Fapesp apoia pesquisa que pode auxiliar no combate à malária

Por meio de testes, composto surge como candidato à elaboração de um remédio contra o parasita causador da doença

qui, 16/08/2018 - 19h07 | Do Portal do Governo

Pesquisadores do Centro de Pesquisa e Inovação em Biodiversidade e Fármacos (CIBFar), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), desenvolvem estudos que podem auxiliar no combate à malária. Em testes realizados em camundongos e em cultivo in vitro, uma molécula desenhada nesse espaço foi capaz de matar o parasita causador da doença.

Sintetizado em laboratório, o composto surge como candidato à elaboração de um remédio contra a malária. Vale destacar que a possibilidade de um novo medicamento traz esperança a milhares de pacientes infectados pelo Plasmodium falciparum, sobretudo pelo fato de os testes mostrarem que a molécula foi capaz de matar, inclusive, a cepa resistente aos antimaláricos convencionais.

É importante frisar, ainda, que a molécula apresenta baixa toxicidade e alto poder de seletividade, atuando apenas no protozoário e não em outras células do organismo do hospedeiro. Ela deriva da classe das “marinoquinolinas”, com destacada atividade biológica. A pesquisa também recebeu o apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Instituto Serrapilheira.

Segundo informações da Organização Mundial da Saúde (OMS), a malária mata 445 mil pessoas por ano. “Se hoje, com o medicamento eficaz, temos um número tão alto de mortes, se não houver o desenvolvimento de novos fármacos no futuro a malária pode matar muito mais. É a parasitose que mais mata no mundo ainda que atualmente tenha tratamento relativamente eficaz”, disse Guido.

Inibição

Em artigo publicado na publicação Journal of Medicinal Chemistry, os cientistas descrevem a ação inibitória do composto na fase sanguínea e hepática do ciclo assexuado do protozoário, responsável pelos sinais e sintomas da doença.

Além dos estudos realizados com cepas de cultivo in vitro, os pesquisadores também testaram a molécula em camundongos. “Nos testes, já no quinto dia de estudo, a molécula conseguiu reduzir 62% da quantidade de parasitas no sangue. Ao fim dos 30 dias, todos os camundongos que ingeriram doses da molécula sobreviveram”, explica à Agência Fapesp o professor Rafael Guido, do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da Universidade de São Paulo (USP) e um dos autores do artigo.

De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) a malária mata hoje 445 mil pessoas por ano. “Se hoje, com o medicamento eficaz, temos um número tão alto de mortes, se não houver o desenvolvimento de novos fármacos no futuro a malária pode matar muito mais. É a parasitose que mais mata no mundo ainda que atualmente tenha tratamento relativamente eficaz”, completa o pesquisador.

De acordo com os cientistas, os testes foram realizados em modelo animal infectado por P. berghei, pois o P. falciparum não infecta camundongos. A molécula candidata a virar fármaco foi sintetizada tendo como base compostos naturais encontrados em bactérias marinhas, que foram avaliadas quando descobertas contra a malária, doença de chagas e tuberculose. No entanto, os produtos naturais apresentaram apenas ação de moderada a fraca contra os patógenos.

“O núcleo dessas moléculas nos chamou a atenção. Essa é uma estrutura rara entre produtos naturais e pouco abordada na literatura científica”, analisa o professor Carlos Roque Duarte Correia, do Instituto de Química da Unicamp. Em 2012, o grupo de pesquisadores publicou uma das primeiras sínteses das marinoquinolinas naturais na literatura.

Concentração

Os mecanismos de ação da molécula ainda não são totalmente conhecidos. Sabe-se, contudo, que entre eles está uma via clássica de inibição do parasita, conhecida como “metabolismo de hemozoína”.

A estratégia consiste em manter baixa a concentração desse composto que é tóxico para o parasita. Quando o parasita se instala no hospedeiro, ele infecta primeiramente as hemácias, os glóbulos vermelhos, uma vez que a hemoglobina presente nessas células é a única fonte de energia que ele tem para consumir.

No entanto, a hemoglobina contém uma molécula de cofator ligada em sua estrutura chamada “grupo heme”, que, na forma livre, quando está desligado da hemoglobina, é altamente tóxico para os parasitas.

Anos de evolução deram ao ser vivo a capacidade de desenvolver um mecanismo que o livra da toxicidade. “Essa estratégia do parasita de obter energia sem se intoxicar funciona mais ou menos como jogar a poeira para baixo do tapete. O ‘grupo heme’ continua lá, mas em uma forma que não é tóxica para o parasita”, diz Rafael Guido.

“A molécula atua impedindo a formação do polímero hemozoína, que é a forma que o parasita desenvolveu para se livrar da toxicidade do grupo heme. Ao impedir a formação da hemozoína, o parasita morre”, destaca Célia Regina Garcia, professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) e também autora do artigo. A docente trabalhou em parceria com o CIBFar e foi responsável pelos testes do mecanismo de ação da molécula no parasita.