Íntegra da coletiva do governador Mário Covas após cerimônia de posse de tradutores públicos

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sex, 28/07/2000 - 16h44 | Do Portal do Governo

Repórter – Como é que o senhor avalia essa reação do presidenciável Ciro Gomes com essa carta aberta ao presidente Fernando Henrique, destacando sete episódios que ele disse que houve corrupção, depois daquele ensaio de aproximação com o senhor, com o PSDB, que foi costurado pelo Jungman no início do mês? Como é que o senhor avalia isso?

Covas – O Jungman deu uma opinião pessoal.

Repórter – Mas havia uma tentativa de aproximação. Ou não?

Covas – Eu nunca vi isso colocado explicitamente, a não ser colocado por terceiros, que dão a sua opinião. Eu não avalio isso. Parece que houve uma afirmativa feita pelo Ciro, que foi respondida pelo presidente. E isso que você está me falando, que eu ainda nem vi, ele teria escrito uma carta para ele destacando vários pontos? Tudo bem. Eu acho que querer jogar nas costas do Fernando Henrique a pecha de corrupção é besteira. Vale da mesma maneira que valem aquelas coisas que o PC do B, o PSTU, o PT passam aí na rua carregando “Fora Fernando Henrique”, “Fora FMI”. Tem valor meramente exibicionista, não tem nenhum valor.

Repórter – Mas parece que as críticas do Ciro Gomes irritaram mais, ou provocaram uma reação diferente no presidente Fernando Henrique do que as críticas feitas pelo PT, pelo PSTU e por esses outros partidos da oposição. O presidente respondeu ao Ciro Gomes, lembrando de uma obra irregular que foi cara lá no Ceará e que foi feita na gestão do Ciro Gomes.

Covas – Eu não sei. Eu não li nada sobre isso. Vocês estão me contando uma coisa da qual eu não sabia. Eu não sabia nem que o Ciro tinha mandado uma carta aberta, nem que o Fernando tinha respondido. Mas também se soubesse, eu não teria nada a dizer sobre isso.

Repórter – E sobre a volta do ACM, governador?

Covas – Volta?

Repórter – Ele voltou da Espanha. Ele estava em férias e voltou da Espanha. Dizem que a cavalaria. Foi para ajudar o presidente Fernando Henrique. Ele já voltou e disse que a culpa de tudo isso que está acontecendo é do TCU, Tribunal de Contas da União.

Covas – Que não tomou providências?

Repórter – Exatamente.

Covas – Que não averiguou em tempo hábil aquilo lá?

Repórter – Exatamente.

Covas – Esse negócio de procurar culpa é uma coisa muito complicada. Quando se dá balanço, todo mundo tem culpa.

Repórter – Mas é importante essa reação do ACM, por exemplo? Os analistas políticos estão entendendo que esse retorno do ACM seria equivalente a cavalaria que chegou para salvar…

Covas – Chegou a cavalaria?

Repórter – Exatamente.

Covas – Não, eu não falo isso. Quem sou eu para falar que a cavalaria está chegando, imagina. Isso colocado na boca dos analistas não tem problema, mas colocado na minha boca, vira escândalo na hora.

Repórter – Para salvar o presidente dessa crise.

Covas – Cavalaria? Tá bom. Eu não sei. Eu estou muito preso aqui. Eu estou muito longe da política nacional. Não entendo disso. Não é meu horizonte.

Repórter – Ninguém conversa com o senhor sobre isso?

Covas – Às vezes um ou outro jornalista de Brasília conversa, mas é o máximo. Eu também estou muito preso aqui. Tenho que me defender das acusações do Eduardo Jorge, de forma que eu não tenho tempo de tratar dessas coisas.

Repórter – E aquele levantamento com a distribuição dos recursos para prefeituras? O senhor até agora não divulgou, né?

Covas – Eu disse para vocês que divulgo na hora que eu quiser.

Repórter – Mas quando o senhor vai achar conveniente divulgar isso?

Covas – Olha, eu estou fazendo isso com um cuidado meticuloso. Valor por valor. Podia até fazer hoje se eu quisesse fazer alguma coisa bem aproximada. Mas eu não quero fazer alguma coisa aproximada. Eu quero fazer uma coisa absolutamente certa. As obras feitas pela Sabesp, por exemplo, nas quais foram investidos R$ 3 bilhões, é difícil você atribuir aos municípios porque em geral elas são obras coletivas. As obras do ABC, por exemplo, onde o PT tem três prefeituras. Então, como é que você distribui a estação de tratamento de esgoto que custou R$ 100 milhões? Como é que você distribui a estação de tratamento de água? É esse problema que ainda está emperrando o anúncio. Para mim é uma obrigação porque eu fui acusado de favorecimento. Eu fui acusado de parcialidade. Eu fui acusado de fazer como o Lula, que fala que greve dos professores em Minas e no Rio Grande do Sul não é para fazer porque eles são da oposição. É para fazer aqui em São Paulo e em Florianópolis. Então, eu quero mostrar, até porque as minhas contas não correspondem às da Folha (referindo-se ao jornal Folha de São Paulo).

