Segurança: Novos equipamentos aperfeiçoam perícias do Instituto de Criminalística

Em 2005, foram atendidos mais de 600 mil casos e realizados cerca de 6 milhões de exames periciais em todo o Estado

seg, 27/03/2006 - 11h33 | Do Portal do Governo

Em 2005, foram atendidos  mais de 600 mil casos e realizados cerca de 6 milhões de exames periciais em todo o Estado

Tarde de 14 de março, viatura do Instituto de Criminalística (IC) abre caminho entre o trânsito da Marginal Pinheiros e demais vias. O destino é a Escola Coronel Luís T. de Brito, no Campo Limpo, onde ocorreu furto de computadores. No veículo, a perita criminal Karin Kawakami de Vicente, o fotógrafo Marcelo Naves e o papiloscopista Anderson Morais Santos. Esses profissionais integram a Equipe de Perícias Criminais (EPC) Oeste do IC do Estado de São Paulo, vinculado à Superintendência da Polícia Técnico-Científica, da Secretaria da Segurança Pública.

Em infrações penais como furto que deixaram marcas de arrombamento ou escalada, acidente de trânsito com vítima, homicídio ou suicídio (em que sempre há vestígios), é imprescindível a realização de perícia criminal. E esse tipo de serviço, em âmbito estadual, está a cargo do IC. Para aperfeiçoar esses trabalhos, o instituto acaba de receber novos equipamentos laboratoriais, 272 viaturas e reúne no seu quadro mais 159 peritos criminais, aprovados em concurso público. Obteve, no ano passado, 250 maletas especiais para facilitar as atividades de suas equipes de perícia criminal nas cenas do crime.

Inúmeros casos para serem periciados chegam diariamente às várias EPCs, via Intranet da Polícia Civil do Estado. Na EPC Oeste, por exemplo, são realizadas por dia, em média, oito perícias, “mas chegamos a fazer 15”, comenta a perita Karin. Nesta terça-feira, são – fato raro – dois casos, entre os quais o do Campo Limpo. A distância entre a base da equipe, no Butantã, e o destino é vencida em poucos minutos. A rapidez se explica pela necessidade de encontrar o local ainda preservado, ou seja: como estava no momento do delito.

“É a terceira vez que venho a essa escola”, diz a perita. Em fevereiro, os ladrões entraram pela sala de informática. Agora, arrombaram a grade e a janela da sala dos professores, alcançando o corredor interno e as alas de administração e da secretaria. Quem apura como foi o acesso dos criminosos, e onde há prováveis digitais, é a perita criminal. Passo a passo, tudo é documentado pelo fotógrafo.

Sobre a tela escura de um dos monitores deixados na sala dos educadores, o papiloscopista aplica (com um pincel de penas) pó branco acetinado. Daí, verifica a existência de digitais com o auxílio de uma lupa, embora não as encontre. Inspeciona também a janela da sala dos professores, mas as impressões lá deixadas estão falhas, não há os 12 pontos característicos necessários. Karin explica que não pesquisam tudo: “A perícia só é feita onde, provavelmente, o criminoso tenha feito contato.” Da sala da secretaria, levaram o monitor do computador, mas deixaram a base. Sobre ela foi aplicado pó acetinado preto, mas, novamente, não há sinal de digitais.

Na janela interna da secretaria, o papiloscopista constata fragmentos de digitais de dedo, além de uma impressão palmar. Embora o Estado não disponha de arquivo para esse tipo de identificação, ela é colhida para ser confrontada com a de eventual suspeito encontrado. A coleta dessas impressões é feita com fita adesiva comum (no caso de impressão palmar, utiliza-se as mais largas). Sobre a digital adere-se a fita que, a seguir, é transportada para uma lâmina de vidro. Na base da EPC Oeste, a impressão é passada para outra fita e encaminhada para análise no Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt (IIRGD).

Trabalho pronto, a viatura da equipe abre caminho novamente no meio ao trânsito para chegar ao bairro de Pirituba, onde é solicitada perícia para constatação de danos em um muro. Às 17h04, na Marginal Pinheiros, próximo ao bairro da Lapa, há inversão de rota, após o recebimento de uma chamada. A equipe volta à base no Butantã, embarca o desenhista Victor Martinelli e dirige-se à Avenida Rebouças, esquina com a Rua Joaquim Antunes, em Pinheiros, onde houve atropelamento com morte.

