Ainda este ano, rede estadual de ensino terá 2º professor na sala de aula

Programa está sendo preparado e promete repetir sucesso obtido em escolas municipais e particulares da capital

ter, 22/05/2007 - 9h59 | Do Portal do Governo

Uma nova experiência está em curso no ensino estadual paulista e pode se converter numa verdadeira revolução. Trata-se do Programa Bolsa Formação Escola Pública e Universidade que, além de trabalhar várias frentes da educação, inclui, numa delas, o aluno pesquisador da universidade atuando em conjunto com o professor regente nas salas de aula da primeira série do ensino fundamental.

Para isso, a Secretaria de Estado da Educação acaba de firmar convênios com 22 instituições de ensino superior, dentre as 31 que se inscreveram, após chamamento público, nas áreas ligadas à alfabetização (Pedagogia, Letras e Normal superior).

A iniciativa será adotada a partir deste ano em 3.085 salas de aula de escolas públicas da capital, com a oferta, pela secretaria, de número igual de vagas aos alunos pesquisadores, selecionados entre os estudantes na própria faculdade em que estudam. Depois, será estendida à Grande São Paulo e ao interior. Um pequeno grande passo que vai abranger, numa segunda etapa, 5 milhões de alunos distribuídos por 5,4 mil escolas e acompanhados por cerca de 200 mil professores.

Não há o que negar. A proposta é atraente por, pelo menos, três bons motivos: aprimorar a alfabetização das crianças, ajudar o professor regente e formar profissionais do ensino. A educadora Iara Prado, diretora de Projetos Especiais da Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE) e coordenadora do programa, vai além. Segundo ela, a meta, num primeiro momento, é abranger todas as escolas da capital, com vistas à melhoria da qualidade de ensino no que diz respeito à leitura e à escrita. “É um programa de intervenção pedagógica na sala de aula, junto ao professor e seus alunos em que participam supervisor, diretor e coordenador pedagógico no conjunto da escola.”

Da teoria à prática – O aluno pesquisador receberá bolsa de estudo repassada diretamente às faculdades em que estudam, para complementação da mensalidade. É necessário que faculdades e bolsista apresentem projeto pedagógico à Secretaria da Educação. Os universitários serão acompanhados por um professor, da própria faculdade, que atuará como orientador do projeto. Essa pessoa também será custeada pela bolsa do auxiliar. O convênio terá validade de dois anos.

Iara e sua equipe de educadores acreditam que as universidades terão uma rica fonte de informações com a realidade vivenciada nas escolas públicas, o que servirá de reforço na formação de seus alunos. A Secretaria da Educação estuda, ainda, a proposta de oferecer a esses estudantes pontuação de participação que poderia ser utilizada no processo classificatório de concursos da rede estadual de ensino. Já o professor do 1º ano, que fizer o trabalho do Ler e Escrever, usar os livros e se comprometer, terá pontuação diferenciada, que vale para a evolução funcional na carreira.

As bases do trabalho estão sendo elaboradas junto a 13 Diretorias de Ensino da Capital, com diversas ações programadas. Uma delas prevê reuniões com os coordenadores pedagógicos das escolas subordinadas a essas diretorias, que receberão o Guia de Planejamento do Professor Alfabetizador, produzido pela prefeitura. A idéia é que analisem o material, indicando as adaptações necessárias para a rede estadual. Numa outra etapa, haverá reuniões com diretores de escolas, supervisores e assistentes técnico-pedagógicos, além de encontros mensais para discutir como será a aplicação na prática do novo programa.

A intenção, de acordo com a educadora Cláudia Arantangy, da equipe da Gestão Institucional do Ler Escrever, é oferecer ensino de melhor qualidade às crianças e ajudar o professor regente em seu trabalho diário. Por outro lado, o projeto dará aprendizado e experiência ao jovem universitário, preparando-o para a futura carreira no ensino. O bolsista deverá participar do diagnóstico de ensino na sala de aula, do planejamento das atividades complementares e de outras ações que visam a aprimorar o processo de alfabetização dos alunos.

