Trechos da entrevista coletiva do governador Mário Covas após solenidade no Palácio dos Bandeirantes

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sex, 18/08/2000 - 15h32 | Do Portal do Governo

Trechos da entrevista coletiva do governador Mário Covas concedida nesta sexta-feira, dia 18, no Palácio dos Bandeirantes, após assinatura do decreto que cria a medalha ‘Lauro Ribas Braga’ e entrega dos trabalhos pelos vencedores do concurso ‘Governador por um dia’.

BNDES

Repórter: O presidente do BNDES esteve ontem com o senhor aqui. Na saída, ele falou conosco e citou especificamente o pedido do Estado de São Paulo de financiamento para o Rodoanel de R$ 180 milhões, mas não falou sobre as importâncias para a CPTM e para o Metrô. Como o senhor considera esse encontro?

Covas: Eu considero bom. Ele acrescentou para mim o que era importante. Acrescentou no sentido de que o problema do Rodoanel avançou. Nós fizemos também uma consulta para o Banco Central. O Banco Central concordou com a operação. Portanto, aparentemente, é uma operação que vai ter 45 dias pela estimativa deles. Tem uma série de implicações, se trata de uma venda de recebíveis. Isso exige audiência pública, depois exige estudo da matéria. Mas de qualquer maneira você tem assegurado uma importância que nos deixa durante algum tempo mais tranquilos. Sobretudo em face do fato de que o governo municipal não paga a parte dele. As outras coisas eram referentes ao Metrô e ao CPTM e aí há regras fixadas pelo Banco Central relativas ao grau de endividamento. E portanto, no BNDES até que as solicitações são passíveis de atendimento, mas eu tenho a impressão que elas esbarrarão no Banco Central. É a opinião dele, embora essa seja alguma coisa para ser aprovada. No BNDES as operações são operações factíveis, uma delas é uma aditamento até num contrato já existente. Mas como tanto Metrô como CPTM não são empresas independentes do Tesouro – a Sabesp é uma empresa independente do Tesouro – a CPTM e o Metrô recebem subsídios do Tesouro, então na medida que elas se endividem, entra o problema do endividamento do Estado. Eu não sei, porque a gente paga tanto de dívida e está sempre lotado no que se refere a endividamento.

Repórter : O doutor Francisco Gross está mais otimista que o senhor. O senhor falou em 45 dias e ele falou em 10 ou 15 dias.

Covas: Dez ou quinze dias é a parte dele. Porque eles têm que aprovar em diretoria, depois é que eles mandam para o Banco Central. E nós, por outro lado, vamos ter de fazer uma audiência pública, uma concorrência, portanto, nós vamos ter de fazer todas as etapas. Supondo que não aconteça nada, em 45 dias a gente pode ter o recurso disponível.

Segurança Pública

Repórter: Governador, falando em Segurança, o secretário Petrelluzzi falou que a imprensa divulga muito mais os crimes do que a solução dos crimes. Isso pode criar um certo termo de insegurança. Aí eu falei: “A gente se sente inseguro nas ruas”. Ele falou: “Mas diminuiu a criminalidade e eu não sou o secretário da sensação”. Porque eu falei que a sensação crítica nas ruas era de insegurança, mesmo ele falando que diminuiu 30% o crime. O que o senhor acha disso?

Covas: Porque é isso mesmo. É o que eu acabei de dizer: uma coisa é segurança, outra coisa é violência. Nós estamos numa situação em que a polícia melhorou, portanto a segurança melhorou, e a violência aumentou. Parece paradoxal? Não é paradoxal. Eu já falei para vocês várias vezes esses números. A polícia prendia duas mil pessoas, hoje prende 10 mil. Ela não dobrou, ela multiplicou por cinco aquilo que ela fazia. Nós tínhamos 55 mil presos e hoje temos 90 mil presos como consequência desse fato. A polícia hoje está equipada com tudo o que você possa imaginar.

Repórter: O senhor concordaria por exemplo com o discurso do general Cardoso que falou que era uma coisa de planejamento familiar?

Covas: Não, não acho que é planejamento. A idéia de planejamento familiar faz com que a população cresça mais depressa. Mas onde a população cresce muito é na área mais pobre, indiscutivelmente. Eu não acredito em controle de natalidade. Eu acredito em planejamento familiar no sentido de que a família decide o que deve ter de filhos. Não dá para você dizer as pessoas que elas devem ter um filho, dois filhos, três filhos. Você pode dar a ela instrumental para ela decidir. Você pode dar conhecimento, medicamento, preservativos, você pode dar uma porção de coisas, mas a decisão sobre os filhos que quer ter essa é da família. Você não pode tirar isso. Isso traz problemas? Bem, você tem de enfrentar os problemas e o problema não é evitar que a família decida quantos filhos quer ter.

