Projeto Afinal é nova oportunidade para alunos carentes da FM da USP

Professores responsáveis por alguns alunos descobriam histórias de sacrifício pessoal

qui, 11/09/2008 - 10h22 | Do Portal do Governo

O ano de 2007 foi um marco divisório na vida de Karen Christina Rodrigues Gallão. Aos 21 anos, decidiu modificar sua trajetória profissional e investir em seu sonho: estudar Terapia Ocupacional na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

“Minha primeira tentativa para entrar nesta universidade foi aos 17 anos. Prestei a Fuvest, mas, infelizmente, não foi possível. Aceitei o caminho que parecia mais fácil. Arranjei um emprego na área de telemarketing e entrei numa universidade particular. Vi com o tempo que nenhum contracheque paga a satisfação que tenho hoje,” revela a garota.

Karen diz que conseguiu até ser promovida no emprego, mas a insatisfação era imensa. Para agravar, o seu avô Mário, com quem vivia, estava muito doente. O tripé trabalho-estudo-hospital não a afastou do seu objetivo. Karen prestou o vestibular da Fuvest novamente e almejou a tão sonhada vaga no curso de Terapia Ocupacional. Os esforços renderam-lhe o 11º lugar. No entanto, a jovem tinha um problema mais sério. Mesmo com a gratuidade do curso, precisava de um salário para se manter.

“Pensei em trabalhar durante a madrugada, mas o curso exige dedicação em tempo integral. Felizmente, fui contemplada com uma bolsa do Projeto Afinal. Hoje, posso me dedicar inteiramente aos estudos”. Com a despreocupação com o lado financeiro, a estudante já sonha com sua especialização: geriatria. O motivo é um só. Karen cuida da sua melhor amiga, a avó Anna, de 80 anos. “Depois da morte de meu avô, ficamos mais próximas e ela tem me apoiado muito”.

Conheça o projeto – O Projeto Afinal é destinado aos estudantes da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Em abril de 2007, a FMUSP criou a Comissão de Apoio Financeiro ao Aluno da FMUSP (Afinal), com o intuito de oferecer um programa de auxílio financeiro aos alunos regularmente matriculados nos cursos de graduação com dificuldades financeiras.

Ivete Boulos, presidente da Comissão do Projeto Afinal, explica que a idéia das bolsas surgiu a partir das reuniões de tutoria, nas quais os professores responsáveis por alguns alunos descobriam histórias de sacrifício pessoal e de dificuldades financeiras. “Muitos tinham até a água e a luz das suas casas cortadas por falta de pagamento. Durante o dia, realizavam refeições no restaurante do hospital, mas, nos finais de semana, as jornadas eram difíceis e, muitas vezes, não tinham dinheiro para almoçar ou jantar”, informa a doutora.

Alguns alunos, para driblar a situação, trabalhavam à noite ou nos finais de semana, como recepcionistas, babás, ou cuidavam de pessoas adoentadas e da terceira idade. “Desta maneira, melhoravam sua condição financeira, mas o resultado negativo podia ser visto no desempenho escolar. O aproveitamento do aluno ficava comprometido, pois não conseguia acompanhar as aulas”.

É o caso de Karen. A estudante assiste às aulas das 8 às 18 horas no câmpus da Cidade Universitária. “Atravesso a cidade para estudar lá”. Ela mora no bairro do Limão e a bolsa auxilia bastante na questão dos livros e na condução: “Gastamos muito em xérox”, garante. Mesmo com a dedicação exclusiva aos estudos, ainda lhe sobra um tempinho para diversão.  “Os primeiros anos são mais complicados. Os estudantes têm aulas teóricas em período integral. Nos últimos, conseguem estágios remunerados e isso alivia a situação desses alunos”, explica a doutora Ivete.   

Saiba como funciona o Afinal

A comissão mista do Projeto Afinal conta com representantes da Comissão de Graduação, da Diretoria, da Associação dos Antigos Alunos, do Programa Tutores, do Centro de Desenvolvimento e Educação Médica (Cedem), dos estudantes, da Casa do Estudante, dos cursos de Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, da Fundação Faculdade de Medicina, do Hospital das Clínicas, da Comissão de Ética e da Assessoria Acadêmica da Faculdade de Medicina da USP. Essa comissão se reúne mensal, ou extraordinariamente, quando necessário, para tomar todas as decisões e discutir sobre novas formas de captação de recursos e demais assuntos.

O processo seletivo do programa ocorre anualmente, desde 2007. É realizado pela Coordenadoria de Assistência Social (Coseas). Considera o perfil socioeconômico dos alunos para concessão de bolsas anuais, nos moldes e valores similares ao da bolsa de iniciação científica da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) – R$ 396,00 mensais. As bolsas são custeadas com recursos oriundos de doações de ex-alunos, pais de alunos e profissionais do Sistema FMUSP-HC, além da Fundação Faculdade de Medicina.

“Não existe número fixo de bolsas concedidas aos candidatos selecionados mediante disponibilidade financeira. Anualmente, novo ciclo é iniciado e é feita outra seleção. Os bolsistas contemplados são submetidos novamente ao processo e à recondução da bolsa. Faz-se necessário destacar que a bolsa não é concedida apenas pela classificação socioeconômica. O postulante deve ter desempenho acadêmico satisfatório”, esclarece a doutora Ivete. No final do ciclo 2007 foram concedidas 29 bolsas, de acordo com o saldo de caixa, ou seja, as bolsas foram sendo disponibilizadas no decorrer do ano letivo.

“Consegui o benefício somente na segunda chamada. Tenho, portanto, dez meses de bolsa”, informa Karen. Em 2008, o processo on-line foi realizado pela primeira vez. Foram feitas 79 inscrições. Quatro candidatos desistiram, outros quatro não apresentaram documentação solicitada e foram excluídos do processo, totalizando 71 alunos entrevistados. Para este ciclo, a Comissão Afinal dispõe de recursos financeiros para arcar com 29 bolsas regulares. Karen Christina Rodrigues Gallão garante que “uma vez que tomamos a decisão de reiniciarmos nossa trajetória de vida, descobrimos que não temos como retornar. A única solução é continuar trabalhando para que tudo dê certo”.

Maria Lúcia Zanelli, da Agência Imprensa Oficial 

(M.C.)