Apaixonado por basquete, Manuel Pereira Gonçalves Júnior, 16 anos, 1o ano do ensino médio, via, há bem pouco tempo, o sonho de praticar o esporte escapar pelos dedos das mãos. Depois das aulas, ou ficava em casa tomando conta dos três irmãos menores enquanto a mãe trabalhava, ou “batia pernas” pelo bairro com os amigos, entre conversas e futebol improvisado nas ruas. Isso preocupava o garoto e à mãe. O receio era justificado.
Em Quinta dos Carvalhos, bairro periférico de Mairiporã, onde mora, a violência praticada por gangues, a falta de lazer, o consumo e tráfico de drogas fazem parte da rotina da maioria dos jovens. “Até que, sem que eu esperasse, conheci o Programa Caminho Certo, diz, animado. A iniciativa do 26o Batalhão de Polícia Militar Metropolitana tem como objetivo a inclusão social de crianças e adolescentes residentes em cinco comunidades periféricas consideradas de risco – Caieiras, Cajamar, Franco da Rocha, Francisco Morato e Mairiporã.
Há seis meses a vida de Manuel é uma alegria só. Trocou a incerteza, a falta de perspectiva e as conversas de rua por atividades esportivas praticadas no Ginásio de Esportes de Mairiporã e no campo de futebol, sempre acompanhado de um professor de educação física. Tudo isso graças à iniciativa da associação dos moradores do bairro, presidida por Arnold Mariano Sobrinho, líder comunitário em Quinta dos Carvalhos, que desenvolve esse trabalho em conjunto com o batalhão. Agora Manuel encontra os amigos para praticarem diversos esportes, com ênfase, é claro, no basquete.
Esporte como solução
Histórias como a de Manuel existem às centenas na região, desde que o comando do 26o BPM/M, instalado em Franco da Rocha, no complexo hospitalar do mesmo nome, decidiu tirar a garotada da ociosidade das ruas. Nascia, dessa forma, o Programa Caminho Certo, criado em junho do ano passado, como parte do projeto Polícia Cidadã, surgido cinco anos atrás. Ambos são coordenados pelo comandante do 26o Batalhão, tenente-coronel Wanderley Mascarenhas de Souza, e contam com policiais voluntários, esposas de oficiais, mães de garotos participantes da iniciativa, líderes comunitários, num total de 50 pessoas.
“O objetivo é trabalhar com crianças das cinco áreas de risco, eleitas no contexto de cada município e pelo comandante de cada companhia, junto às lideranças comunitárias”, de acordo com Souza. Segundo ele, o esporte e a cultura foram a solução encontrada para a inclusão de 140 jovens, crianças e adolescentes carentes moradores da região. A única exigência para estar no programa é que o jovem esteja estudando e apresente freqüência e bom comportamento escolar. Foram contempladas, ainda, mais de cem crianças da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), que participam de atividades lúdicas e de comemorações do Dia das Crianças e de fim de ano.
Trata-se de uma região em que a saúde precária, a falta de escolas, de saneamento caminham lado a lado com a violência, chegando mesmo a níveis críticos, com os jovens expostos à criminalidade. “A solução do problema era emergencial”, recorda o tenente-coronel. Ele conta que os contatos com a população começaram em 2003, quando passaram a conhecer de perto a situação dos moradores. “Aproximamo-nos e nos demos conta da importância do diálogo. A partir daí, conhecemos as reais necessidades, os valores, e desenvolvemos um programa que busca, também, o resgate da cidadania dessa garotada.” Paralelo ao esporte, é apresentado um ciclo de palestras do Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (Proerd), e outros temas que vão desde prevenção de acidentes domésticos a acidentes com cerol em linhas de pipa.
Outra faceta do programa é o adestramento mirim, com a equipe do Canil BPM/M, que ensina como cuidar de animais domésticos, além do adestramento de cães.
De olho no futuro
A iniciativa ainda é tímida, mas já desperta várias pessoas para o voluntariado, comenta Branca Fernandes Fagundes Schreiner, ao lado da soldado Juliana Santos de Moura, também na coordenação do programa. “O retorno a gente vê no dia-a-dia, quando somos abordadas nas ruas pelas mães dos meninos que, agradecidas, dizem notar mudanças significativas no comportamento dos filhos depois do projeto-piloto”, diz Branca. Entusiasmadas, falam a respeito das parcerias com o comércio local para aquisição de materiais esportivos – meias, bolas, uniforme – e com a Associação da Polícia Militar, da qual é presidente o tenente Dirceu Cardoso Gonçalves. Dirceu se comove ao falar do projeto.
“Abracei e me apaixonei”, diz. Ressalta a importância de tirar a criança da rua, dar responsabilidades e mostrar que a sociedade precisa de um cidadão bem preparado. “É um projeto que vai cuidar do futuro”.
Na verdade, há um entrosamento grande entre as lideranças comunitárias das cinco cidades abrangidas pelo batalhão. Por conta delas várias idéias são levadas adiante, como campeonato esportivo, festas de fim de ano, doações, encontros com a comunidade, garantia de transporte para as equipes. “Fazemos atividades no Dia das Crianças e no Natal. Em 2007, mudamos um pouco o perfil do atendimento e incluímos as Associações de Pais e Amigos de Excepcionais (Apaes) da região”, comenta o líder comunitário de Franco da Rocha, Carlos Alberto Corbo, o Carlão da Saúde.
Vitrine
“As palestras do Proerd, por exemplo, têm provocado interesse, enfim, é uma linha para o futuro que está sendo traçada”. Essa é a vitrine de um projeto que deve crescer muito, garante outro líder comunitário, Pedro Áureo Vitória da Conceição, do Jardim Olga, de Francisco Morato. “Até o final do ano, cada cidade terá, pelo menos, cem jovens interagidos. Estamos na fase de planejamento dos campeonatos entre as cidades para repetir a dose de 2007, quando fomos campeões em três modalidades”.
Confiante, Anderson Feitosa Teixeira, 9 anos, 3a.série do ensino fundamental, promete repetir o desafio passado – 1o lugar na corrida de sacos. “Agora vou brilhar no futebol, assim como o Manuel se destaca no basquete”.
Da Agência Imprensa Oficial
Maria das Graças Leocadio
(M.S.)
