Pesquisa da USP mostra que ingestão de carboidrato auxilia na recuperação de queimados

Dieta rica na substância sugere melhora na condição de paciente desnutrido que sofreu queimadura

qui, 28/10/2010 - 20h00 | Do Portal do Governo

Um estudo realizado pelos pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP) constatou que ratos que sofreram queimaduras pelo corpo e que receberam uma ração rica em carboidratos apresentaram melhor condição da cartilagem responsável pelo crescimento da mandíbula. O estudo mostra que a ingestão da substância forneceu energia de forma mais rápida para o corpo em comparação à ingestão de proteínas, ajudando-o na cicatrização de ferimentos por queimaduras. Dessa forma, o organismo não precisaria mais retirar proteínas de regiões como a cartilagem mandibular para a reconstrução da pele e de músculos e a espessura da camada proteica da região seria mantida.

A partir da constatação de que o carboidrato tem maior eficácia na recuperação de queimaduras – apesar de a grande perda de proteína ser o fator mais agravante nesse tipo de acidente -, os pesquisadores defendem a possibilidade de reformulação da dieta hospitalar para pessoas internadas por causa de queimaduras.

“O carboidrato é uma energia mais fácil de ser quebrada, e por isso pode ajudar mais rapidamente na recuperação das queimaduras”, explica uma das autoras do trabalho, a pesquisadora Bruna Cecilia Caixeta de Oliveira, que analisou a cartilagem da mandíbula dos ratos por esta ser uma das responsáveis pelo crescimento da face.

O trabalho foi realizado como Iniciação Científica entre julho de 2005 e dezembro de 2006 por Bruna, então aluna da graduação da Faculdade de Odontologia (FO) da USP. Em janeiro de 2010, um artigo sobre o tema foi publicado na revista Histology and Hostipathology. Graças a essa pesquisa, a cirurgiã-dentista cursa atualmente o doutorado junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Morfofuncionais do Departamento de Anatomia do ICB.

O tema da iniciação científica se originou da fusão de duas das linhas de pesquisa do Laboratório de Anatomia Funcional Aplicada à Clínica e à Cirurgia (LAFACC) do ICB: crescimento craniofacial e lesões térmicas corporais, coordenadas respectivamente pelas professoras Sílvia de Campos Boldrini, do Departamento de Anatomia do ICB e orientadora do trabalho, e Flávia de Oliveira, atual docente da Unifesp. O objetivo do trabalho era analisar as consequências da desnutrição e as medidas que podem ser tomadas quando este mal está associado ao sofrimento que as queimaduras geram.

Acidente doméstico

A pesquisa procura interpretar o que acontece com crianças de baixa renda que ficam sozinhas em casa e correm o risco de se machucar ao mexerem em fogões, por exemplo. “São crianças naturalmente subnutridas, que já tem um crescimento muito comprometido e que, por vezes, ficam sozinhas em casa porque a mãe precisa trabalhar e não tem alternativa senão deixar seus filhos sozinhos. Há casos, por exemplo, em que essas crianças sofrem acidentes com uma panela cheia de água quente que cai sobre elas, provocando a queimadura.” A dentista conta que a queimadura se tornaria, dessa forma, mais um fator que comprometeria o crescimento e o desenvolvimento da criança.

A dentista analisou o crescimento da mandíbula em situações em que os ratos estavam nutridos e desnutridos, notando que nos ratos desnutridos, a espessura da cartilagem da cabeça da mandíbula era menor em relação ao controle – ratos nutridos de forma normal. Segundo a pesquisadora, esses resultados demonstram que a carência de proteína afeta não só o crescimento corpóreo geral dos animais como também o crescimento da face, já que a redistribuição de proteínas do corpo é necessária para a reconstrução da pele e de músculos prejudicados. Na cartilagem da mandíbula este fenômeno é percebido também pela diminuição radical da espessura da mesma.

Porém, um resultado encontrado foi diferente e inesperado: quando o mesmo animal foi queimado e desnutrido, essa cartilagem da mandíbula parecia sofrer uma melhora. Com mais estudos, concluiu-se que o teor de carboidrato na ração dos animais desnutridos colaborava com a recuperação da cartilagem. Isso acontece porque o organismo necessita de energia para a sua recuperação, e esta estava disponível na ração dos animais desnutridos, rica em carboidratos. “O valor energético da proteína retirada da ração dos animais foi reposto com esses carboidratos”, diz Bruna.

Nova dieta

O que a equipe propõe é uma reformulação das dietas hospitalares de pessoas internadas devido a queimaduras. “Quando uma vítima de queimaduras chega ao hospital, a grande preocupação é a regeneração da pele e dos músculos por meio de medicamentos e pomadas, porque a maioria das mortes por queimaduras acontece por infecção generalizada. Pensar em uma dieta que vá ajudar na recuperação seria uma prioridade. Nesse caso, seria interessante recomendar uma dieta rica em carboidratos, por mais que a perda de pele e da estrutura muscular seja protéica”, sugere Bruna.

Da USP