Projeto Bandeira Científica dá atenção humanizada a regiões carentes

Criado em 1957, reeditado em 1998, projeto apresenta resultados surpreendentes

sex, 20/04/2007 - 9h02 | Do Portal do Governo

A velha história de que é melhor ensinar a pescar do que dar o peixe está dando certo no Projeto Bandeira Científica, liderada pela Faculdade Medicina da USP (FMUSP). O resultado do último percurso heróico, realizado em dezembro passado, pelos confins da região amazônica, está sendo divulgado amanhã (20), às 11 horas, na Faculdade de Medicina.

O balanço da expedição dá conta de que, durante 10 dias ininterruptos, um grupo de 130 estudantes e profissionais de seis unidades da USP esteve em Machadinho D’Oeste, pequeno município de Rondônia.

“Nesse período, realizamos cerca de 5 mil atendimentos, mais de 30 palestras educativas, além da coleta de dados para a elaboração de pesquisas científicas e relatórios técnicos”. Quem conta é o coordenador do projeto, Luiz Fernando Ferraz da Silva, do Departamento de Patologia. A cada ano a expedição busca atuar de forma a garantir o desenvolvimento de saúde da região visitada, que inclui não apenas a abordagem das doenças, mas também aspectos ambientais e sociais a ela relacionados. Foi o que ocorreu em Machadinho D’Oeste, de 45 mil habitantes, dos quais 19 mil na área urbana, cuja infra-estrutura de saneamento é praticamente inexistente. Em 2006, o Bandeira Científica trouxe novidades em vários aspectos, explica o cooordenador.

“A gente sempre tem planos de melhorar. Na última expedição, resolvemos trabalhar a promoção da saúde do ponto de vista global do município. Agregamos às áreas de Medicina, Fisioterapia, Nutrição e Odontologia equipes de engenharia, para fazer a avaliação de saneamento do município, outra de Agronomia, com a finalidade de trabalhar a agricultura familiar, com qualidade e higienização de produção, e mais outra equipe, de Psicologia para avaliar as lideranças do município. Abrimos, assim, o leque das atividades”.

Contato com a comunidade – Para Fabíola Oléa Albieri, 24 anos, último ano de Fisioterapia, participar do Bandeira Científica, pela primeira vez, em 2005, como aluna, e em 2006, como diretora, tem um significado muito especial. “Atendemos, por dia, perto de 500 pessoas com queixas de dores nas costas, no ombro e no cotovelo, conseqüência do tipo de trabalho que realizam. Fiquei feliz em passar meus conhecimentos, ajudando tantas pessoas num curto tempo. A Fisioterapia serviu como orientação e prevenção; não só ministramos exercícios físicos, como palestras”.

Participam do projeto alunos do 2° ao 6º ano de Medicina, o mesmo valendo para outros cursos de menor duração, sempre a partir do 2° ano. O interesse em fazer parte da expedição é grande, explica o coordenador.

“Não basta chegar de malas prontas e dizer: ‘vou viajar com a Bandeira Científica”’. O aluno tem de se inscrever, participar de curso de uma semana, durante o qual terá contato com informações técnicas, por exemplo, das doenças principais da região, e temas sociais relevantes. São três aulas diferentes com dois ou três professores por dia. Depois, são submetidos à prova final para testar o aprendizado e o grau de interesse. Além disso, são levadas em consideração a freqüência e nota obtida. Dependendo da área, a seleção varia, incluindo entrevistas.

“Só na Medicina, temos de 250 a 300 alunos inscritos todos os anos, desses, setenta são selecionados”, diz o coordenador.

Eduardo Baptista, 23 anos, 4º ano de Medicina, comenta que o projeto o convenceu sob todos os aspectos. “A gente aprende Medicina fora dos muros da Escola, desenvolve interação com a comunidade, fazemos amizade com o pessoal da faculdade, colegas com os quais nunca conversamos aqui devido à correria da vida acadêmica, além de ter a oportunidade de discutir lá, nos acampamentos, com os nossos mestres. Apesar do trabalho puxado, das 7 às 21 h, pretendo voltar. O lado assistencial é o mais interessante”.

Andréa Beolchi Spessoto, 20 anos, 3º ano de Medicina define a sua estréia na Bandeira de 2006, como uma experiência rica e gratificante.

“Não só aprendi Medicina, como fiquei tocada com as histórias dos pacientes, da vida deles, a maneira como encaram asa doenças. A malária, por exemplo. Muitos já tiveram malária umas cem vezes, o equivalente à uma simples gripe aqui no sudeste. Rondônia também impressiona, pela migração contínua, gente do Paraná, Espírito Santo, migrantes que preferem estar naquele fim de mundo sendo donos da terra do que em seus Estados,  com mais conforto, mas na condição de empregados.”

Uma história de 50 anos

O Bandeira Científica começou a se desenvolver em 1957 por um grupo de professores da Faculdade de Medicina, com o objetivo de levar alunos da faculdade para conhecer a realidade do Brasil. Eram atividades de pesquisas de campo, projetos científicos, de avaliação de vetores, parasitoses, alguma coisa relacionada a atividade educacional e prevenção de doenças. Na época, era uma ação esporádica, mas foram realizadas várias expedições à Bahia, Ilha do Marajó, ao Pará, a Minas, a Mato Grosso. Em 1969, o regime militar acabou dificultando as ações do projeto, consideradas subversivas. Acabou sendo reeditado em 1998. Em 2000, foi a Rondônia e, no ano seguinte, ao Maranhão, onde atuou em parceria com o Programa Saúde da Família local. “O Saúde da Família é importante aliado nosso, porque dentro dela tem médico, enfermeiro e agente de saúde. O agente de saúde, saído da própria comunidade, além de interface, é multiplicador”, diz o coordenador. “Capacitamos esses agentes com cursos e palestras de planejamento familiar, doenças sexualmente transmissíveis, primeiros socorros.

Desde 1998, o projeto já beneficiou 12 municípios, atendendo mais de 30 mil pessoas, firmou diversas parcerias com as universidades locais, além de colabor na reativação de alguns hospitais. “Quando a Bandeira sai do município, a fila fica bem reduzida”, conta o coordenador.

A Bandeira Científica 2006 teve a participação de acadêmicos e profissionais da FMUSP, da Faculdade de Saúde Pública, Faculdade de Odontologia, Instituto de Psicologia, Escola Politécnia e Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. Integraram a missão, ainda, a Universidade Federal de Rondônia e a Faculdade São Lucas. Tem supervisão do professor Paulo Hilário do Nascimento Saldiva e apoio de diversas instituições públicas e privadas, incluindo o Hospital das Clínicas da FMUSP, a Força Aérea Brasileira, a Sanofi-Aventis e Fundação para o Remédio Popular (Furp), entre outras.

Maria das Graças Leocádio

Da Agência Imprensa Oficial

(R.A.)