Projeto Reviver dá bem-estar a idoso em casa de repouso

Objetivo é estimular, por meio da música, essa população geralmente esquecida pela sociedade

ter, 18/11/2008 - 11h15 | Do Portal do Governo

A velha senhora não levantava mais da cama. Todos da casa de repouso e da sua família tinham avisado ao animador Jackson Ricarti que Izabel Garcia não respondia aos estímulos havia muito tempo. Porém, ele resolveu insistir. Realizou o seu sarau e no final do espetáculo dirigiu-se ao quarto de Izabel e cantou somente para ela.

Para surpresa de todos, a senhora animou-se: revelou que era espanhola e na sua juventude tinha viajado por 22 países. “O meu marido era brasileiro. Foi um amor alucinante. O amo até hoje”, declara a viúva em espanhol do alto dos seus 84 anos.

Hoje, Izabel é fã dos animadores do Projeto Reviver. Basta algum deles chegar para que ela chame as freiras e as amigas para que entrem na roda de dança. “Desde que vieram para cá, a Izabel voltou a conversar e deixou de lado a apatia”, avalia a irmã Miriam Rosana Cadernassi, coordenadora da Associação Filhas de São Camilo, onde dona Izabel está abrigada.

A cantoria também anima os visitantes. Éclair Congilio (77) visita sua esposa Guiomar (90) todos os dias. Como a personagem do filme Diário de uma paixão, Guiomar sofre de mal de Alzheimer. Éclair vai à casa de repouso diariamente para que a mulher não esqueça a união de mais de quatro décadas. “A música acalma minha esposa e só assim consigo ficar pertinho dela. Esse pessoal traz paz de espírito para todos”, diz com lágrimas nos olhos.

Final feliz – Toninho Macedo, coordenador do Projeto Reviver, revela que histórias de solidão e de abandono podem ter final feliz. “Queremos resgatar o sentido etimológico da palavra animar, que é dar vida a essa população confinada de idosos e sem opções de lazer. Para isso, existe o Reviver, projeto da Secretaria Estadual de Cultura, administrado pela Organização Social de Cultura Abaçaí (a mesma do Projeto Revelando São Paulo)”.

O Projeto Reviver tem dez animadores. O mais jovem da turma é Jackson Ricarti (22 anos). Cearense de Senador Pompeu, há um ano no projeto, é dono de currículo invejável. “Participei da Orquestra Paulistana de Viola Caipira e desenvolvo oficinas culturais para a terceira idade na Oficina Cultural Amacio Mazzaropi”, diz o violeiro.

Gilberto Gaspar (78 anos) é o mais velho dos animadores e tem fãs por todos os lados, além de uma marqueteira de mão-cheia, sua esposa Patrícia. “Componho e escrevo músicas desde os oito anos de idade”, diz orgulhoso. O vozeirão faz com que homens e mulheres peçam para que imite Vicente Celestino (e é claro, que cante a famosa O ébrio). Outro fato importante é que sua canção Roseira de Maria tornou-se hino do Reviver.

No Brasil existem 14,5 milhões de idosos, 8,6% da população total do País, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base no Censo 2000. “Apesar dos números do IBGE, não temos o índice exato de pessoas em abrigos ou em casas de repouso”, ressalta Toninho. No ano passado, o projeto trabalhou com 17 instituições localizadas nas cidades de São Paulo e Sorocaba, e a “maioria que atendemos tem predominância de população feminina”.

De acordo com a irmã Miriam, as mulheres dessas instituições geralmente não se casaram, cuidaram dos pais e não trabalhavam. “Quando foram ficando mais idosas, se deram conta que estavam sozinhas”. 

Inserção social – Os idosos são acervos preciosos para quem quer andar à frente de seu tempo. A frase, escrita num cartaz afixado na cozinha do Abrigo Especial Sítio das Alamedas, é um alerta aos visitantes mais jovens. O centro abriga 54 homens e seis mulheres, com idade acima de 60 anos. Vinculado à Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, é administrada pela Organização Não-governamental Cropi.

“Eles estão aqui de passagem. Ficam somente 18 meses. Tentamos restabelecer os vínculos com as famílias e inseri-los novamente na sociedade”, explica a gestora do centro, Teresa Cristina Evangelista.

A assistente social do local, Virgínia, diz que a parceria com o Projeto Reviver teve início em abril deste ano e já apresenta bons resultados. “No começo da semana, os internos perguntam quando virão os animadores. Geralmente, vêm chegando aos poucos e timidamente pedem a música preferida”.

Aos 63 anos, José Napoleão de Oliveira quer dar novo rumo à sua vida. O alagoano sempre trabalhou como autônomo. Com o avanço da idade, perdeu o emprego e não conseguiu mais fazer ‘bicos’ para sobreviver. “Saí da casa da minha sobrinha com quem eu morava porque não queria ser um ‘peso’. Aqui no sítio, a Virgínia e a Denise (psicóloga) mostraram que havia saída para o meu caso. No final do ano, conseguirei minha aposentadoria e voltarei ao convívio dos meus familiares”.

Para os animadores do Reviver não importa o ritmo da música: MPB, sertanejo ou forró. O importante é levar alegria a uma população geralmente esquecida pela sociedade.

Vida aos 90 – “Gosto de músicas. Elas ajudam as anciãs a relaxar. Estou entusiasmada com o Projeto Reviver, afinal, tenho 90 anos e quero aproveitar a vida”, diz a irmã Cecília de Freira (foto), 68 anos na irmandade.

A música entoada pelo violeiro traz boas recordações à Rosely Torresi Perón, funcionária da Associação Filhas de Maria. “Cuido da aparência das vozinhas. Aprecio música romântica porque me remete ao início do meu namoro. Conheci o meu marido aqui na casa de repouso. Ele veio visitar a mãe e foi amor à primeira vista. Estamos casados há 15 anos e muito felizes”.

((BOXE 2)) 

O País envelhece 

O País do futuro está envelhecendo. Em uma década, o número de idosos no Brasil cresceu 17%. Em 1991, correspondia a 7,3% da população. A importância dos idosos para o País não se resume à sua crescente participação no total da população. Atualmente, boa parte dos idosos é chefe de família. E nessas famílias a renda média é superior àquelas comandadas por adultos não-idosos. Segundo o Censo 2000, 62,4% dos idosos e 37,6% das idosas são chefes de família, somando 8,9 milhões de pessoas. Além disso, 54,5% dos idosos chefes de família vivem com os seus filhos e os sustentam. 

Maria Lúcia Zanelli

Da Agência Imprensa Oficial