Varejo é também o alvo da Nossa Caixa

Gazeta Mercantil - São Paulo - Quarta-feira, 26 de janeiro de 2005

qua, 26/01/2005 - 9h19 | Do Portal do Governo

Plano para 2005 prevê expansão acima de 30% no crédito e a implantação da financeira

Em meio aos preparativos para se tornar a primeira instituição financeira a participar do Novo Mercado da Bovespa, a Nossa Caixa começa a dar forma a um ambicioso projeto: o de ser a líder no segmento de varejo em São Paulo até 2008. A empreitada, que passa pela abertura de 106 novas agências nos próximos 18 meses – todas em São Paulo -, começou com a chegada do banco aos 645 municípios do Estado, em alguns por meio de correspondentes bancários. ‘O banco nunca teve presença forte fora do Estado. Nossa opção foi a de crescer dentro de São Paulo, que é nossa vocação natural’, diz Carlos Eduardo Monteiro, que acaba de completar um ano à frente do banco.

Ex-funcionário do Banco Central e do Ministério da Fazenda, participou da renegociação das dívidas de estados e municípios na década de 90 e da privatização dos bancos estaduais, inclusive Banerj e Banespa. Agora, na Nossa Caixa, enfrenta desafios peculiares. Um deles é tirar do banco o índice de consumo de produtos por cliente inferior a 2, bem abaixo da média de 4 a 5 das grandes instituições de varejo. É o que conta a seguir.

Os jornais noticiaram há alguns dias que o governo paulista vai patrocinar o Carnaval de 2005 por meio da Nossa Caixa. Para uma empresa que está prestes a entrar no Novo Mercado da Bovespa, segmento que reúne empresas comprometidas a respeitar os acionistas minoritários, isso não dá a má sensação de intervencionismo do acionista principal?

Carlos Eduardo Monteiro – Não há ingerência política na administração deste banco. De fato, o governo nos consultou sobre a possibilidade de participar do Carnaval, o que já temos feito nos últimos anos. Há diversas maneiras de fazê-lo e estamos estudando qual o melhor retorno para a empresa. Mas ainda não decidimos nada.

Quando a Nossa Caixa deve finalmente desembarcar na Bovespa e que condições o senhor espera para a operação?

O lançamento das ações deve acontecer no segundo semestre deste ano. Ainda temos que fazer algumas mudanças no estatuto referentes à política de distribuição de dividendos e à divulgação de fatos relevantes. Para atender às exigências do Novo Mercado, precisamos colocar em circulação pelo menos 25% das ações da companhia, mas esse número pode chegar a até 49%, lembrando que temos que reservar pelo menos 5% da oferta para os funcionários do banco. Vamos pedir ao governo federal que autorize o uso do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para a compra das ações, nos moldes do que foi feito com os papéis da Petrobras e da Vale do Rio Doce. Mas acho difícil permitirem isso, porque nesse caso os recursos com o uso do Fundo iriam para o governo de São Paulo e não para a União.

Quando começam os road shows que precederão a abertura de capital?

Já contratamos uma empresa para fazer a avaliação da operação. Depois que sair o resultado, faremos um road show nacional e um, talvez, internacional. Não vamos fazer oferta no exterior, mas estamos abertos aos investidores estrangeiros. Pelo menos num primeiro momento, não pretendemos lançar American Depositary Receipts (ADRs).

A Nossa Caixa tem mais de 60% de sua receita atrelada a títulos públicos. A queda na receita com esses papéis, por causa da Selic mais baixa durante boa parte do ano, reduziu os lucros do banco nos primeiros nove meses de 2004. Este é um dado que provavelmente será levantado por analistas e investidores durante o período em que o banco estiver se apresentando ao mercado. Como pretende responder a isso?

