Entrevista do governador Mário Covas após encontro com Xanana Gusmão

Parte II

seg, 03/04/2000 - 16h09 | Do Portal do Governo

Repórter: Além da saúde e da educação que o senhor já mencionou, existe alguma outra área priorizada pelo Governo para ajudar Timor?

Covas: É o que eu disse. A Fundap é uma empresa do Estado que até já tem tradição nessa área. Já operou em outros países nas mesmas circunstâncias. Organizando a máquina administrativa, etc., estabelecendo parâmetros de funcionamento, ajudando a fazer isso. Também não tem como fazer isso por terceiros. Tem que fazer isso na nação. Ela sabe os problemas dela, o que ela precisa é da ajuda, do conhecimento técnico. Esse conhecimento pode ser feito em qualquer outra área que eles queiram. Não adianta eu dizer ‘venham se preparar aqui na Universidade São Paulo’. Eu vou criar um problema em vez de fazer uma ajuda. Então, onde for preciso, é mais fácil a gente fazer isso. Mandar um médico especialista lá, manda dois especialistas para organizar a Receita. Isso aí nós nos colocamos à disposição para fazer assim que eles falarem. Mas você ainda tem uma situação um pouquinho transitória. O país ainda tem um Conselho Nacional Revolucionário, que é presidido pelo Xanana. Que é quem na realidade comanda o país, mas tem ainda uma administração temporária, feita sob os auspícios da ONU, dos quais os membros, ou pelo menos um número grande dos membros da CNRT fazem parte. E essa fixou até 2001 para fazer essa transição. Eles, por outro lado, têm pressa porque conquistaram essa situação e de repente as pessoas começam a perguntar: Parou? Dá para imaginar que isso esteja presente nas preocupações deles. Não é que eles digam isso, mas é evidente que está. Essas pessoas se envolveram numa luta de vida ou morte, tanto que 200 mil pessoas foram mortas e o país inteiro foi incendiado na saída. Se fez uma destruição. Talvez a vida hoje na área rural lá seja até menor do que aqui. A renda per capita é de 200 dólares. Duzentos dólares era a renda per capita do Piauí quando eu me elegi deputado pela primeira vez. Isso foi em 1962. A expectativa de vida é 56 anos para as mulheres e 54 para os homens. Há 53% de analfabetos acima de 16 anos de idade. Portanto, os problemas são volumosíssimos. Eles têm compromissos, até porque a ONU tem participado muito disso ao longo do tempo. O IBID, BID e Banco da Ásia, que é um banco semelhante ao BID, mas essas coisas não se realizam do dia para a noite. Vai primeiro organizar o país para depois se habilitar. Então são coisas para daqui a cinco ou seis anos produzir efeito real, efeito financeiro, por conta de que essas instituições também obedecem regras e portanto não podem fugir delas. Eu acho que esse momento é que eles precisam, não de uma solidariedade verbal, eles precisam de uma solidariedade mais efetiva, mais presente. Eu estive lendo, o presidente ofereceu aí preparação profissional, uma porção de coisas. Agora, não pode ser nada que obrigue o pessoal a vir para cá, porque aí, não tem como vir, não tem como pagar a passagem.

Repórter: O Estado já está pronto para enviar alguém para lá para resolver esses problemas?
Covas: Isso não tem nenhum problema. É coisa instantânea que a gente faz. Nós vamos construir uma escola lá. Do tipo que a gente constrói aqui em São Paulo, modulada, de 15 salas de aulas, portanto uma escola que pega 1800 alunos simultaneamente. (…) O que a gente puder fazer a gente faz. Não pode parecer também que a gente está querendo fazer algum tipo de coisas que não seja a expressão da solidariedade. Falei com a Assembléia, que foi rápida, o presidente falou com todas as lideranças de partidos, e todas as lideranças concordaram, estamos tentando ajudar.