Entrevista coletiva do governador Mário Covas, após inauguração do Espaço Rodoanel

Parte I

qui, 03/08/2000 - 15h12 | Do Portal do Governo

Parte I

Rodoanel

Pergunta: O senhor espera que o BNDES vá arcar com aquilo que o município não está conseguindo? ( cumprir 25% acordados para o Rodoanel)

Covas: Arcar? O BNDES não arca nunca com nada, ele empresta dinheiro que você tem que pagar depois.

Pergunta: Seria então a parte do município?

Covas: Nós estamos tentando um empréstimo no BNDES para ajudar na formulação da área financeira. Mas, o BNDES não vai ajudar em nada não, ele empresta dinheiro, você usa o dinheiro e paga.

Pergunta: Governador, não é possível uma negociação com a prefeitura?

Covas: É possível, já foi feita. Eles já assinaram um papel. Para mim, não precisa nem assinar papel. Eles assinaram e eu pensei que era para cumprir, mas não cumpriram. O Pitta foi lá numa reunião, onde estavam o presidente da República, o governador do Estado e o prefeito, e assinamos um convênio. Um convênio pelo qual, antes de começar, o Rodoanel ia ser construído com 50% de dinheiro do Estado, 25% de dinheiro do Governo Federal e 25% da Prefeitura. O Estado tem mantido a sua cota de 50%, está dando neste ano R$ 168 milhões para essa obra, R$ 168 milhões não é brinquedo. O município portanto deveria dar R$ 84 milhões, não deu um tostão, nem este ano nem o ano passado. Até agora, não sei nem se passaram por aqui, porque dinheiro não deram nenhum. O Governo Federal no ano passado cumpriu a sua parte, neste ano nos pagou uma primeira parcela de R$ 25 milhões, e o dinheiro que puseram no orçamento acabou, estão tentando encontrar maneira de completar os R$ 80 milhões que tem para nos pagar.

Pergunta: Estes R$ 168 milhões é só do trecho oeste?

Covas: Só.

Pergunta: Neste ano?

Covas: É.

Pergunta: Governador, com relação ao BNDES vai ser tentado então um empréstimo de R$ 84 milhões?

Covas: Uma operação financeira, não é bem um empréstimo. Uma operação pela qual você está dando para o BNDES recebíveis.

Pergunta: Qual é o valor?

Covas: Se a gente pudesse conseguir R$ 500 milhões era bom, mas não é, são só R$ 180 milhões.

Pergunta: Governador, antes de vir para cá o senhor sobrevoou o trecho oeste?

Covas: Um trecho, uma parte, da Régis até aqui praticamente.

Pergunta: O fato da prefeitura não ter dado até agora já prejudicou as obras?

Covas: Não tudo bem, se você tivesse o dinheiro disponível dele também, você teria tido nestes dois períodos mais R$ 80 milhões. No ano passado foram gastos R$ 160 milhões ao todo, portanto mais R$ 40 milhões. Seriam R$ 120 milhões que estariam disponíveis e você toca a obra com a velocidade do dinheiro.

Pergunta: Vai dar para fazer no prazo?

Covas: No prazo que nós tínhamos combinado vai. Nem que a gente tenha que morrer nisso aqui sozinho.

Pergunta: O Estado vai assumir então a dívida com o BNDES para tentar cobrir esta parte da prefeitura?

Covas: É. O estado tem créditos e vai usar estes créditos. É que o BNDES transforma esses créditos, são recebiveis futuros, em dinheiro que nós dá. Portanto, não estamos recebendo nenhum favor do BNDES, estamos fazendo uma operação com o BNDES, uma operação comum, normal, pela qual estamos pagando.

Pergunta: Hoje o senhor disse mais uma vez em seu discurso que não vai ser candidato. O senhor está desiludido com a política?

Covas: Não, não. Estou desiludido com vocês, com a imprensa, com os meios de comunicação. Vocês tratam todo mundo igual, parece que é todo mundo Maluf, tudo tratado igual. Eu cansei disso, eu já estou velho para isso. Já passei muito tempo da minha vida, lutei muito para manter um certo conceito, para chegar no fim da vida ver os meus netos, daqui a pouco os meus bisnetos, olhar no jornal e dizer “ o senhor fez negócio na Cosesp, que negócio é este?”. De repente o meu secretário de Comunicação põe uma publicidade no jornal e eu que não gasto um tostão de publicidade, até erradamente, talvez eu não recebesse tanta paulada. De repente esse cara é processado, e o juiz ainda diz na decisão que eu também devia ser, e que o secretário também devia ser e não manda nem para o cartório, manda para o Ministério Público. Banca o advogado de defesa e nem toma conhecimento. Toma conhecimento, porque tem um jornalista que tem um bom trânsito no Ministério Público, e nós vamos ler a notícia no dia seguinte no jornal, na coluna do Fausto Macedo. É uma coisa incrível isso, incrível. É notícia e ele não tem do que reclamar.