Repórter – Esse levantamento que o senhor vai divulgar é com relação à última distribuição de recursos ou a distribuição durante todo o Governo?

Covas – As duas coisas. Não pense que eu vou me esconder atrás de nenhum número. Aqui não se esconde atrás de nada. A gente mostra tudo. Agora, as últimas coisas que foram feitas são convênios feitos inclusive nas viagens que eu faço. São convênios que eu autorizo. E não dá para você medir uma coisa por um ato, você tem que fazer essa conta para o Governo inteiro. Mas eu vou apresentar as duas até porque está bem errada aquela.

Repórter – O senhor acha que agora, na volta do recesso parlamentar, o Governo vai tentar implantar uma agenda positiva?

Covas – Qual Governo? O Federal?

Repórter – O Federal.

Covas – Eu acho que ele está fazendo isso há bastante tempo, não é agora, depois da volta do recesso parlamentar. Eu acho que o Governo ataca em muitas frentes concomitantemente. Ele tem muitos programas. Então, o programa é anunciado, passa a ser realizado e se perde de vista o programa. Era melhor concentrar – quem sou eu para estar dando palpite – mas era melhor concentrar em quatro ou cinco programas e bater naqueles quatro ou cinco programas.

Repórter – Esse plano de combate à pobreza que eles estão …

Covas – Não, o fundo da pobreza saiu do Congresso. É uma iniciativa do Antonio Carlos Magalhães.

Repórter – Essa reunião do presidente com os governadores…

Covas – Eu não sei, vocês estão falando nessa reunião. Eu estou chegando à conclusão que eu fui excluído porque não fui avisado até agora.

Repórter – É que são os Estados mais pobres.

Covas – Ah… só os pobres. Eu quero saber qual é o Estado que tem uma periferia mais pobre que o Estado de São Paulo. Aqui em São Paulo você tem o maior ajuntamento de pobreza reunida no Brasil. Não tem nenhum lugar como a região metropolitana de São Paulo, que tem 16 milhões de pessoas, onde se tenha tanta pobreza concentrada como aqui em São Paulo, nenhum.

Repórter: O sr. acha que o governo de São Paulo também deveria estar sendo atendido por esse socorro, do Governo Federal?

Covas: Se o problema é contra a pobreza tem que atacar a pobreza onde ela existe. E ela existe em todos os lugares, e aqui em São Paulo também. Há Estados onde o nível geral da pobreza é maior. Se pegar a renda per capta de São Paulo, ela é maior, mas em compensação, você tem bolsões de pobreza que não têm em nenhum outro lugar. Em número, quantitativamente, não é uma boa medida essa, mas quantitativamente, você tem um volume de pobreza muito maior aqui, do que em qualquer outro Estado que você considerar. Embora você tenha uma renda per capta dentro do Estado, porque você também tem muita riqueza maior do que outros Estados. Então a pobreza para ser enfrentada, tem que ser enfrentada para todo mundo. Para na hora de pagar a dívida para o Governo Federal, eu faço que nem os outros. Nada de enfrentar (inaudível) eu não faço que nem os outros. Eu estou duvidando disso, não acredito que o Governo fizesse essa separação. Se ele está querendo fazer um projeto contra a pobreza, evidentemente que ele vai levar em conta, onde ela existe. E ela também existe em São Paulo.

Repórter: Mas o sr. está dizendo que não foi convidado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso….

Covas: Eu não sei se não fui convidado. Eu não recebi notícia até agora. Soube ontem por você aí.

Repórter: A reunião já está acontecendo…

Covas: Pois então eu não fui convidado (risos). Se ela já está acontecendo ou eu estou muito atrasado na vida ou então…

Repórter: O que a gente pode concluir disso governador?

Covas: Eu não sei, pouco me importa o que vocês concluam. Não adianta eu dizer a minha opinião que vocês vão por a de vocês. Que quê adianta isso? Vocês vão por o que vocês acharem. Eu só estou contando o que aconteceu.

Repórter: Diante disso, o sr. se sente excluído?

Covas: Eu não me sinto excluído de nada. Vocês vão ficar a vida inteira tentando me fazer brigar com o presidente Fernando Henrique, e eu não vou brigar com ele. Pode botar as cascas de banana que vocês quiserem.

Repórter: E da Assembléia Legislativa, o que quê o sr. espera nesse segundo semestre?