Às 17h19, os profissionais estão no local. O primeiro procedimento é liberar o corpo. Por isso, perita e papiloscopista logo examinam a vítima – uma senhora – para verificar as partes fraturadas. Na dianteira do ônibus, a marca do impacto da cabeça contra o vidro. Os profissionais medem a altura do ponto de impacto, comparando-a com a estatura da vítima. Enquanto isso, o desenhista faz um croqui da área, para representação gráfica do entorno e demais aspectos, e o fotógrafo registra cada detalhe, inclusive do corpo.

Antes de concluir o trabalho, os peritos observam se há marcas de freadas na pista e coletam o disco de tacógrafo, para conferir a velocidade do veículo no momento do acidente. Todos esses dados vão embasar o inquérito policial. Depois disso, o grupo retoma seu trajeto em direção a Pirituba.

Obrigação do Estado – De acordo com o artigo 158 do Código de Processo Penal, a perícia criminal é obrigação do Estado, informa José Domingos Moreira das Eiras, diretor do Instituto de Criminalística. A atividade consiste no levantamento de provas ou indícios de crimes, basicamente nos próprios locais de delito, além de pesquisas e outros procedimentos em laboratório. Abrange áreas como crimes contra o patrimônio (roubos, estelionatos e outras fraudes), contra a pessoa (homicídios e lesões corporais), ambientais, fiscais, de informática, de natureza sexual e adulterações diversas (de chassis de veículos, documentos e papel-moeda).

Em 2005, foram mais de 600 mil casos atendidos, equivalentes a 6 milhões de exames periciais em todo o território paulista. Para esse trabalho, o IC dispõe de 980 peritos criminais, incluindo 800 operacionais, aos quais irão se juntar os novos contratados. Há, ainda, profissionais auxiliares (fotógrafos, desenhistas, papiloscopistas, auxiliares de papiloscopista e técnicos de laboratório) e alguns cargos da Polícia Civil – escrivães de polícia, carcereiros, investigadores, agentes policiais e de telecomunicações, entre outros.

“Acredito que, com os novos profissionais, vamos reduzir em 32% nosso tempo de atendimento nas ocorrências”, afirma Moreira. Atualmente, determinadas equipes dispõem de um perito-plantonista, em razão de aposentadoria ou falecimento de algum de seus componentes.

Mais de 50 equipes – No interior do Estado, o trabalho de levantar provas ou vestígios em campo ou laboratório é feito por 51 EPCs, ligadas a 11 núcleos – Araçatuba, Araraquara, Bauru, Campinas, Marília, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, Santos, São José dos Campos, São José do Rio Preto e Sorocaba. Na região metropolitana de São Paulo, são mais 14 – seis na Grande São Paulo e oito na capital, além de unidades como o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).

Afora isso, há na capital dez núcleos vinculados ao Centro de Perícias (entre os quais os de engenharia, crimes contábeis, crimes contra o patrimônio, acidentes de trânsito, crimes contra a pessoa, perícias especiais e perícia de informática) e seis núcleos de laboratório (de balística, química, análise de instrumentos, entre outros).

Um desses núcleos de laboratório, o de entorpecentes, recebeu recentemente novo equipamento. A constatação de drogas, que antes era feita em tubos de ensaio e demorava mais tempo, hoje ocorre por meio do cromatógrafo, aparelho que em 10 segundos determina se a substância é maconha, cocaína, crack ou ecstasy. No de física, um microscópio eletrônico permite aumentar o objeto analisado cinco mil vezes. O de biologia e bioquímica recebeu novos amplificadores, destinados a exames de DNA forense, ou seja, em ossadas, casos de estupro ou estupro seguido de morte.

Recentes também (em uso há menos de um ano) são as 250 maletas especiais que a Superintendência da Polícia Técnico-Científica distribuiu às suas equipes. Cada uma vem equipada com 30 itens, alguns importados. O objetivo é aperfeiçoar a coleta de provas e propiciar perícias mais rápidas, eficientes e precisas. Cada grupo dispõe de três maletas: duas para crimes contra o patrimônio e acidentes de trânsito e uma para crimes contra a pessoa.