Repórter: O senhor acha que a imprensa está em que papel? O secretário criticou. Acha que a imprensa dá muito espaço para os crimes e isso acaba criando essa sensação de insegurança. O senhor concorda?

Covas: Não, não. A sensação de insegurança existe mesmo. As pessoas andam na rua e andam com medo. E andam com medo por efeito-demonstração. Não dá para você evitar que isso ocorra porque você não publicou o que acontece. Eu acho muito pior é você publicar mecanismos por exemplo de controle da violência. Por exemplo, você monta um esquema num pedágio. De repente sai uma reportagem na televisão mostrando como é o esquema. No dia seguinte acabou o esquema porque qualquer pessoa que chega lá destrói esse esquema. A primeira coisa que faz é desmontar o esquema. Então, há certas coisas que podem perfeitamente ser evitadas. Agora, divulgar o que há de crime e até mais do que há de crime, o que há de não crime, eu não acho que isso seja um problema grave, não. Eleva, lógico. Se você está vendo muito crime e se é verdade que existe muito crime, não há como evitar que isso chegue a conhecimento público e que isso influencie as pessoas.

Repórter: Até porque hoje o boca-a-boca é muito forte. Cada vez mais a violência está chegando perto da gente, é num vizinho, é num parente, é num colega de trabalho.

Covas: Sim, é verdade. Agora, você não resolve violência apenas com aparelho de segurança. É preciso distinguir bem isso. Segurança é uma coisa, violência é outra. Você pode melhorar a segurança e aumentar a violência. E é o que está acontecendo aqui em São Paulo.

Febem

Repórter: O senhor acha que os municípios, as prefeituras, de alguma forma poderiam ajudar o Governo do Estado? De que forma? E ainda sobre algumas críticas feitas pelo secretário Ortega ao prefeito Celso Pitta. O prefeito, nas últimas inaugurações essa semana, tem dito que essas inaugurações de escolas, centros de convivência são respostas da prefeitura ao Governo do Estado de que ele não teria responsabilidade sobre a situação da Febem como disse o secretário Ortega e que o Governo deveria fazer a parte dele.

Covas: Olha, só quem faz a parte dele é o Estado. A Febem para deixar de ter esse problema, e esse negócio de dizer que a Febem é uma fábrica de criminosos não é verdadeiro. Ninguém chega na Febem porque pediu para entrar lá dentro, porque bate na porta e disse quero dormir e comer aí. Chega lá dentro porque a Justiça julgou e determina ao Governo que mantenha esse adolescente em regime de privação de liberdade. Portanto, o crime que ele fez, seja ele de que natureza for, foi feito antes da Febem. Agora, como é que você evita isso? Evita isso com prevenção e prevenção quem faz é são os municípios. O município aqui de São Paulo não faz nada. Nada. O Maluf não fez nada nessa área. O Maluf fez túnel para atender a classe alta e porque isso dá Ibope. Porque eu pego a televisão e vou filmar a inauguração de um túnel, mas eu não vou filmar a inauguração de uma creche lá na Zona Leste de São Paulo. Não tem culpa de fazer isso. É natural. Ninguém se interessa por uma creche na Zona Leste a não ser as mães que moram naquele bairro. Então se toma muito pouco conhecimento disso. Mas não fez mesmo. O pessoal fala de Nova York, que agora virou moda, mas Nova York, antes de entrar a tolerância zero, entrou um prefeito que botou em cada bairro de Nova York, cada bairro não, em cada quarteirão de Nova York uma quadra de basquete para a molecada jogar, um tipo de lazer que evite que o menino por falta de alternativa se meta no risco. A prefeitura tem muito para fazer. Agora, comparar o que a prefeitura faz com que o Estado faz nessa área ou em qualquer outra área é um absurdo. Se a prefeitura está sendo presidida por alguém extremamente incompetente, não dá nem para discutir com ele. Inaugurar um centro de convivência e uma escola. Sabe quantas salas de aula o Estado já fez? Sete mil salas de aula. Ninguém sabe disso. E não precisa ir em cada sala de aula que inaugura e dizer que o Pitta não faz. E ele não faz mesmo. Porque é de uma escola que não é de fazer escola, não é de fazer creche, não é de fazer obra social. É de fazer outra coisa. É de fazer obra que custa muito e que tal e qual a Água Espraiada é paga pelo dobro do que custou.

ICMS

Repórter – O que o senhor acha da decisão do Confaz de diminuir a alíquota do ICMS nos combustíveis?

Covas – Não vai fazer isso.

Repórter – Já fez, governador.

Covas – Não, o Confaz só decide por unanimidade. De jeito nenhum. Ora, tem sentido? Já nos tomaram pela Lei Kandir o ICMS na exportação. Eu já diminui o ICMS em mais de 50 produtos. Ao mesmo tempo eu vejo aquela figura ínclita, com aquela gravata assim torcida, falando na televisão que vai fazer quem recebe menos de 900 pratas por mês pagar imposto de renda?

