Educadores de SP trocam experiências em escolas britânicas

Parceria, que vai até 2011, procura definir melhores caminhos para um ensino de qualidade

qua, 12/11/2008 - 9h34 | Do Portal do Governo

Fazer observações em salas de aula, exercer a liderança de forma compartilhada, definir metas e objetivos e lidar com tempo, dados, avaliações e resultados de forma sistemática são algumas práticas adotadas por cinco diretoras de escolas estaduais paulistas, após conhecerem o sistema inglês de educação pública. Sobre as diferenças que chamaram a atenção durante a visita a cinco escolas londrinas, elas destacam: não se vê crianças nas ruas, o professor centra toda a atenção à aula, as salas têm muitos recursos e diversidade de material e as paredes dos corredores das escolas são coloridas e repletas de trabalhos estudantis.

Diretores de colégios ingleses também conheceram escolas brasileiras. Chamou a atenção dos britânicos a proximidade que temos com nossos alunos, a forma de lidar com eles, a flexibilidade e o carinho no tratamento, destacam as brasileiras. De acordo com as diretoras paulistas, eles se surpreenderam ao constatar que mesmo com poucos recursos, as escolas conseguem desenvolver muitas ações. A troca de experiência e informações dos diretores dos dois países integra o programa Liderança Escolar e Novos Instrumentos de Aprendizagem, do Conselho Britânico.

Se a distância, a realidade e as condições socioeconômicas separam, a vontade de melhorar o ensino une diretores de escolas públicas brasileiras e britânicas, salienta Mércia Aparecida Ferreira, diretora da Anecondes Alves Ferreira (Diadema). Vivian Kauling, diretora da EE Professora Suzana Benedicta Gigo Ayres (de Indaiatuba), atribui a qualidade do ensino britânico ao fato de haver “pressão saudável da sociedade para que os gestores públicos de todas as instâncias matriculem seus filhos em escolas públicas”. Para ela, essa pressão resulta em mais investimentos públicos e maior exigência de qualidade.

Clareza e diversidade – Na troca de experiências (relacionadas a liderança, gestão escolar, funcionamento, cotidiano e problemas) as diretoras notaram que o professor britânico dedica a quase totalidade de seu tempo ao ensino. Além de ter um segundo professor em sala para ajudar aqueles com mais dificuldade, há outros auxiliares que cuidam dos materiais pedagógicos e de questões disciplinares. “A principal tarefa do professor é formar o aluno. Não perdem tempo cuidando do disciplinar e nem do material didático”, diz Alexina Santaguita, diretora da EE Caramuru (capital).

Para ajudar o professor a ter mais tempo para se dedicar aos alunos (aqui são 40 em média; lá são 20), Alexina está em entendimento com universidades para contratação de estagiários de pedagogia e psicologia. Outra ação é aumentar a diversidade de material e projetos didáticos. “Em Londres, as salas têm muitos recursos, lousas digitais, biblioteca farta e paredes repletas de arte, o que faz das escolas ambientes propícios ao aprendizado”, observa Vivian. Mesmo tendo decidido, antes de viajar, que “não olharia os recursos materiais”, constatou que as escolas públicas londrinas se comparam aos melhores colégios particulares brasileiros, nesse quesito.

Nas escolas inglesas, conta Alexina, as salas são equipadas (pia, cestos com frutas, microondas, computador) e há cantos de atividades. “Numa mesma sala, há criança recortando, enquanto outras brincam com blocos ou desenham. Tudo ao mesmo tempo e com acompanhamento de adulto”. Isso é possível, segundo Alexina, porque cada “canto didático” tem finalidade/objetivo bem definido (disposto num quadro com destaque para que todos saibam a proposta) e está estruturado para isso. “Assim, o aluno compreende claramente as atividades propostas”.

