Cultura: Porteiro do Conservatório de Tatuí faz sucesso com fabricação de batutas

Batutas fabricadas por porteiro vêm sendo compradas por maestros internacionais

sex, 17/02/2006 - 13h18 | Do Portal do Governo

Porteiro do Conservatório Dramático e Musical “Dr. Carlos de Campos” de Tatuí desde 1999, Oscar Franco ganhou, desde então, um hobby que, hoje, já complementa a renda familiar.

Mecânico de manutenção por formação, Oscar Franco recebeu, no vai e vem da portaria e entre muitas amizades e histórias, a sugestão de fazer uma flauta doce. O instrumento jamais foi fabricado mas, de outras e muitas conversas, veio a idéia: “faz uma batuta”.

“A idéia foi do maestro Edson Beltrami. Ele me trouxe algumas informações sobre a batuta e, sabe, acho que ela tem tudo a ver com as máquinas. Mecânico de manutenção é que nem médico, é obrigado a descobrir o que a máquina tem. Às vezes conserta, às vezes faz outra máquina”, disse ele.

A criatividade de Oscar Franco vem sendo utilizada em concertos em vez de consertos. A primeira batuta não ficou tão batuta assim mas, da prática, veio a perfeição. O maestro Edson Beltrami usou a primeira como cobaia. Depois, virou cliente. Os testes e conseqüentes aprovações também passaram pelas mãos dos maestros Dario Sotelo e Antonio Carlos Neves Campos, o diretor da escola considerada a maior da América Latina.

“Então fui me aperfeiçoando. Recebi outras informações. Passei pelo teste da casa e, então, os alunos de regência passaram a comprar. Depois, os estrangeiros que vêm para muitos eventos”, disse ele.

Em quatro anos de experiência, Oscar desenvolveu uma série de modelos. Para o cabo ou “pega” oferece variedades em modelos e tipos de madeira. “Há o modelo inglês, o indiano, o americano. Um maestro inglês me trouxe o preferido dele, o australiano, para ver se eu conseguia fazer. Fiz cinco. Ele comprou todas e eu ganhei uma nova variedade”, diz ele.

Os tamanhos das hastes também são variados. Podem ser grandes, de até 16 polegadas. Mas o padrão é o de 15. A cor da haste é o branco, padrão que permite que os instrumentistas a enxerguem. Mas há exceções. “Alguns americanos gostam sem tintura, na madeira comum”, afirmou. “Mas todas devem ser leves e equilibradas, não podem ser pesada demais”, acrescenta.

O trabalho exige dedicação. A fabricação dos cabos é tão demorada quanto a das hastes, que correm o risco de entortar ou quebrar. Os defeitos são barrados pelo próprio fabricante que, ao final da produção, aciona o setor de controle de qualidade. Exigente com ele próprio, faz das batutas famosas no país. “Até onde os maestros sabem e me contam, sou o único no Brasil”, diz, orgulhoso.

A fabricação em terra brasileira diminui, e muito, o valor da ferramenta dos maestros. As importadas custam, em média, US$ 50. Oscar vende por R$ 30 e, dependendo do caso, até parcela. “Para um leigo, R$ 30 por uma varinha é muito dinheiro, mas o maestro se encanta, gosta e compra. Já para os alunos, que têm suas dificuldades, eu entendo e parcelo em duas, três vezes até”, contou ele.

A fabricação caseira vai bem, obrigado. Com ela, consegue dobrar o atual salário. O trabalho depende da demanda. Às vezes, vende três ao mês. Outras vezes, 15. O número costuma aumentar com o hábito de um cliente em especial. Quando está à frente da Osusp (Orquestra Sinfônica da USP), o maestro Carlos Moreno, diretor e regente titular da orquestra, além de contagiar o público durante sua apresentação se destaca por uma característica bastante peculiar: costuma quebrar batutas enquanto rege. Só nos últimos seis meses quebrou umas cinco.

Aos 37 anos de idade, Moreno começou a quebrar batutas assim que chegou em São Paulo, vindo de Petrópolis, região serrana do estado do Rio de Janeiro. Segundo ele, o fato acontece por causa da energia de seus movimentos. Para os músicos, ao quebrar a batuta, Moreno se liberta e a interpretação fica com mais sentimento. Só na última quinzena de novembro duas batutas foram inutilizadas depois de dois concertos.

Oscar Franco, que não conhece o maestro pessoalmente, sabe das peculiaridades de Moreno. “Ele prefere o cabo maior, no sistema inglês. Se essa moda de quebrar batuta pega e eu conseguir uns três clientes iguais a ele, vou vender umas 15 por mês”, diz, torcendo para o estilo de Moreno se disseminar por aí.

Mas não são somente maestros que encantam-se pelo produto. Uma revendedora da Toyota pediu, às pressas, 60 unidades. Elas foram distribuídas como brindes após uma palestra. Mas sua utilidade principal é, óbvio, nos concertos. Em Tatuí, os maestros Antonio Carlos Neves Campos, Dario Sotelo e Edson Beltrami adotaram as batutas de Oscar Franco. Assim como Moreno. Mas Franco quer tentar mesmo um outro nome famoso: John Neschling, da Osesp. “Vou ver se consigo… Se ele utilizasse, seria o maior sucesso”, disse ele.

Mais arte

“Eu fiz mais por hobby, para passar o tempo e uma tentativa para ver como saía.” Foi com essa justificativa que Oscar Franco enveredou-se pelo mundo da música.

Sob influência também de Edson Beltrami, resolveu ir além das batutas. Fez um bocal de flauta transversal em madeira. Ainda não vendeu nenhum, mas uma de suas unidades está em teste nos Estados Unidos.

“O som sai diferente, mais doce, serve para música de câmara… o mais barato desse unidade custa US$ 1 mil. Se eu for vender, o preço vai ser mais brasileiro. Aqui a turma não tem dinheiro nem que fosse R$ 300”, diz ele.

Aprendeu tanto que fabricou o cajón, um instrumento de percussão peruano – do qual já vendeu uma meia dúzia – e um clarinete clássico. Para Franco, o contato com a música veio da portaria e da batuta e, diz ele, em ambas é possível aprender muito.

Da Assessoria de Imprensa do Conservatório de Tatuí

C.C.