Juventude: Projeto Oficina de Leitura leva livros para jovens da Febem de Itaim Paulista

Programa inédito realiza oficina com os internos por meio de textos literários para incentivar o hábito da leitura e da escrita

qui, 02/02/2006 - 19h25 | Do Portal do Governo

“Não tinha tempo para ler e ficava pensando em outras coisas”, relembra o adolescente L. L., 18 anos, ensino médio completo, do internato Encosta Norte da Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem), no Itaim Paulista, zona leste da capital. Minha vida mudou em dezembro do ano passado, quando o arte-educador Alessandro Buzo deu palestra para o lançamento do Projeto Oficina de Leitura nessa unidade. Desde então, o garoto se interessou pela atividade, participou das aulas e refletiu: “A oficina está sendo muito boa porque nos ajuda a amadurecer as idéias, eliminar pensamentos ruins e sair da rotina”.

O jovem conta que, com as histórias lidas e discutidas em grupo de oito integrantes é possível “ultrapassar os muros e viajar com as imagens dos textos”. A atividade serve também de inspiração para a escrita. L. L. observa que o vocabulário dos internos é muito diferente do restante da sociedade. E que o trabalho de Buzo pode ajudar na tentativa de introduzir outras formas de expressão. Também considera importante a oficina de rap existente na unidade desde o mês passado. Quando sair da Febem, seu sonho é cursar faculdade de música. Em diversas passagens pela fundação, relata que aprendeu a tocar cavaquinho e outros instrumentos musicais, além de ter participado de cursos de culinária, artesanato, recuperação de alto-falantes e informática.

Despertando interesse – Esse é o primeiro projeto de leitura numa unidade da Febem. “Durante a palestra de apresentação da iniciativa, perguntei quem já havia lido um livro. Fiquei surpreso. Apenas 10% tiveram contato com alguma obra literária”, informa Buzo, colunista da revista Rap Brasil, educador do Projeto Fábricas de Cultura, do governo do Estado, e autor dos livros O Trem, Baseado em Fatos Reais; Suburbano Convicto, o Cotidiano do Itaim Paulista e O Trem, Contestando a Versão Oficial.

O curso terá duração de seis meses, com aulas semanais de uma hora e meia, sempre aos sábados pela manhã. “A idéia é trabalhar com textos e livros e promover leituras dinâmicas das quais todos participem”, explica o arte-educador. Não há diferença entre quem tem mais ou menos instrução, basta saber ler. Para as primeiras aulas, Buzo selecionou textos sobre literatura marginal extraídos de edição especial da revista Caros Amigos. A intenção é despertar o interesse dos adolescentes pela leitura, mostrando obras de autores da periferia: “Começamos com textos fáceis, de escritores que vivem ou viveram aqui e conhecem as nossas dificuldades”, informa.

Cidade de Deus

Nas duas primeiras aulas, foram lidos e debatidos os textos Diário de um Detento e A lua e Eu, ambos de Jocenir, Cidade de Deus, de Paulo Lins, Jibóia, de Clóvis de Carvalho, Todo Homem é Culpado do Bem que Não Fez, do próprio Buzo, entre outros.

“Autores da periferia, como eu, que cresci e vivo no Itaim Paulista, escrevem livros e mostram horizontes da literatura que antes não existiam. O pessoal daqui gosta de mim porque se identifica comigo”, afirma Buzo.

Nas oficinas, o primeiro passo é contagiar os internos com a leitura. Depois, incentivar a escrita. As melhores redações serão publicadas em sites temáticos de hip hop, rap e nas páginas da Internet Suburbano Convicto, de Alessandro Buzo e da Febem. “Após saírem daqui, mesmo que esses garotos não se tornem escritores, é claro que vão adquirir gosto pela leitura”, prevê. A meta é elevar sua auto-estima, pois a “literatura tem o poder de mudar uma vida”. Assim que os jovens estiverem mais acostumados com a expressão literária, o arte-educador pretende adotar clássicos como Capitães de Areia, de Jorge Amado, e obras do alemão Charles Bukowski, um dos autores contemporâneos mais conhecidos nos Estados Unidos.

O arte-educador montou biblioteca comunitária no Itaim Paulista que reúne mais de 2 mil títulos. O diretor do internato, Flagas Rodrigues Lopes, sugeriu que ele aproveitasse essa experiência e instalasse uma pequena biblioteca nas instalações da Febem. R. S. conta que gostava de ler histórias em quadrinhos, mas agora se interessou também pela literatura marginal: “O modo como ele (Buzo) fala é idêntico ao nosso. É atencioso com a gente. Ele me fez pensar que, se quiser, posso escrever alguma história também”.

Falando a mesma língua

Na opinião do diretor da Divisão de Internatos, Caio José Almeida de Souza, a ação é inovadora: “Aulas com um profissional que fala a mesma língua dos garotos são mais produtivas”. No decorrer do semestre haverá avaliação da oficina. Se os resultados forem positivos, poderá ser ampliada para outros internatos e unidades da Febem. “A casa só consegue desenvolver atividades quando o adolescente está preparado para recebê-las, cumpre as rotinas, age com respeito e tem o apoio dos funcionários”, destaca Souza.

A unidade de ressocialização integra 64 jovens entre 14 e 18 anos e 11 meses que cometeram infrações primárias graves. Lá, têm à disposição ensinos fundamental e médio, cursos de profissionalização de informática, panificação e culinária, entre outros. Todos em parceria com a Fundação Paula Souza. Há, ainda, escolinha de futebol, basquete e artesanato.

Viviane Gomes – Da Agência Imprensa Oficial