Repórter – O senhor se refere ao Everardo Maciel?

Covas – Ao Everardo Maciel, isso.

Repórter – Ele fala que a Reforma Tributária já aconteceu de forma silenciosa.

Covas – De forma silenciosa. Para ele, reforma tributária é aumentar imposto porque ele só aumentou a arrecadação do Governo Federal porque só fez aumentar imposto. Aliás, ele disse isso numa entrevista outro dia aqui que tinha aumentado 35% ao imposto de renda. Agora não serve mais. Ele quer ampliar os contribuintes. Quais? Aqueles que aplicam no mercado financeiro e que são isentos de pagar? Não. Quer quem é assalariado, que ganha menos de 900 pratas e que não tem jeito nem de evitar porque já é descontado na fonte.

Repórter – O senhor vai apoiar essa tese que está em discussão na Assembléia Legislativa para retomar o controle do Banespa para o Estado?

Covas – Primeiro que tudo, quando eu assumi eu até tentei retomar o controle. Eu tinha que pagar 50% da dívida. Pois, eu mandei para a Assembléia um projeto que até foi aprovado. Só votou contra o PT. O PT inteiro votou contra a retomada do Banespa através de uma negociação. Mas foi aprovado pela Assembléia. Só que ficou tanto tempo no Senado que a dívida foi aumentando e no fim já não dava para pagar. Agora, o que adianta a Assembléia mandar retomar? Para mandar retomar precisa pagar o que deve.

Repórter – Então, o senhor é contra?

Covas – Não, não é que sou contra. Não vejo como. A não ser que se deixe de pagar salário para todos nós, salários do Executivo, do Legislativo, do Judiciário, de todo mundo.

Repórter: Voltando à questão do ICMS dos combustíveis…

Covas: A cobrança desse imposto sempre foi feita por um contribuinte substituto, que era a Petrobrás. Mas o preço final não é o da Petrobrás, é o do posto. Portanto você tem um preço que era a diferença entre o preço da Petrobrás e do posto, que era um preço estimado. Esse preço que estava superestimado. E esse preço está sendo readaptado. Mas não houve nenhuma diferença da alíquota, não. Paga a mesma coisa. Foi feita uma pesquisa com a participação da área Federal, da área Estadual de todos os estados e verificou-se que esse preço apresentava defasagem. Esse preço estimativo. Você sabe por quanto a Petrobrás vende, mas são milhares de postos e cada um vende por um preço. Você tem portanto uma diferença. O imposto que a Petrobrás paga é sobre o preço final, não sobre o preço dela, portanto, o preço final tem de ser estimado. O que houve foi uma reestimativa desse valor, mas a alíquota não teve alteração.

Repórter: Mas para maior ou para menor?

Covas: Para menor. Mas a diferença não é grande.

Repórter: O senhor falou que não ia concordar com a diminuição da alíquota?

Covas: Combustível, eletricidade, telefone, comunicação. Os produtos que representam quase 35% da arrecadação do Estado.

Repórter: Não vai aceitar diminuir a alíquota?

Covas: São Paulo no Confaz não vota nada disso. Não sei se outros estados votam. São Paulo não vota.

Unificação das polícias

Repórter: O (inaudível) disse que é contra a unificação das polícias. O que o senhor acha disso?

Covas: É diferente do meu ponto de vista. Não tenho nada para achar. Ele tem o mesmo direito que eu de ter o ponto de vista. Eu sou a favor da unificação das polícias. Não é porque eu seja contra a Polícia Militar nem contra a Polícia Civil. Pelo contrário. Mas eu acho nós devíamos ter uma só polícia de compleição civil. Podia ter gente fardada, não tem problema. É como você vê nos Estados Unidos. Você tem dentro de um Distrito Policial gente à paisana e gente fardada. Você faz conviver as duas. Você tem um comando só, você tem uma regra só. Aqui nós temos duas instituições, cada uma delas funciona sob uma hierarquia diferente. A Polícia Militar funciona sob regras militares, horários diferentes, hierarquia diferente. A Polícia Civil também. Nem sempre esse sistema permite complementação. Eu prefiro, tanto isso é verdade que eu aprovei para o presidente uma reforma constitucional nessa direção. Agora, todo mundo tem direito de ter uma opinião a respeito disso.

Repórter: O senhor mandou para o presidente essa reforma. Como é que está esse processo?

Covas: Quando eu mandei para o presidente ele mandou para o ministro da Justiça, que nessa época era o de Goiás, o Íris. O Íris mandou uma emenda constitucional para o Congresso que ainda está lá dentro do Congresso desconstitucionalizando o problema da polícia, ou seja, deixando para cada Estado resolver como quisesse. Mas eu tenho que nem isso passa. O lobby é muito forte nessa área.