Fundação Casa Arujá festeja resultados com metodologia americana

Unidade adota experiência que inspira adolescentes infratores a reconhecerem suas falhas

ter, 02/12/2008 - 16h07 | Do Portal do Governo

A Fundação Casa de Arujá, na Grande São Paulo, funciona há um ano e vem adotando princípios inovadores de uma ONG americana e comemora resultados positivos. Os adolescentes exercem funções que lembram as tarefas executadas numa empresa ou no lar. É o caso de Denis, 18 anos, internado na unidade há 12 meses. Ele é chefe de manutenção e lidera 14 colaboradores e um assistente: “Minha função exige voz ativa e jeito para conversar com as pessoas”. Para evitar ociosidade, ele divide as tarefas de limpeza entre todos. Cada trio se encarrega de limpar uma repartição do prédio (quadra, quartos, cozinha, salas de cursos). “Aqui, aprendo a ser responsável, o que eu não era lá fora. Em vez da liderança do mal (tráfico de drogas), escolho a do bem”, reforça o garoto.

O modelo de assistência inspira-se na metodologia Comunidade Terapêutica, do Instituto Daytop, ONG norte-americana. Em alguns países, é utilizada para tratamento de dependentes químicos, em outros, como nos Estados Unidos, é aplicada para correção de comportamento de presidiários. “A filosofia baseia-se em valores, regras e tarefas ensinados numa família. Cada um tem responsabilidades, assume seus erros e se corrige”, explica o psicólogo Cláudio Bartholomeu Garrett, da Casa Arujá.

Regina Célia Lima de Souza, encarregada da área técnica, diz que o condicionamento para a repetição de atividades e o cumprimento de horários contribuem para a mudança de comportamento. Há um mês, a metodologia também passou a ser adotada na unidade (feminina) de Guarulhos da Fundação Casa.

Reflexão – Todos os dias, bem cedinho, técnicos e equipe multiprofissional da Casa Arujá reúnem os 40 adolescentes internos de 13 a 19 anos. A programação inclui oração cristã, leitura da filosofia da Comunidade Terapêutica e notícias selecionadas pelos próprios meninos.

Num trecho de reflexão da Daytop, lido diariamente, consta: “Estou aqui porque finalmente não há mais como me refugiar de mim mesmo. Até que não compartilhe os meus segredos, não me libertarei deles. Neste solo, poderei criar raízes e crescer. Não mais isolado como na morte, mas vivo para mim e para os outros”.

É o momento para refletir sobre o comportamento positivo e negativo do dia anterior. Os jovens se levantam espontaneamente e fazem comentários diversos. “Por exemplo, um se arrepende pela roupa bagunçada do quarto ou outra atitude errada. Há também aquele que estava deprimido pela saudade da família e agradece apoio e abraço do interno e do funcionário”, conta o psicólogo Garrett.

No final do encontro, alguns meninos cantam música evangélica ou lêem uma mensagem positiva. Garrett diz que ficam mais revigorados para outro dia de internação. Eles cometeram crime primário e permanecem na unidade de seis meses a três anos, conforme melhora de comportamento, avaliação psicológica e judiciária. O psicólogo diz que ao chegar à instituição são violentos e arredios: “Em média, após três meses se adaptam, corrigem a maneira de conversar, com menos gírias e agressividade”. Em caso extremo, a sanção disciplinar é reclusão de um a 30 dias num quarto. Apesar do isolamento, recebem atendimento médico, psicológico e outros.

Evolução – Os internos são divididos em grupos e atuam nos setores de comunicação, cozinha, manutenção e expedição. À medida do desenvolvimento pessoal, avaliado por técnicos e psicólogos, exercem função de colaborador, assistente e até chefe, como Dênis.

Na Casa Arujá os jovens são chamados pelo nome. Adesivos coloridos no crachá indicam a evolução de comportamento. A primeira etiqueta colada, ao chegarem à Fundação, é a vermelha, que simboliza conduta errada. Depois, vêm outras cores: amarela (atenção), verde (siga em frente e estabeleça metas) e azul (apto à ressocialização). Os passos são acompanhados de avaliação e orientação psicológica. Em média, a cada três meses avança-se um nível.

“A saída depende do crime que cometeram e de seu comportamento. Às vezes não têm família nem moradia. Os setores públicos analisam cada caso”, informa o psicólogo.

A Casa Arujá promove atividades chamadas seminário e grupo de sentimentos. No primeiro, o funcionário explica os objetivos das atividades e as regras da instituição, entre elas proibição de gírias e de atitudes violentas.

A segunda é realizada a pedido dos garotos que brigam, para reconciliá-los. “Serve para expressar a raiva e resolver o desentendimento com o apoio dos técnicos. No final, se abraçam e eliminam a mágoa”, explica a encarregada Regina Célia. Oficinas de artesanato, panificação, ensino formal, informática, aula de religião, de música e esportes são outras atividades oferecidas.

Cidadania de volta – O primeiro ano de funcionamento da Casa Arujá com aplicação da filosofia Daytop produz bons resultados. Neste período, 16 jovens deixaram a unidade por determinação da Justiça. “Mantemos contato porque o envolvimento é intenso. Sabemos que oito deles trabalham e retornaram aos estudos, e quatro estão na informalidade”, diz Regina. Não há caso de reincidência.

“A gente se emociona quando dizem que aprenderam muito aqui porque cumprimos o objetivo de recuperar a cidadania”, relata Shirley Aparecida Cristal, gerente administrativa da Sociedade Assistencial Ampara Brasil (Saab), ONG parceira da Casa Arujá.

A Fundação é responsável pela direção e segurança da unidade, enquanto a Saab oferece equipes técnica e multiprofissional. Antes de iniciar o trabalho, os 110 funcionários foram capacitados pela Daytop para aprender a filosofia americana.

No mês passado, houve festa na Casa Arujá para celebrar um ano da unidade. Com apoio dos instrutores, os garotos prepararam o coquetel servido aos fornecedores convidados, “que ficaram surpresos com o comportamento dos meninos”, conta Shirley. A boa impressão rendeu frutos. As empresas parceiras convidaram dois jovens para trabalhar.  Instituições do Brasil, Espanha, Canadá e França, que cuidam de jovens infratores, visitaram a Casa Arujá para conhecer a experiência inovadora.

Vivendo e aprendendo

“Aqui na Fundação Casa Arujá aprendi a me conhecer melhor e o princípio para viver melhor lá fora”, opina Michel, 18 anos, internado por tráfico de drogas. Ele diz que agora convive melhor com as pessoas e reflete sobre suas angústias com otimismo. Participa das aulas de desenho, elétrica, informática e confeitaria.  “Quando sair, tenho certeza que encontrarei trabalho porque os cursos vão me ajudar”. O menino sonha ingressar numa faculdade, mas está indeciso sobre cinco cursos: engenharia elétrica, engenharia da computação, design, arquitetura e ciências da computação.

(Os nomes de todos os jovens são fictícios)

Viviane Gomes – Da Agência Imprensa Oficial