Outra proposta do programa é resgatar um pouco a escola como espaço de formação profissional, como lugar de conhecimento didático, a sala de aula como objeto de reflexão, segundo Cláudia. “É a idéia de voltar a ter na rede um papel importante de conhecimento. Com esse objetivo, estamos inserindo material de qualidade na sala de aula para o professor fazer o seu planejamento, criando, enfim, a cultura de reflexão, e canais de interlocução entre professores.” Para ela, o apoio da universidade é fundamental. “O professor regente vai trazer coisas concretas no processo, mas o professor orientador da Faculdade tem de trazer as lentes para que o aluno possa enxergar melhor aquilo que ele está vendo na sala de aula.”

O programa estadual, na verdade, já é realidade na prefeitura de São Paulo desde fevereiro do ano passado. Nas escolas municipais, é desenvolvido dentro do projeto pedagógico Ler e Escrever, coordenado por Iara Prado, com ênfase, como o próprio nome indica, à leitura e à escrita. Surgiu depois de pesquisa por amostragem, realizada em 2005, pela Secretaria Municipal de Educação.

A pesquisa revelou a existência de escolas municipais que chegavam a ter até 30% de alunos que não escreviam corretamente no 3º ano. No mesmo ano, cerca de 17 mil alunos ficaram retidos ao final do Ciclo I (da 1ª à 4ª série do ensino fundamental). Para atacar o problema, o então prefeito da capital, José Serra, autorizou a implantação do Ler e Escrever, contemplando três linhas de atuação: repensar a alfabetização do Ciclo I, correr atrás do tempo perdido, ajudando os que chegavam à 4ª série com deficiências de alfabetização e atender alunos do Ciclo II (da 5ª à 8ª série do ensino fundamental), necessitados de reforço e aperfeiçoamento nas áreas de leitura e escrita.

Foco em resultados – Após um ano de participação no projeto, a Escola Municipal de Ensino Fundamental Presidente João Pinheiro, na Vila Matilde, colhe os frutos. “Com o Ler e Escrever, o desempenho dos alunos melhorou”, comemora a diretora Aparecida Inocêncio dos Santos, ao lado da coordenadora pedagógica Kátia Gomes Lopez, que emenda: “A presença do aluno pesquisador é um recurso a mais. Por conta do Ler e Escrever, os professores se capacitam cada vez mais”.

Desde os 16 anos, Rodrigo José dos Santos interessou-se por educação. No Centro Educacional Comunitário São José Operário, em São Mateus, onde nasceu, tornou-se educador voluntário, como bolsista da Fundação Abrinq. “Logo me identifiquei com o magistério e não parei mais”, diz ele, hoje com 22 anos, no 3º ano de Pedagogia e ainda bolsista. Agora realiza monitoria na Escola João Pinheiro, onde desempenha as funções de aluno pesquisador há um ano, nas aulas da professora de Português Maria Antonia Pereira de Moraes. “O aprendizado vale por uma faculdade inteira, é uma troca rica.”

Na época, a pergunta que zumbia nos ouvidos dos professores e, naturalmente no de Maria Antonia, era: “É possível dividir o mesmo espaço com outro professor?” Ficou curiosa, mas só este ano pôde vivenciar, na prática, o significado da iniciativa, quando foi indicada para comandar a 1ª série. “E não é que dá certo? Os resultados são bons, antes os alunos chegavam capengando à 2ª série.” A novidade também agrada a Nicolas Ferreira da Silva, sete anos. “Gosto dos dois, o Rodrigo passa no meio da turma, está sempre corrigindo quando escrevo ou leio errado”, comenta, logo após Rodrigo explicar a ele que Matilde (do nome do bairro) não se escreve com u no meio e nem i no final. Com sorriso maroto, ele embaralha as letras móveis sobre a carteira para fazer bonito da próxima vez.

