Marilena Ansaldi encerra carreira durante ‘Figuras da Dança’

Pioneira na criação de espetáculos que unem dança, teatro e recursos multimídia, artista se despede

dom, 14/09/2008 - 11h39 | Do Portal do Governo

No palco, uma saia de balé, um tapete, uma poltrona vermelha e luz. Esta simples composição serviu de cenário para uma das despedidas mais marcantes e importantes da história da dança no Brasil. Na noite da quinta-feira, 11, a desbravadora Marilena Ansaldi, aos 74 anos, atuou, pela última vez, como atriz e bailarina.

Em cena, a estrela cara-a-cara com sua vida, resgatada em forma de um vídeo projetado que serviu de pano de fundo para a última performance de uma das maiores artistas da dança-teatro do país. Visceral, Marilena encerrou sua carreira durante as gravações do ‘Figuras da Dança’, programa produzido pela São Paulo Companhia de Dança, cercada de amigos queridos e da gratidão de quem pôde vê-la pela última vez em erupção nos palcos.

No telão ao fundo, frases ditas em várias fases da vida, trechos de entrevistas, fotos da infância, adolescência, de seus espetáculos, pensamentos, sentimentos diversos. Opiniões sobre mente, corpo, movimento e paixão permearam a exibição do trabalho de toda uma vida dedicada à dança, ao teatro, à arte.

Simultaneamente à apresentação do vídeo, Marilena se apresentou fazendo pas de deux com a poltrona vermelha que compunha o cenário. Ora olhava o telão e ia ao encontro de sua vida, sua obra, seus queridos; ora dava as costas a tudo. 

Amigos íntimos de Marilena, diretores, autores e jornalistas, estiveram presentes e deixaram registrados suas impressões e carinho pela artista de múltiplas facetas.  Falaram ao ‘Figuras da Dança’ a jornalista Ana Francisca Ponzio, os diretores Celso Nunes, Cibele Forjaz, Marcio Aurélio e José Possi Neto que conseguiu sintetizar Marilena numa única frase “Falar de dança no Brasil sem falar de Marilena Ansaldi é não falar de dança, é não falar de Brasil”. Muito emocionada, a artista agradeceu o depoimento de todos.

Linha da vida

Marilena Ansaldi nasce em 4 de novembro de 1934 na cidade de São Paulo, filha do barítono Paulo Ansaldi e da corista Maria Nazareth da Silva. Em 1950, começa seus estudos em dança, com Rafic Garzuzi.

Em 1975, começa a trabalhar uma linguagem para o teatro com a peça autobiográfica Isso ou Aquilo?, que tem direção de Iacov Hillel. O Teatro Galpão é então inaugurado. Marilena ganha o Grande Prêmio da Crítica APCA, por sua atuação na criação do Teatro Galpão e em Isso ou Aquilo?, o prêmio Molière e o prêmio Governador do Estado de São Paulo. A partir deste ano, torna-se uma performer, misturando teatro e dança em todos os seus trabalhos.

No ano seguinte, ao lado de Rodrigo Santiago, atua no espetáculo Por Dentro / Por Fora, com argumento e textos de Mário Chamie. Em 1977, apresenta o espetáculo Isso ou Aquilo? no Festival Mundial de Teatro de Nancy, na França e na Itália. Recebe o prêmio de melhor espetáculo individual por sua participação. Escreve e atua em Escuta, Zé!, inspirado no livro de Wilhelm Reich com direção de Celso Nunes.

Em 1979, apresenta Um Sopro de Vida, adaptação da obra de Clarice Lispector, com direção de José Possi Neto. Recebe o prêmio APCA de melhor atriz, o prêmio Mambembe e o prêmio do Serviço Nacional do Teatro de melhor espetáculo. Já em 1980, escreve o roteiro, atua e produz o musical Geni, com texto de Chico Buarque e José Possi Neto, sob a direção de Possi. Remonta Escuta, Zé! e excursiona com a peça pelo interior se São Paulo.

Apresenta Picasso e eu, espetáculo que traz texto, concepção, cenografia, coreografia, trilha sonora, figurinos e interpretação seus, sob a direção de José Possi, em 1982. Em 1984, escreve, coreografa e atua em Se… Em 1987, apresenta Hamlet Machine, com texto de Heiner Müller e direção de Márcio Aurélio, que ganha o prêmio Molière. Recebe os prêmios Governador do Estado e Molière de melhor atriz pelo seu desempenho no espetáculo.

Adapta e atua em A Paixão Segundo G.H., da obra de Clarice Lispector, sob direção de Cibele Forjaz em 1989. O espetáculo faz parte 20ª Bienal de Arte de São Paulo. Em 1991, apresenta Clitemnestra, com direção de Antônio Araújo e texto de Marguerite Yourcenar. Recebe o APCA de melhor atriz pelo espetáculo. Afasta-se dos palcos pelos próximos doze anos, motivada pelo excesso de trabalho ininterrupto.

Retoma sua carreira nos palcos em 2005 com Desassossego, com direção de Márcio Aurélio e roteiro de Marilena. Em 2007, faz uma participação especial na peça A Metafísica do Amor, da Companhia Razões Inversas, com atuação de Paulo Marcello e direção de Márcio Aurélio

Figuras da Dança

Tendo por foco o percurso artístico e a obra de importantes personagens da história da dança no Brasil, a série de depoimentos públicos “Figuras da Dança” será gravada em DVD e veiculada em programas da TV Cultura nos meses de outubro e novembro.

Ao lado de material iconográfico e outros registros audiovisuais, o Projeto apresenta o artista por ele mesmo, em diálogo público com interlocutores convidados.

Diversos atores fundamentais da dança brasileira comentam seu trabalho, ajudando a compor um painel histórico dessa arte no Brasil.

A próxima

A professora Penha de Souza, idealizadora do Grupo Experimental de Dança, de grande notoriedade na década de 50, será a próxima homenageada pelo ‘Figuras da Dança’. A gravação é aberta ao público e acontece nesta quinta-feira, 18 de setembro, às 20h no Teatro Franco Zampari – Avenida Tiradentes, 451 – (ao lado do metrô Tiradentes).

Mariana Garbin com São Paulo Companhia de Dança

(M.G.)