Diretor na sala – Em algumas escolas, os estudantes se auto-avaliam após concluir a atividade. “Lá a escola é toda voltada ao aprendizado”, compara Mércia. Até as “paredes falam”, complementa Alexina ao se lembrar da grande quantidade de cartazes espalhados. E completa admirada: “Ninguém mexe”. Na visita, as crianças apresentaram a escola dizendo: “Essa é a nossa sala e tenho muito orgulho”, lembra Vivian. Estruturar as escolas brasileiras com método similar ao inglês, dizem as diretoras, será um desafio.

Após as observações, “passamos a olhar mais o pedagógico, razão de ser da escola, e não mais a administração burocrática”, diz Vivian. Outra mudança foi a participação dos pais. Antes, as escolas chamavam todos os pais dos alunos. Agora, a exemplo das escolas inglesas, as reuniões são por série, o que tem assegurado maior presença. Também escolheram um pai para ser o porta-voz de cada sala e, assim, aproximar a escola do aluno e da família. Graças ao intercâmbio, as diretoras passaram a fazer avaliação/observação do que ocorre nas escolas e têm computado esses dados.

Vivian conta que durante a visita de um diretor inglês à sua escola, ela comentou que vários alunos não sabiam ler. Perguntada sobre quantos seriam, ela respondeu não ter os dados.  “Então, ele me disse que antes de atacar um problema, temos de dimensionar o seu tamanho”, lembra. Os ingleses também ensinaram a estudar e avaliar os resultados obtidos, complementa Vivian. “Aprendi a administrar os resultados de forma mais sistemática (com gráficos de rendimento escolar, por exemplo) e não perder o acompanhamento”, relata Alexina. “Quando se tem muito claro o problema, fica mais fácil achar o caminho para a solução”, sintetiza Mércia.

A liderança compartilhada é outra ferramenta adotada pelas diretoras a partir do intercâmbio. Elas contam que os ingleses entendem que esse tipo de gestão facilita o envolvimento de todas as pessoas no ensino (professor, diretor, aluno, família, comunidade) e ajuda a perceber que cada um tem o seu papel e sua responsabilidade no aprendizado dos alunos.  “Passei a envolver todos nas decisões e ações mais importantes e a fazer reuniões mais freqüentes com os professores”, relata Mércia. Vivian diz que nas escolas londrinas “há forte sentimento de equipe e todos perseguem o mesmo objetivo para que o trabalho dê certo”.

As diretoras das escolas Professor Salathiel Vaz de Toledo (Itu) e Professor Jethro Vaz de Toledo (Piracicaba) também conheceram as instituições de ensino. Uma vez por mês, todas elas se reúnem para trocar idéias e saber o que está dando certo. O intercâmbio continua até 2011Após a consolidação dos métodos observados nas cinco escolas, a aproximação entre os dois países passa a ser pela troca direta de experiências entres as escolas (cada escola brasileira dialoga com sua parceira londrina). Noutra etapa, os alunos de escolas brasileiras e londrinas poderão trocar informações pela Internet.

Nove países, um objetivo –  Instituído pelo Conselho Britânico de Educação, o Projeto Liderança Escolar e Novos Instrumentos de Aprendizagem envolve nove países na América Latina (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Jamaica, México, Peru, Trindad e Tobago, Venezuela) e Reino Unido (Inglaterra, Irlanda do Norte, Escócia e País de Gales). No Brasil, o programa de experiências entre os dois sistemas públicos de ensino é feito entre o Conselho Britânico e as secretarias estaduais de Educação.

São parceiros desde 2007, Pernambuco, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins. Em cada Estado, cinco escolas participam do projeto. Todas as despesas da viagem são custeadas pela Inglaterra. Os países participantes têm acesso a várias experiências e informações. A expectativa é que isso resulte na descoberta de soluções práticas e acessíveis para aprimorar a educação e melhorar a aprendizagem dos alunos. Um dos critérios de escolha do estabelecimento de ensino é estar próximo ou situado em grande centro urbano.

Claudeci Martins

Da Agência Imprensa Oficial