Programa da Funap leva educação a mais de 13 mil detentos no Estado

‘Estou plenamente convencida de que, somente com a educação, podemos acabar com a criminalidade’

qua, 16/05/2007 - 15h27 | Do Portal do Governo

Desenvolver os potenciais dos presos e presas, egressos e egressas do Estado de São Paulo e fazer com que eles consigam retornar ao convívio social têm sido o objetivo da Fundação de Amparo ao Preso Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel (Funap). Um dos programas, “menina dos olhos da instituição”, é o Tecendo a Liberdade que visa a levar aos jovens e adultos que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental a oportunidade de melhorar seus conhecimentos e elevar sua auto-estima.

O resultado do projeto pode ser visto em números. Atualmente, 13.612 detentos das 144 unidades em todo o Estado estudam. Há em todo o Estado de São Paulo, 128.400 detentos distribuídos em oito regionais (Araçatuba, Bauru, Campinas, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São Paulo-Litoral, São Paulo-Vale do Paraíba e Sorocaba). “São 671 salas de estudo que mostram para os alunos encarcerados que há luz no fim do túnel e uma oportunidade ao seu alcance”, disse Maria da Conceição Capello, pedagoga e responsável pelo projeto na Regional São Paulo e Vale do Paraíba. Na região do oeste paulista, 21 das 35 unidades prisionais aderiram ao projeto e contam com 3.554 presos estudando. A meta é de que, até julho, 5.300 estejam inseridos no programa.

“Muitos adultos presidiários escondem sua condição de analfabetos e aproveitam a chance para aprender a ler e escrever. Em todo o Estado, há 271 turmas somente no curso de alfabetização. O Censo Penitenciário realizado pela Funap, em 2002, revelou que 70% desta população tem baixa escolaridade, sendo 4% analfabetos e 74% sem ensino fundamental completo e profissionalização insuficiente.

“No seu início, o Tecendo a Liberdade tinha somente turmas de alfabetização e de ensino fundamental. Com o tempo, descobrimos que muitos alunos queriam dar continuidade aos estudos. Por isso, abrimos turmas para o ensino médio. Hoje, temos 2.202 detentos cursando esse ciclo”, informou Lúcia Casalli, diretora-executiva da Funap.

Maleabilidade – “O sucesso do programa deve-se à maleabilidade do projeto pedagógico. Dividido em 24 módulos, independentes e complementares, totaliza 820 horas de aula e contempla três áreas: Linguagens (Português, Inglês e Artes); Ciências Humanas (História e Geografia); Ciências Físicas e Biológicas e Matemática. Dessa maneira, ao ser transferido para outra unidade prisional, o aluno detento não perde a continuidade dos seus estudos”, explicou Conceição.

Cada módulo tem, em média, duração de 20 dias. Os alunos têm duas horas-aula por dia. A estrutura curricular está organizada da seguinte maneira: cinco módulos de História, quatro de Geografia, cinco de Ciências e Saúde, cinco de Matemática, cinco de Língua Portuguesa, totalizando 24 módulos. “O projeto pedagógico está baseado nas linhas do pedagogo Paulo Freire e do norte-americano David Ausubel, na qual o ponto de partida é a valorização dos conhecimentos do educando, ou seja, a idéia é aproveitar toda a experiência que o aluno preso adquiriu dentro e fora do presídio”, explicou Conceição.

Além do material oferecido pela Funap, os orientadores e alunos contam com outros materiais de apoio (livros paradidáticos, jornais e revistas) para que o ensino seja bem dinâmico.

Com as aulas mais interessantes, houve aumento substancial na escolaridade e na cultura geral da população carcerária. Pesquisa realizada pelo Instituto Paulo Montenegro e o Ibope Opinião, baseada no Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), mostra que os presos gostam mais de ler para passar o tempo e se distrair do que a população brasileira em geral. “Eles gostam de ler de tudo, pediram até para doarmos exemplares do conhecido A Arte da Guerra, de Sun Tzu, mas essa sugestão não pôde ser acatada”, disse Lúcia Casalli. Algumas empresas também doam livros à Funap que os distribui às unidades prisionais. A Fundação Wolkswagen doou à Penitenciária Feminina de Santana (capital paulista) 109 exemplares.

 

Diferencial – Outro diferencial que tem ajudado o sucesso do projeto é o preso monitor. “Ele tem o papel de articulador e representante entre o sistema educacional e o grupo em que está inserido. Ele fala a mesma ‘língua’ dos seus pares e descobrimos que onde há preso monitor, há menos evasão escolar”, explicou Conceição.

“O monitor preso passa por um processo de reciclagem e treinamento constantes, recebe um salário mínimo e há remissão de pena, ou seja, a cada três dias trabalhados, há a redução de um dia”, explicou Lúcia Casalli. “Há vantagem para os dois lados: o sistema conta com um profissional interessado em ensinar, enquanto o monitor preso tem a redução da sua pena”, disse Conceição.

A origem dos prisioneiros atuando como alfabetizadores remonta ao final dos anos 60, quando inúmeros intelectuais e estudantes universitários, condenados por causa de crimes políticos, cumpriam a sentença em meio à população condenada por crimes comuns. Este segmento organizou cursos, estudos, atividades culturais e assim começou um processo informal de alfabetização, uma vez que a grande maioria de prisioneiros era analfabeta ou semi-analfabeta.

 

Novos projetos – A Funap também realiza cursos profissionalizantes dentro das unidades prisionais. “Descobrimos qual a potencialidade da região e investimos em cursos adequados ao mercado de trabalho regional. Assim, quando o preso termina de cumprir a sua pena, ele tem uma profissão e pode inserir-se mais rápido na sociedade, evitando que retorne ao crime”, explicou José Eduardo Mariz de Oliveira, da Diretoria de Atendimento e Promoção Humana (DIAPH), da Fundap. Senac, Senai, Centro Paula Souza e Sutaco são alguns dos parceiros do projeto. Outro dado interessante é que em alguns cursos, como de pedreiro e azulejista assentador, o detento (que deve estar no sistema semi-aberto) ao terminar sua pena sai com emprego com carteira assinada na área da construção civil.

“No município de Tremembé, realizaremos um curso de papel artesanal, com duração de 12 meses. A Votorantim Papel e Celulose é nossa parceira. Os presos que participarem deste curso terão remissão de pena”, informou Lúcia. Quinze empresas estão interessadas em participar do projeto. A indústria calçadista Bertin também aderiu ao processo e dará um curso para formar pessoal especializado em calçados, e 150 presos, ao terminarem sua pena, sairão com carteira assinada e um emprego garantido. “Estou plenamente convencida de que os estudos e a profissionalização são mecanismos importantes para que o detento não volte ao círculo vicioso do mundo do crime”, concluiu Lúcia.

Maria Lúcia Zanelli

da Agência Imprensa Oficial