Na maletas, um pequeno arsenal contra o crime

Um reagente, ao ser aplicado com bastão superaquecedor, libera vapor no ambiente, evidenciando impressões dígito-papilares (digitais). Denominado cianocrilato, é uma das novidades entre os cerca de 30 itens que compõem as maletas usadas nas perícias do Instituto de Criminalística. A substância, que reage com gordura, é empregada para levantar digitais em, por exemplo, veículos onde já existem marcas, a maioria das quais não recentes. “Você veda totalmente o carro e deixa o cianocrilato vaporizar”, explica o diretor do IC.

Para conseguir visualizar as marcas, especialmente em locais como o interior de automóveis, é necessária uma lanterna fluorescente ultravioleta, outro apetrecho incorporado recentemente aos equipamentos de perícia. “Em locais escuros, a lanterna (que deve ser utilizada juntamente com óculos de proteção importados) destaca todo tipo de pó branco e deixa o sangue fluorescente. Esses materiais servem de prova”, observa a perita Karin.

Se a intenção é coletar provas em superfícies multicoloridas, como capas de revistas e discos, os peritos recorrem a outra novidade: o pó magnético fluorescente. A substância é espalhada com o auxílio do aplicador magnético para pós (bastão que funciona como um pincel). Depois, utiliza-se a lanterna fluorescente para visualizar a impressão. Antes desse material, as equipes dispunham apenas dos pós branco e preto acetinados. “O moderno produto proporciona melhor definição das impressões”, revela a perita Karin.

Outro item inovador é a fita levantadora. Importada, consiste em duas lâminas transparentes de plástico, uma das quais com face aderente. Capta-se nessa parte a impressão digital, juntando uma fita contra a outra, como num sanduíche. As maletas contêm ainda materiais mais comuns: lupa, trena, pincel de pêlo de esquilo, fita isolante, algodão e gaze.

Uma descoberta brasileira, em busca de pistas

Graças à iniciativa da perita Karin K. de Vicente, o Instituto de Criminalística terá em breve material inédito no País para levantar impressões digitais. Trata-se de um produto, em desenvolvimento, capaz de revelar esse tipo de marca em superfícies que estiveram expostas à ação da água. O trabalho tem a colaboração da diretora do Núcleo da Capital e Grande São Paulo do IC, Alberta Viana Pereira, e do papiloscopista da EPC Leste, Leonardo Viana.

O novo revelador de impressões digitais latentes, como é chamado, vai ajudar a esclarecer casos como o da escrivã assassinada dentro de um carro, num dia chuvoso. As marcas deixadas na parte de fora do veículo poderão ser identificadas com maior probabilidade. Será empregado, também, para revelar digitais em superfícies cobertas por orvalho materiais plásticos porosos (como monitores de computadores) ou laminados (portas, mesas ou divisórias).

Desde 2002 na instituição, Karin teve essa iniciativa a partir da visita de colegas japoneses ao Brasil. “Percebemos que o levantamento de impressões digitais realizado por eles era muito mais avançado”, observa o diretor do IC. Os técnicos, entretanto, mantinham o produto em segredo. “Nem os laboratórios da instituição conseguiram descobrir a composição dos líquidos que utilizavam”, lembra a perita.

Karin, porém, tratou de pesquisar e ler sobre o assunto. Prefere não entrar em detalhes sobre o material, mas explica que o revelador é aplicado por meio de um vaporizador. Os componentes do produto se ligam à gordura (contida na digital), tornando-a visível. Isso possibilita, dependendo do tipo de superfície, fotografar a marca ou coletá-la para posterior classificação e confronto com possíveis suspeitos.

Segundo o diretor do IC, o novo material é muito parecido com o utilizado no Japão e em outros países. “Fizemos testes em viaturas e paredes molhadas, e funciona muito bem”. Além de tecnologia inovadora, o produto tem outra vantagem: é barato. Deve custar cerca de R$ 10 o litro, contra similares internacionais que ultrapassam US$ 100 (aproximadamente R$ 230).

Graduada em Biologia pela USP, Karin ingressou no IC em 2002, mediante concurso. Antes disso, atuou por 12 anos como analista de sistemas, desde que terminou o ensino médio. Elogiada pela direção do instituto, pretende continuar na área de perícia. “Quero apenas me aprimorar.”

Paulo Henrique Andrade

Da Agência Imprensa Oficial