De acordo com Josângela Brito Alves da Silva, da mesma escola do Rodrigo, “alguém tem de fazer a diferença neste País e , com certeza, o professor é uma dessas pessoas. Aluna do 3º semestre de Pedagogia, ela atua com a professora Regiane Ferreira Sanches, 19 anos de magistério. “É interessante porque é um trabalho de alfabetização mesmo, recebo orientação da professora regente sobre os alunos e a maneira como é dada a aula. Quando ela está na lição, fico observando quem está acompanhando.” Para Regiane, o apoio é importante dentro da sala , pois permite à estagiária acompanhar a maneira como alfabetiza, as suas intervenções. “Isso aumenta a confiança dos alunos, que podem tirar suas dúvidas na hora.”

Experiência semelhante acontece na Escola Municipal Viana Moog, do Jardim Jacqueline, com mil alunos no fundamental. Na direção há anos, Eliane Aparecida dos Santos Luscri comenta que a escola vive momento especial, em função do Ler e Escrever e da presença do aluno pesquisador em sala de aula. O acervo de livros, revistas e jornais aumentou, assim como o interesse pela leitura. “Instituímos o Dia da Leitura, com pausa de 45 minutos, para que todos leiam, desde alunos, professores, pessoal da administração. Essas ações eram feitas antes, mas não com tanta ênfase.”

Os professores ficaram tão engajados e comprometidos com a presença do aluno pesquisador que quiseram seguir com as classes da 1ª série para acompanhar melhor a evolução dos alunos no ano seguinte. Kátia Cristina Fernandes, 4º semestre de Pedagogia, está há apenas três semanas como aluna pesquisadora. Veio de uma escola onde só fazia observação, mas na Viana Moog percebe que pode crescer mais. “Aqui, a prática é tudo, atuo junto da professora Maria Helena de Almeida que tem 18 anos de experiência, o que ajuda muito.” Segundo Maria, o aluno pesquisador, além de aprender, ajuda as crianças e no diagnóstico da classe.

Na opinião da pedagoga Rosanea Mazzini Correa, que participou da implantação de Ler e Escrever, o aluno pesquisador deve contribuir na elaboração de diagnósticos pedagógicos dos estudantes, planejar atividades complementares de leitura e escrita para os alunos, executar atividades didáticas para indivíduos ou grupos de alunos, sempre em parceria com o professor regente da sala de aula. “O olhar de um aluno em formação é um potente aliado no planejamento do trabalho do professor regente, já que lida com muitos alunos ao mesmo tempo.”

No caminho certo – Ensino de qualidade e investimentos na formação de professores são a preocupação da escola particular Vértice, localizada no Campo Belo, famosa pela metodologia de ensino que a levou a abocanhar, por dois anos consecutivos, o 1º lugar no Enem, dentre as escolas paulistas. “Sempre falei que esse era o caminho para o ensino público”, diz a diretora Walkíria Gattermayr Ribeiro. “A criança tem de tirar a dúvida na sala de aula.” Ela credita o sucesso da sua escola à qualificação do professor, disciplina, participação dos pais no processo de aprendizado e, principalmente, ao engajamento de toda a equipe no projeto do colégio. “É meio caminho andado”, diz.

O professor de apoio, como é chamado no Vértice, está presente do 1º ao 5º ano do ensino fundamental. Presta ajuda ao detectar as correções de estruturação de frase, de ortografia, de escrita e mesmo ao apoiar o professor titular no desenvolvimento de seus projetos, diz Ana Maria Bertoni, responsável pela capacitação dos professores, e com experiência de 30 anos na rede pública como professora e diretora. “É imprescindível a presença deles, porque na ausência do titular, o de apoio está ali, conhece a metodologia. Aqui não entra nenhum professor na sala de aula sem antes ter sido professor de apoio. Vale destacar que não se trata de estagiário, mas de um professor formado em Letras ou Pedagogia e com vários cursos de capacitação.”

Na opinião da diretora, muitas coisas precisam ser repensadas no caso do ensino público. “Em primeiro lugar, é o objetivo. São classes com 40 alunos, um professor só não tem condição, muitos alunos serão esquecidos e a professora só vai percebê-lo no final do ano. É compreensível. Mas desde que tenha uma pedagogia para o professor de classe, a inclusão do aluno pesquisador tem tudo para ser sucesso.”

Maria das Graças Leocádio

Da Agência Imprensa Oficial

(J.H.)