Entrevista do governador Mário Covas após audiência concedida aos integrantes da CPI do Narcotráfico

Parte Final

qua, 12/04/2000 - 17h14 | Do Portal do Governo

Crítica na abertura da CPI

Pergunta: O senhor acha então que as críticas que os deputados fizeram ontem durante a sessão de abertura da CPI…. Eles criticaram a lentidão…

Covas: Eu não estava na abertura. Eu recebi a presença dos deputados aqui que, aliás, foram muito gentis. Muito cordiais.

Pergunta: Há cinco meses que se sabe deste possível envolvimento dos policiais. Não é muito tempo governador. Como é que se pode mudar este quadro?

Covas: Mudando todas as leis. Quando você convoca uma testemunha o advogado chega e diz: “ela não pode comparecer neste dia”. Então você tem que marcar outro dia para ela comparecer. E é assim a nossa lei. Quantas pessoas deixam de ser julgadas na justiça por causa de decisões protelatórias. Tem um bocado de advogado que ganha as ações desta maneira, simplesmente protelando a decisão e fazendo prescrever o ato. Bem, mas nós estamos num estado de direito, Meu Deus do Céu!! Não dá para querer agir fora dos limites da lei. Com justa razão vocês acham que é muito fácil. É só pegar o cara e tirar. E no dia seguinte um advogado põe ele de novo.

Pergunta: Mas, governador, se já tivesse sido concluído o inquérito ou a sindicância isto já poderia ter sido feito, não é?

Covas: Mas quando for concluído sim.

Pergunta: Mas por que demorou tanto? Cinco meses…

Covas: Pelas razões que estou dizendo. Porque você não senta numa comissão e acompanha a comissão dia a dia. Vai ter outra agora. Você vai ver todos os problemas que aparecem durante o exercício de uma comissão. Porque é muito fácil fazer aparecer problema. É muito fácil. Você convoca uma testemunha e a testemunha não vem. Você tem que fazer no outro dia. Vocês estão pensando, por acaso passa pela cabeça de vocês que eu estou tentando proteger algum funcionário?

Pergunta: Não, governador, não é isso.

Covas: Então quem que é? Se não sou eu então é o secretário que quer proteger?

Pergunta: Então tem alguma coisa errada na burocracia, né?

Covas: Não. A burocracia é feita dentro da lei.

Pergunta: Pelo que os parlamentares colocaram, governador, é a diferença. Porque o que aconteceu lá em Campinas, passaram-se cinco meses e ainda não se tem um resultado por parte da Secretaria de Segurança…

Covas: Não ia ter resultado pelo Ministério Público? Porque eles mandaram o resultado para o Ministério Público. Vocês não estão cobrando resultado do Ministério Público.

Pergunta: Mas os deputados que falaram isto ontem também, governador?

Covas: Tudo bem. Tudo bom. O que é que vocês querem? Que eu brigue com os deputados? Os deputados têm até imunidade. Tem um que é senador que estou tentando processar mas não me deram até hoje licença para processar, o alagoano lá.

Pergunta: A centralização, o senhor acha que vai apressar as investigações?

Covas: Apressa porque você centraliza a reclamação. Quando eu tiver que dar bronca eu sei direto aonde eu tenho que bater para dar a bronca. O secretário a mesma coisa, está concentrando nas mãos de alguém tudo quanto é crime ou denúncia de crime existente no… Veja, outro dia saiu no jornal e eu não sei como que saiu no jornal. Não sei como que saiu, porque não foi o ouvidor que pôs. O ouvidor marcou uma relação para a secretaria, para a CPI da Assembléia e para o Ministério Público, dizendo as reclamações que ele recebe pelo telefone, como por carta, quais tinham sido as maiores reclamações, e selecionou os policiais sobre os quais tinha recebido o maior número de reclamações de todos os tipos. De repente se publicou isto no jornal. Ninguém sabe quem deu isto para o jornal. E a partir daí se começa a cobrar que estes cidadãos sejam afastados e eu não tenho problema de afastar. Mandei afastar dez homens em Praia Grande, porque, de repente, sumiram corpos de moças que tinham morrido e, quando descobriram os corpos, estavam no camburão da polícia. Três dias depois acharam as marcas, como se tivessem sido arrastados. Afastei os dez até que o assunto fosse resolvido. Isso é um procedimento hediondo. Por que se faz desaparecer um cadáver? Ele tem um valor estimativo, tem o afeto das pessoas. Só quem ganha com o cadáver é a empresa que o transporta. Fica parecendo que foi briga de funerárias. Mas o corpo foi achado no camburão!

Pergunta: É o … aconteceria no caso de Campinas?

Covas – Nós temos uma única maneira de fazer. Eu abuso disso. O secretário outro dia pegou uma delegada de polícia e, para penalizá-la, enviou-a para Parelheiros. Por minha conta não fica nem em Parelheiros. Por mim sai até apurar. Invadiram um apartamento, bateram no Paulo Henrique Amorim, e o pessoal todo do prédio foi testemunhar na polícia. Lá, a delegada queria devolver o dinheiro, as coisas roubadas e nem boletim de violência física foi feito. Foi feita ocorrência de tentativa de assalto. Mas tinha o prédio inteiro me dizendo que ela tinha procedido desse jeito. Tenho demonstração clara para me dar sustentação para tomar uma posição. Eu li em um editorial ontem que não só deve afastar, como deve deixar de pagar o salário. Deus meu! Já passamos esse período! Eu acho e ponto final. Eu faço uma força grande para não fazer as coisas como eu acho, mas como a lei manda.

