o objetivo é desenvolver metodologias e formas de análise para esse novo tipo de abordagem. “Os estudos tentam, primeiramente, resgatar e integrar o que se sabe a respeito de um dado ecossistema pesqueiro”. As análises se concentram em um ecossistema de cada vez, tentando entender como seus elementos (fauna, flora, ambiente físico e frotas pesqueiras) interagem, para em seguida avaliar, por meio de modelos matemáticos, quais as possíveis ações a serem tomadas para evitar prejuízos. Inicialmente, os estudos devem se concentrar no ecossistema marinho que engloba as regiões Sudeste e Sul do Brasil.

Como exemplos de ações para diminuir os prejuízos causados aos ecossistemas, Maria cita a criação de áreas marinhas pesqueiras protegidas, em que a pesca possa ser suspensa durante um certo período para permitir a recomposição das populações de peixes; a inserção de observadores a bordo das frotas pesqueiras; e medidas que facilitem o escape das espécies que não são alvo da pesca, mas que acabam sendo capturadas pelas redes.

Flávia Souza

Da Agência USP