Programa habilita professores para atender superdotados

Iniciativa abrange identificação de casos e adaptação do currículo

qua, 14/01/2009 - 10h15 | Do Portal do Governo

Foi só conhecer um pouco melhor os números, que Nícolas Cássio dos Santos, mesmo com apenas quatro anos, aprendeu a fazer contas. Isso ocorreu quando estava na pré-escola e a precocidade do interesse e da capacidade de raciocínio chamou a atenção dos seus pais, da avó e das amigas dela.

Ao ingressar no primeiro ano do ensino fundamental na Escola Estadual Professor Laurindo Rodrigues Pereira Leite, na zona leste da capital, surpreendeu também os professores, pois já estava “completamente alfabetizado e sabia ler e calcular com incrível facilidade”, recorda a coordenadora pedagógica da unidade, Elisabete dos Anjos Silva.

O próprio menino, hoje com sete anos, já sabe por que apreende muito mais rapidamente do que a maioria das crianças da sua idade. Possui superdotação, ou seja, habilidade superior à média para algumas atividades intelectuais. O diagnóstico foi feito por meio do Programa de Altas Habilidades da Secretaria Estadual de Educação. “Até poucos anos, em geral, não havia um olhar para essa questão”, ressalta a diretora do Centro de Apoio Pedagógico Especializado (Cape), Maria Elisabete da Costa, órgão da pasta responsável pelo trabalho.

A importância de dar atendimento especial aos superdotados passou a ser abordada na rede em 2002, através de palestras. A iniciativa ganhou relevância em 2005, com o apoio do Ministério da Educação e Cultura (MEC), que distribuiu material específico sobre o tema e culminou no programa, criado oficialmente em 2007. Mas o que ficou definido como a primeira etapa do trabalho já vinha sendo realizado efetivamente desde 2006: a capacitação de educadores para que pudessem identificar alunos superdotados. Até então, essa avaliação era feita com base na intuição dos professores.

Diagnóstico – O método para a formação dos educadores foi elaborado pelo Cape com a ajuda de especialistas no tema. A pasta da Educação formou 270 profissionais – supervisores, assistentes técnico-pedagógicos e professores coordenadores – para difundir o conhecimento por toda a rede. O procedimento levou a uma grande diferença no número de diagnósticos no período de um ano. A ocorrência de superdotados na rede estadual subiu de 79 registros no censo escolar de 2006, para 397 no de 2007.

Gerou também um manual, lançado em dezembro passado para ser entregue a todas as 5,5 mil escolas estaduais paulistas: Um Olhar para as Altas Habilidades: Construindo Caminhos, publicado pela Editora Papirus. Organizado pela psicóloga Christina Cupertino, descreve características comuns aos superdotados e dá dicas sobre como observá-las. “Existem três que devem ser frequentes para se começar um trabalho”, exemplifica a diretora do Cape: “Habilidade acima da média em uma determinada área, criatividade e comprometimento na resolução de tarefas”.

A próxima etapa do programa, a ser iniciada com o ano letivo, abrangerá o encaminhamento dos casos já identificados para enriquecimento curricular e a continuidade do processo de treinamento e avaliação, com acompanhamento mais aprofundado em cada região. Algumas experiências de sucesso, a exemplo de uma parceria realizada entre a diretoria de ensino de Assis e uma universidade para tornar viáveis oficinas especiais para os estudantes, serão analisadas de perto.

De acordo com Elisabete, é essencial a diferenciação no atendimento a esses alunos, para que não percam o interesse nos estudos e não se tornem indisciplinados por conta de desmotivação. “Nosso objetivo não é caçar talentos, mas dar atendimento adequado aos jovens com altas habilidades”, destaca.

O incremento de currículos será realizado por meio da criação de atividades específicas para esses estudantes, de acordo com a necessidade de cada um, nos programas já desenvolvidos nas escolas estaduais: oficinas das Escolas de Tempo Integral, atividades do Escola da Família, no Hora da Leitura, em festivais de artes e feiras de ciências, entre outros.

Artes, ciências e muita curiosidade

A maior parte dos casos de superdotação na rede pública põe abaixo o mito de que há poucas ocorrências do tipo em famílias de menor poder aquisitivo. “Foram identificados muitos alunos com altas habilidades oriundos de famílias muito simples”, informa a diretora do Cape.

Segundo ela, Artes e Ciências são as áreas em que os dotes intelectuais se destacam com maior frequência, seguidas de Matemática e Geografia. Enumera algumas características que, em conjunto, podem ser consideradas evidências de um caso: boa capacidade de concentração, alto grau de curiosidade, vocabulário avançado, liderança, grande interesse por um assunto específico, alfabetização precoce, habilidade para adaptar e modificar idéias e persistência. Na avaliação, esclarece Maria Elisabete, são levadas em conta também questões contextuais.

Nada de doutor sabe tudo

Apesar de não encontrar obstáculos para realizar as tarefas, a vida escolar de Nícolas Cássio dos Santos (que tem habilidade superior à média para algumas atividades) não é feita só de facilidades. Gosta de ajudar os colegas de classe, mas se incomoda de ser chamado de “doutor sabe tudo” por uma das meninas. “Isso é muito chato”, diz.

Elisabete dos Anjos, coordenadora pedagógica da EE Professor Laurindo Rodrigues Pereira Leite, na zona leste, lembra que o menino realmente causou espanto ao entrar na escola, por saber muito mais do que as crianças da sua idade. O caderno usado em casa, para escrever e fazer contas, foi apresentado por ele à professora, que logo identificou as características da superdotação, com base na orientação recebida pela pasta da Educação. Nícolas foi encaminhado para uma entrevista com a coordenadora da oficina pedagógica da Diretoria de Ensino, que confirmou a hipótese.

 “Foi ótimo conseguir essa definição, pois a professora pôde iniciar um trabalho diferenciado com o garoto, mesmo antes de estar pronto o enriquecimento do seu currículo”, informa a coordenadora. Como o aluno costuma terminar as lições antes de todos, recebe revistas e livros sobre assuntos de seu interesse para leitura nesses intervalos. “Gosto de histórias de aventura”, diz o menino, agora até famoso pela capacidade intelectual. “Hoje vou aparecer numa entrevista na televisão”, avisa.

Simone de Marco – Da Agência Imprensa Oficial