Estudo avança compreensão sobre origem das doenças autoimunes

Grupo de pesquisadores da USP usou ferramenta de edição do DNA para entender como ele atua no controle de doenças autoimunes

qui, 09/08/2018 - 17h17 | Do Portal do Governo

O sistema imunológico humano às vezes falha ao reconhecer tecidos e órgãos como elementos próprios do corpo e passa a atacá-los como se fossem invasores. Esse erro de identificação é denominado autoimunidade agressiva e desencadeia doenças como a síndrome poliglandular autoimune tipo 1 (APS-1) e o diabetes mellitus do tipo 1.

Nos últimos anos, descobriu-se que dois genes que atuam nas células da medula do timo (células mTEC) controlam a autoimunidade agressiva: o Fezf2 (sigla em inglês de forebrain-expressed zinc finger 2) e, principalmente, o Aire (sigla em inglês de autoimmune regulator).

Um grupo de pesquisadores das faculdades de Medicina (FMRP) e de Odontologia de Ribeirão Preto (FORP) da Universidade de São Paulo (USP) usou o sistema CRISPR/Cas9 – uma ferramenta de edição do DNA – para manipular o gene Aire e, dessa forma, entender melhor como ele atua no controle de doenças autoimunes.

O estudo, resultado de um projeto de pesquisa apoiado pela FAPESP e do trabalho de mestrado de Cesar Augusto Speck-Hernandez feito na FMRP-USP, foi publicado na revista Frontiers in Immunology.

“Usamos, pela primeira vez, o CRISPR/Cas9 para ‘anular’ o Aire em células mTEC de camundongos cultivadas in vitro (fora do corpo dos animais) e estudar o efeito da perda de função desse gene”, disse Geraldo Aleixo Passos, professor da FMRP e da FORP-USP e coordenador do projeto, à Agência FAPESP.

Passos explica que as doenças autoimunes são desencadeadas por autoanticorpos (que reagem contra o próprio corpo) ou pelos linfócitos T autoagressivos. Essas células, provenientes dos “timócitos”, são “educadas” na glândula do timo (um órgão torácico, situado logo à frente do coração) para não atacar os elementos próprios do corpo.

Quando essa educação falha, o timo deixa escapar para o resto do corpo linfócitos T autoagressivos que podem agredir órgãos, como a glândula suprarrenal (causando a síndrome APS-1) ou o pâncreas, onde destroem as células produtoras de insulina e provocam o surgimento do diabetes mellitus do tipo 1.

Pesquisadores da área de imunologia sempre associaram a função do gene Aire com a eliminação dos timócitos autoagressivos, pois os pacientes com a síndrome APS-1, por exemplo, apresentam mutações na sequência do DNA desse gene. Mas ainda não havia uma demonstração cabal que validasse essa associação.

“Decidimos testar a hipótese de que o gene Aire estaria envolvido na eliminação dos timócitos autoagressivos ao controlar a adesão física ou contato deles com as células mTEC. Sem o contato físico com as células mTEC os timócitos autoagressivos não são eliminados”, disse Passos.

O artigo Aire disruption influences the medullary thymic epithelial cell transcriptome and interaction with thymocytes (doi: 10.3389/fimmu.2018.00964), de Cesar A. Speck-Hernandez e outros, pode ser lido na revista Frontiers in Immunology em www.frontiersin.org/articles/10.3389/fimmu.2018.00964/full.