Pergunta: E ele chama de ato lesivo ao patrimônio, não é?

Covas: É ato lesivo ao patrimônio. E vocês contribuíram bastante. Vocês deram tanta paulada naqueles R$ 2,50 que acabou se transformando num crime aquilo. Quando na realidade este governo só diminuiu imposto. A primeira vez que nós pedimos uma contribuição de natureza popular, foi uma contribuição que custa o que? Custa meia hora de estacionamento em frente ao Hospital das Clínicas. Está lá escrito, primeira meia hora, R$ 2,50. Agora para fazer a polícia de São Paulo, a polícia mais bem equipada do mundo foi uma reação enorme, e não foi uma reação de povo, porque o povo nem sabia o que era. Então, até porque eu disse que só mandava para a Assembléia se o povo estivesse de acordo, se eu tivesse aval do povo para fazer isso. E para fazer isso o povo tem que saber o que está se fazendo, porque o povo não lê jornal, porque não tem dinheiro para comprar jornal, não é nem porque não queira. De forma que precisa de uma explicação, precisa de você pagar para informá-lo, olha o dinheiro não vai passar nem no Tesouro, quem vai controlar isso é a própria sociedade. Vai só usado para isso o dinheiro controlado pela sociedade, não passa no caixa do Tesouro. Não vai acontecer como a CPMF, dizia o nosso amigo, como é mesmo o nome dele? Boris Casoy dizia que vai acontecer que nem aconteceu com a CPMF, o dinheiro vai sumir, mas o dinheiro nem ia entrar no Tesouro, o dinheiro ia ficar nas mãos da sociedade civil, para aplicar única e exclusivamente para isso. Pois bem, você vai explicar para a opinião pública um governo que não faz publicidade, que não gasta nem um tostão do dinheiro do povo para isso. E na sentença vem escrito que a coisa foi feita de forma intempestiva, eu não sei se a expressão é essa. Mas, as coisas tem que ser feitas legalmente ou ilegalmente, não intempestivamente ou tempestivamente, isso não é julgamento. Mas, enfim o quê se vai fazer? Eu, quanto a mim, vou continuar fazendo política aqui, junto aos bairros, como engenheiro vendo as obras, nas escolas, na universidade, junto ao meu partido. Mas, candidato eu não sou a mais nada. Mais nada. Eu não tenho mais paciência com vocês, e como eu gosto muito de vocês, não gosto de fazer malcriação com vocês, então eu vou embora.

REFORMA TRIBUTÁRIA

Pergunta: Aproveitando que o senhor falou de imposto, o que o senhor achou da proposta do governo da reforma tributária?

Covas: Olha, do começo até hoje ela piorou cinco vezes em relação a São Paulo. Se ela fosse aprovada hoje, do jeito que está, São Paulo perderia por ano R$ 6,8 bilhões, ou seja, 18%.

Pergunta: Da proposta do Malan?

Covas: É da proposta do Malan, que eu nem acho que é do Malan, acho que é do Everardo Maciel. Porque a vontade de faturar é tão grande. A coisa que mais interessava na Reforma Tributária era eliminar o imposto acumulativo. O homem conseguiu garantir a permanência do imposto acumulativo. Ao invés de dizer que ia mudar, ele disse, durante três anos não muda nada, depois de três anos pode eventualmente mudar através de uma lei complementar. Ou seja, ele transformou aquilo que devia acabar numa garantia de que iria permanecer. Criou o imposto de todo jeito, o que é uma característica dele, por isso que você lê a toda hora que aumentou a arrecadação Federal, em compensação a do Estado, é que nem salário de professor, aquele negócio assim.

CPTM

Pergunta: Governador, o presidente da CPTM falou que 20% da frota de trens está com a manutenção atrasada?

Covas: Então vou ter que escolher outro presidente.

Pergunta: Por que?

Covas: Porque não devia ter nada atrasado.