Pergunta: Os deputados acham que o que levantaram durante a passagem da CPI em Campinas eram indícios suficientes para decisões como essa, de afastar os policiais…

Covas: Essa é uma questão de opinião. Na verdade nem fomos comunicados do que eles acharam. Na realidade, embora tivessem lá delegados, eles mandaram relatório ao Ministério Público, como faz toda CPI. Nada diferente. Pedi a eles que mandem para mim, inclusive. Eu me encarrego de comandar a verificação, para não deixar que pareça protelatória. Ou vocês acham que estamos protegendo policial?

Pergunta: Estamos tentando entender o que aconteceu em Campinas…

Covas: Em primeiro lugar, o Ministério Público não acabou sua verificação. Vocês devem ter ido ao Ministério saber porquê. Já devem ter ido. Ou só perguntam para mim?

Pergunta: Os deputados estão com boa expectativa que a força-tarefa ou comissão especial será um tiro de canhão no narcotráfico. O senhor concorda?

Covas: Queira Deus! Eu só pego os efeitos. Estou cansado de dizer que só paramos o narcotráfico na fronteira do País. É preciso parar o contrabando de armas na entrada do País. E se, para fazer isso, o mais conveniente é arrumar uma grande articulação nacional, sou muito favorável.

Pergunta: O senhor poderia repetir o prazo que deu para serem concluídas as investigações?

Covas: Aquele depoimento de Campinas, perguntei ao secretário e me disse dez dias. Dei a ele 15, para não correr o risco de errar. Com relação à centralização da Corregedoria, são 60 dias.

Pergunta: Então os policiais só devem ser afastados após a conclusão?

Covas: Sim. Depois da decisão.

Pergunta: Qual a sua avaliação sobre a reunião que teve com os membros do narcotráfico?

Covas: Minha avaliação é boa. Como avaliação?

Pergunta: Trouxe fatos novos? O que o senhor acredita que pode trazer à Polícia de São Paulo a vinda da CPI?

Covas: Olha, a reunião foi muito boa, o que está sendo ruim é essa entrevista. Vocês nos apresentam como se fôssemos defensores de bandidos. Vocês fazem perguntas como se tivéssemos defendendo interesses dos bandidos. Não são capazes de diferenciar o interesse da lei e dos bandidos.

Pergunta: E as críticas dos deputados?

Covas: Não acho nada. Eles têm imunidade para falar o que bem entendem. Aqui não me fizeram críticas.

Pergunta: Fizeram críticas ontem na Assembléia Legislativa, dizendo que nenhuma atitude foi tomada contra os policiais de Campinas acusados…

Covas: Não é verdade. Foi tomada atitude. Se não foi tomada atitude, foi porque não terminaram em dez dias a sindicância. Não foi tomada a atitude que gostariam e que alguns Estados pretendiam tomar. Dentro de 15 dias estará terminada a sindicância. Se tiver elemento suficiente para afastar, afasta-se imediatamente.

Demissão do ministro José Carlos Dias

Covas: Acho que nomeação de ministro é prerrogativa do presidente. Como ele nunca me perguntou que secretário vou nomear, não faço o mesmo, não é meu papel, nem tenho prerrogativas para fazer isso. Acho que são homens que têm condição, ambos foram presidentes da Comissão de Justiça e Paz de São Paulo, ambos têm ligações antigas, participaram do governo Montoro…

Pergunta: Ele surpreendeu com a mudança a menos de um ano?

Covas: A mudança surpreendeu, a escolha não! De manhã, quando me falaram que sairia, eu disse, então, que Gregori iria para lá.

Pergunta: A troca no Ministério foi justamente a questão de combate ao narcotráfico…

Covas: Então, é uma questão de prerrogativa, de quem comandava o setor. Eu não posso evitar isso, mas acho que essas coisas… temos que ter um único comando. Como o ministro colocou está correto. Ou fico com as prerrogativas ou não fico. Está certo o que ele fez. Não estou entrando em julgamento pessoal.

Pergunta: Nem dá pra fazer combate ao narcotráfico, anunciando as ações…

Covas: Sim. Uma vez, no período do governo anterior, queria que fizessem uma inspeção como a que fizemos agora. Achamos as coisas no desmanche, porque levamos a polícia, a Secretaria da Fazenda, levamos tudo. Até passagem secreta foi encontrada. Uma vez tentei fazer isso, só que foi uma operação organizada, não foi anunciada. Houve muita antecedência, com muita gente participando. Ao chegar lá, tudo estava fechado. Desta vez fizemos com muito sucesso, com muito critério, se apreendeu de tudo. Enquanto um pegava o número falsificado do motor, outro verificava as notas fiscais. Assistam ao filme “Por um Amigo”. Nele, o papel da imprensa cria o resultado do filme.