Covas: Que venha atuando como a Assembléia Legislativa. Fazendo seus deveres assim como a gente procura fazer aqui o nosso. Eu não me meto na vida da Assembléia. A Assembléia é outro órgão absolutamente independente. Poucas vezes a Assembléia foi tão pouco influenciada pelo Executivo como nesse Governo. A Assembléia tem total autonomia para fazer o que ela quiser. E eu respeito, mesmo discordando de certas coisas. CPI da Educação, por exemplo, eu discordo inteiramente do que foi feito e discordo com base regimental, que afinal de regimento parlamentar eu entendo um pouco. Fui 16 anos líder. Dezesseis anos líder não, mas fui muito desses anos líder e portanto era obrigado conhecer o regimento interno do Senado, da Câmara. Até em grêmio estudantil de primário, presidente só dá voto em caso de empate. Só dá voto de minerva. Presidente não dá voto em separado, e muito menos transforma o seu voto separado, que podia dar, em voto definitivo. Quando se tem uma comissão que o parecer do relator não é aprovado, o presidente nomeia um outro para relatar o vencido. Mas nunca pega a sua opinião e transforma a sua opinião em relatório. Isso é absolutamente desqualificado do ponto de vista regimental. Mas enfim…

Repórter: O sr. teria um algum projeto prioritário lá na Assembléia…

Covas: Alguns. Por exemplo, nós estamos lá com um pedido de US$ 150 milhões ou US$ 200 milhões de empréstimo já concedidos, que precisa de autorização da Assembléia para conservação de estrada. Já está lá há algum tempo. É uma coisa que normalmente interessa ao Estado, muito mais do que ao meu governo. Se não vier esse dinheiro o número de estradas que vão receber conservação é menor.

Repórter: De onde que vem esse empréstimo?

Covas: Do BID.

Repórter: Que mais? Além desse projeto quais outros?

Covas: Nenhum projeto que signifique a sobrevivência do Executivo. Nenhum. Eu não mando nada para a Assembléia que seja alguma coisa fora de propósito. Eu não tenho queixa da Assembléia. A Assembléia faz o que ela acha que tem que fazer e nesses cinco anos e meio de convivência, a gente tem convivido com respeito comum, de forma que não tem nenhum problema.

Repórter: O sr. acha que houve exagero, falando em Assembléia do Legislativo americano, que debateu a crise do Governo Fernando Henrique inclusive supondo até que ele podia ser motivo de renuncia?

Covas: Imagina se quando houve a crise nos Estados Unidos do presidente que estava sendo processado, no parlamento brasileiro alguém falasse da renúncia do presidente Clinton? Como é que seria recebido isso?

Repórter: Mas o Palácio (do Planalto) atendeu os jornalistas estrangeiros para dar uma resposta ?

Covas: Lógico. Ele tem que dar a resposta mesmo. Esse é um assunto interno e ninguém tem que dar palpite nisso. E sobretudo ninguém tem de dar palpite errado.

Repórter: Mas houve exagero então?

Covas: Eu acho que é. Isso escapa. Isso não se fala.

Repórter: Não é caso nem de renúncia..

Covas: Não. Eu não estou julgando o mérito. O mérito não tem nem que julgar. Não é caso você fazer uma consideração dessa num outro país, a respeito do governo de um país. A não ser que esse país não tenha autonomia para resolver seus próprios problemas. E não é o caso Brasil. Não é razoável isso. Eu acho que ninguém vai impedir ele (o deputado norte-americano) de falar o que quer. Isso cria a possibilidade de um tratamento igual aqui. E na hora que tiver um tratamento igual, sem dúvida nenhuma que eles (EUA) não vão gostar.

Repórter: A discussão dessa crise, por exemplo, não poderia paralisar as atividades do Legislativo? A cada dia que passa surge uma nova denúncia. Não sei se é verdadeira ou falsa sobre o Eduardo Jorge o envolvimento dele em várias situações. A discussão disso não poderia levar a paralisação das atividades do Congresso?

Covas: O país foi capaz de fazer o impeachment de um presidente, sem que ele tivesse tropeço. As coisas aconteceram dentro da maior normalidade, o presidente foi deposto. E a vida continuou. Assumiu o vice-presidente e as coisas continuaram, os negócios continuaram, a escola continuou funcionando, a Justiça continuou funcionando, tudo continuou funcionando. Eu acho que nós já chegamos num grau de maturidade democrática que impede uma especulação como essa. Não paralisa. Pode até movimentar, centralizar, até porque os fatos ocorrem num período de recesso, ou seja, usaram esse período muito bem porque vocês (se referindo à imprensa) não tinham concorrência do Congresso, então vocês tocaram a viola aí. Agora o Congresso reabre evidente, que vai ter repercussão no Congresso, é inevitável isso. Ontem, até um de vocês me perguntavam se não ia ter uma CPI da Cosesp na Assembléia?

Repórter: O deputado Gilmar Tatto disse que no dia 1º de agosto, quando retorna a atividade parlamentar, ele vai entrar com um pedido de abertura de uma CPI para investigar a Cosesp.

Covas: Para mim tanto faz. Por falar nisso, você está a par que o governador do Mato Grosso nomeou 14 pessoas da família quando assumiu. E ele é do PT. Quem sabe se os caras podiam fazer uma investigação sobre isso. Saiu uma vez no jornal, depois nunca mais saiu. Você ouviu uma história sobre uma convenção do PT no Rio de Janeiro, onde tinha uma gravação de uns caras oferecendo dinheiro para dar voto. Muita pouca gente ouviu.