Pergunta: Por que?

Covas: Como por que? Porque não é para atrasar. Que história é essa de falar que está com 20% atrasado. Quer dizer essa é a idéia que vocês tiram do acidente? Me explica o acidente do concorde, será que a indústria francesa não presta, ou que a empresa área francesa não faz manutenção?

Pergunta: Ele fala em 20% de atraso na manutenção.

Covas: Então, muito bem. É bom você me informar disso.

Pergunta: Governador, os depoimentos ontem, o caso da CPTM, revelaram uma série de problemas?

Covas: Como é que vocês sabem, vocês não assistiram os depoimentos?

Pergunta: O delegado forneceu cópia dos depoimentos.

Covas: A polícia forneceu?

Pergunta: Forneceu. Eles falam que a empresa demorou uma hora e quarenta minutos para remover o trem que estava parado.

Covas: Eu não recebi os depoimentos e eles receberam? Não tem importância eu leio hoje nos jornais.

Pergunta: Eles apontaram uma série de irregularidades como negligência, irresponsabilidade.

Covas: Uma hora e quarenta?

Pergunta: O trem estava parado e ficou uma hora e quarenta esperando.

Covas: O trem estava parado e não se move porque não tem energia, não pode remover mesmo.

Pergunta: Mais isso com uma locomotiva a dieesel que demorou e neste ínterim caiu.

Covas: Mas ele tem que passar pelo mesmo caminho por onde passam os outros, porque não paralisou alguns movimentos de trens. Eu estou fazendo uma reunião hoje as duas horas, eu não quero falar sobre isso com muita intensidade, para não parecer que você está jogando nas costas de quem quer que seja a responsabilidade disso, eu acho que isso é alguma coisa para no final se fazer. Mas, pouca gente sabe que o trem que estava em Perus foi avisado para sair, mas quando ele foi sair caiu a energia em Perus também.

Pergunta: Mas, neste momento não teria sido melhor tirar logo as pessoas?

Covas: Foram tiradas as pessoas. Mas, se alguém anunciasse lá, olha vem um trem caindo aqui, você hoje estaria me perguntando, não era melhor não ter contado e não dizer para as pessoas saírem.

Pergunta: Mas, o maquinista de trem que estava parado em Perus fala que só foi avisado menos de três minutos antes do choque. Porque ele não entendia a comunicação, havia falha de comunicação.

Covas: Porque se tentou através do CCO todos os desvios existentes para tocar o trem. É que os desvios eram todos em sentido contrário, de forma que o trem passava pelos desvios. Tem os desvios de lá para cá e daqui para lá, se pegar daqui para lá desvia.

Pergunta: Mas ele não sabia disso?

Covas: Do quê?

Pergunta: Ele não sabia que os desvios não eram na direção certa. Eles não deviam saber?

Covas: Eles quem?

Pergunta: O CCO?

Covas: Lógico que sabia.

Pergunta: Mesmo assim eles tentaram desviar?

Covas: Tentou. Tentou até descarrilhar o trem, não tinha ninguém dentro dele. Não adianta, vocês já fizeram o julgamento, que explicação adicional vocês querem? Vocês todos já fizeram o julgamento. Imagina se os jornalistas franceses fizerem isso com o Concorde? Olha a CPTM teve investimentos no meu governo como nunca teve.

Pergunta: De quanto foram os investimentos?

Covas: Eu te dou os números hoje a partir das duas horas da tarde. Só em trem nós compramos 144 carros de uma vez. São 48 trens comprados de graça, nós ganhamos os trens, nós só pagamos as reformas dos trens. Compramos mais 30 de última geração, não tem mais moderno. E tem outros 30 comprados dos alemães que estão sendo pagos antes de ser entregues. Nós reformamos toda a via permanente. Se você me perguntar se ainda pode melhorar? Pode. Talvez com os R$ 800 milhões. E se a gente começar a tributar jornalista quem sabe a gente consegue dinheiro para fazer isso. Agora é muito engraçado, todo mundo quer tudo, mas ninguém quer aumentar o imposto. E quando você pede R$ 2,50, vocês caíram em cima de mim de uma forma, mas de uma forma, que permite ao juiz fazer aquilo, porque sentiu através de vocês. Não foram os pobres que reclamaram daquilo, não. Foram os que tem automóvel, foram os que podiam pagar, foram os que podiam dar uma segurança para quem não tem a segurança melhor do que ela tem.