Relações amorosas ainda estão ligadas a tradições e fidelidade

Dissertação de mestrado da USP mostra que as pessoas tendem a absorver novos ideais, mas não superam os tradicionais

sex, 25/05/2007 - 20h48 | Do Portal do Governo

Nas relações amorosas, homens e mulheres estão intimamente ligados a valores tradicionais, como exclusividade e eternidade, apesar da redefinição e pluralidade das práticas afetivas, características da modernidade. De acordo com a psicóloga Edilaine Helena Scabello, que estudou os discursos femininos e masculinos em situações de infidelidade conjugal, a fidelidade ainda é muito valorizada apesar de novas maneiras de se relacionar como amor virtual, relacionamentos efêmeros, casamentos sucessivos etc.

Em seu mestrado pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, Edilaine explica que as pessoas tendem a absorver novos ideais, mas não superam os tradicionais. “Os valores burgueses são a origem e a base das relações afetivas, o que acarreta diferenças nos comportamentos femininos e masculinos nesse campo”, diz a psicóloga. Em sua pesquisa, Edilaine entrevistou 4 homens e 5 mulheres que haviam sido traídos por seus parceiros. “Em todos os depoimentos pudemos perceber a valorização do amor romântico”, ressalta.

Todos os homens entrevistados se separaram das parceiras, enquanto as mulheres permaneceram com os maridos. Segundo ela, esse comportamento pode ser explicado pela divisão presente na sociedade burguesa entre as “mulheres que seriam para casar e aquelas que não”. Ou seja, os homens consideram que aquelas mulheres que lhes foram infiéis não são dignas de um relacionamento fixo e duradouro. Além disso, histórica e socialmente, as mulheres, na sociedade ocidental, sempre conviveram com a infidelidade de seus maridos e, por isso, elas se adequam a essa situação.

Outro fator específico de discursos femininos é a presença dos sentimentos de culpa e de auto-punição. Edilaine explica que, historicamente, ocorreu a divisão familiar dos papéis de homens e mulheres, pois aqueles deveriam ser provedores e elas responsáveis pelo cuidado do lar e pela felicidade do casamento. “Algumas mulheres se consideram culpadas pelo aparente fracasso do casamento, pois acreditam que não souberam cuidar de seus parceiros”.

Amor e dor psíquica

Há ainda o sofrimento que acompanha a situação de infidelidade conjugal. Segundo Edilaine, existe uma perda simbólica da imagem do outro, pois, com a traição, ocorre a desfiguração da representação mental que era feita do parceiro, e isso pode desembocar na perda da própria identidade. “A minha identidade é criada a partir do parceiro e do tipo de relação que estabelecíamos. Então, se o outro não é mais quem eu pensava ser, eu também não sei mais quem sou”.

Essa perda é acompanhada de um enlouquecimento dos sentimentos, de uma confusão interna, a qual leva a pessoa a ter dúvidas sobre a sua própria sanidade mental. A psicóloga explica “os sentimentos ficam descompensados e por isso existe dor e sofrimento; não por causa da perda em si e sim pelo enlouquecimento interno dos sentimentos e da confusão da identidade”.

Re-significação ou Ressentimento

Após a perda simbólica do outro e de sua própria identidade e a dor que essa situação traz, é necessário que exista um período de luto em que a pessoa irá elaborar a perda. Esse processo acarreta a reestruturação psíquica. A partir daí, a pessoa dará novos sentidos àquela experiência, como por exemplo, encarando-a de outro modo e percebendo quais aprendizados obteve.

Três comportamentos foram compreendidos. Todos os homens re-significaram suas relações com as parceiras, dissolveram o casamento e partiram em busca de outras relações afetivas e sexuais. Três das cinco mulheres também atribuíram novos significados àquela situação, reconstruindo o casamento, ou seja, retomaram o curso de suas relações conjugais. No entanto, duas mulheres não elaboraram o luto e, portanto, não houve re-significação. Nesse caso, as mulheres permanecem aprisionadas à dor e ao ressentimento.

A psicóloga compreendeu que as mulheres que não elaboraram a perda possuíam grande sentimento de culpa e negação da realidade, pois a traição implica na dissolução da imagem do parceiro. Por esses motivos, a elaboração do luto pode ser demorada ou até mesmo não efetivada. Desta forma a mulher permanece imersa no ressentimento, representando a impossibilidade de esquecer ou superar aquele acontecimento e a situação desencadeada por ele.

Da Agência USP de Notícias

(R.A.)