Fapesp e Museu de Houston reúnem documentos da arte brasileira

É a vertente nacional do programa Documentos do Século 20, com textos, manifestos e depoimentos de artistas latino-americanos

qui, 26/07/2007 - 10h51 | Do Portal do Governo

Brasil faz parte do grupo de países latino-americanos que integram o programa de cooperação internacional com o Museu de Belas Artes de Houston (MFAH), nos Estados Unidos, com o objetivo de recuperar e digitalizar documentos sobre arte. O convênio, celebrado entre o museu e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), denomina-se Arte no Brasil – Textos Críticos do Século 20.

Os trabalhos ficarão a cargo da Universidade de São Paulo (USP), sob a coordenação da professora Ana Maria de Moraes Belluzzo, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. O Museu de Belas Artes de Houston e a Fapesp destinarão R$ 1,3 milhão para os dois primeiros anos do projeto. A equipe da USP selecionará e digitalizará documentos primários e raros – manuscritos, cartas e manifestos produzidos por artistas e críticos brasileiros entre as primeiras décadas do século 20 e os anos 80.

O material ampliará compilações de textos da mesma natureza, reunidos desde 2003 por equipes de especialistas na Argentina, Chile, México, Colômbia, Peru, Venezuela e também nos Estados Unidos, no âmbito do projeto Documentos do Século 20 – Arte Latino-americana e Latino-norte-americana. A coordenação é do Centro Internacional para as Artes das Américas (ICAA), vinculado ao museu de Houston. 

Vanguarda – O programa Documentos do Século 20 trabalha com textos suficientes para abastecer os pesquisadores com matéria-prima à compreensão de movimentos artísticos. Até o fim do ano, deverá ter reunido 6 mil documentos nos países participantes.

A equipe da USP pré-selecionou 200 documentos para trabalhar. São textos como uma carta de Ferreira Gullar a Mário Pedrosa, datada de fevereiro de 1959, que trata do Manifesto Neoconcreto, que seria lançado com outros artistas de vanguarda naquele ano. Ou um livro artesanal de colagens, produzido em 1963 pela pintora e escultora Lygia Clark (1920-1988), no qual conceitua algumas de suas técnicas.

Há ainda o livro Escultura Popular Brasileira, de 1944, em que o arquiteto Luiz Saia analisa conjunto de obras coletadas em 1938 no Nordeste por uma missão de pesquisa folclórica. Trata-se de trabalho iniciado pelo Departamento de Cultura de São Paulo, então dirigido por Mário de Andrade, expoente maior do modernismo brasileiro. 

Para texano ver – Todo o acervo internacional sobre arte (brasileira e dos demais países) estará disponível em 2008 no portal do museu de Houston, na Internet, na forma de banco de dados público. As informações servirão de base para coletânea de livros em inglês, português e espanhol sobre arte latino-americana.

O programa internacional foi concebido a partir da formação de coleção de obras latino-americanas, para atender à demanda do público e de historiadores da arte nos Estados Unidos, mais familiarizados com o que é produzido na Europa, os quais pouco conhecem dos movimentos artísticos latino-americanos. O objetivo é suprir essa carência e valorizar a arte latino-americana.

A situação geográfica do Museu de Houston, cidade localizada no Estado do Texas, fronteiriço ao México, tornava essa lacuna mais evidente. O diretor do Museu de Houston, Peter Marzio, informa que 60% das crianças texanas em idade escolar descendem de latinos. “Mas as escolas não têm informação para lhes mostrar o que é arte latina”, explica.

Ele resolveu, então, sair à procura das melhores obras de artistas norte-americanos de origem latina para montar exposição, mas constatou que pouco se sabia acerca de movimentos artísticos latino-americanos. Em 2001, o museu criou o ICAA com a missão de disseminar e estudar a arte latino-americana nos Estados Unidos. O público norte-americano desconhece artistas da Argentina, do Brasil ou da Colômbia. Apenas o vizinho México é mais lembrado quando o assunto é arte, com a famosa pintora Frida Kahlo à frente.

A coordenadora na USP, Ana Beluzzo, conta que os escritos de artistas são importantes para a pesquisa porque se baseiam na experimentação e traçam análises que a crítica jamais poderia supor. “Os textos de arte são sempre referentes às obras, mesmo que não as citem. A história estabelece relação entre obra e texto”, diz a coordenadora.

Ela assegura que o ambicioso projeto permitirá que a história desse período do século 20 possa ser repensada e escrita de forma diferente: “Será possível pensar a partir da visão que os artistas e críticos tinham na época e ver como certas questões aparecem ao longo das décadas. Não podemos pensar com a cabeça de 2007 o que aconteceu em 1930”.

O presidente da Fapesp, Carlos Vogt, ressalta que os documentos permitirão enxergar a arte latino-americana de maneira mais clara e, ao mesmo tempo, mais complexa. “Fornecerão condições para o desenvolvimento de atividades didáticas e pedagógicas nas instituições de ensino dos países participantes”, diz Vogt. 

Da Revista Fapesp