Nosso lucro caiu no ano passado não só por causa da Selic, mas também pelo provisionamento que fizemos para os gastos dos próximos três anos com o Programa de Demissão Voluntária (PDV). Para a demonstração financeira, isso é ótimo porque limpa o balanço da empresa. É verdade que seria preferível que tivéssemos uma carteira menos concentrada em títulos públicos, mas a nossa resposta para esta questão será mostrar uma tabela com a nossa trajetória na evolução de crédito. Já em 2005 devemos elevar a participação da nossa carteira de crédito na receita, de 20% para 30% do total. Vale lembrar que nos meses recentes a volta do aumento dos juros tem contado a nosso favor.

Outro ponto analisado pelo mercado é o fato de o banco ter um índice de consumo de produtos por cliente que corresponde à metade da média das grandes instituições de varejo.Eu vejo a situação por um outro prisma. Temos uma base de clientes para explorar. Só entre os funcionários do Banespa recebemos mais 400 mil correntistas e esperamos receber outro 1,7 milhão até janeiro de 2007, o que dá uma vantagem comparativa imensa. Além disso, estamos em todos os 645 municípios de São Paulo. Só temos que chegar mais perto dos nossos clientes e já estamos fazendo isso. Os outros é que vão ter que correr atrás de nós.

Mas ter tão baixo contato com os clientes não é uma grande desvantagem?

Estamos desenvolvendo estratégias para atender os clientes de forma mais individual. No final de 2004 começamos um programa piloto de segmentação dentro das agências, com atendimento específico às necessidades de cada uma das faixas de renda. Vamos espalhar o programa para 45 novas agências a cada mês. Ampliamos o horário de atendimento dos nossos terminais de atendimento, que só funcionavam das 8h00 às 18h00 em dias úteis, para 6h00 às 22h00 todos os dias. Os demais produtos virão com a constituição das subsidiárias que estão previstas.

Cartão de crédito, previdência, investimentos…

Isso. A administradora de cartões de crédito já foi constituída. Há a subsidiária de ramos elementares (que inclui seguros e previdência), que terá 51% das ações postas à venda. Estamos só aguardando a autorização da Susep.

E quantos interessados nessa participação?

Eu sei de uns oito ou nove. A operação deve sair até março.

E as demais subsidiárias?

Capitalização, uma financeira e a DTVM, que vai nos permitir vender produtos de terceiros. Esta última deve ser constituída já no primeiro semestre.

O senhor diz que a meta da Nossa Caixa é ser a líder em crédito para o varejo em 2008. Para conseguir isso, o terá que superar concorrentes de peso, que saíram na frente fazendo parcerias com grandes redes varejistas no final de 2004. Como vai ser?

É sabido que as nossas taxas para empréstimos são as menores do mercado. Nossos números de 2004 ainda não estão fechados, mas já sabemos que nossas operações de crédito cresceram bem acima da média do mercado no período e uma das razões para isso foi nossa rede de distribuição. Em 2005 vamos crescer bem acima de 30%. Nós contratamos uma pesquisa sobre satisfação dos clientes de bancos e soubemos que a nossa nota é a maior do sistema financeiro. Além disso, vamos transformar o braço da Nossa Caixa para varejo (Credfácil) em financeira, para atender não-correntistas do banco e também fazer convênios com redes varejistas ainda neste primeiro semestre.

O crescimento mais acentuado da oferta de crédito nos próximos anos tem como base a expectativa de que o governo vai dar continuidade ao processo de redução da dívida pública, com as conseqüentes reduções nas taxas de juros e no spread bancário. Essa trajetória não pode ser parcialmente interrompida com a recente elevação da Selic?

Mais do que a política de juros, o grande problema é que o Brasil ainda não consegue fazer um superávit nominal (que inclui o pagamento de juros).

O senhor está dizendo que o efeito do juro mais alto não será tão prejudicial?

Acho que a discussão ainda permanece um tanto enviesada. Não se baixa juro por decreto. Dizer que a política monetária não é vinculada aos interesses da sociedade é só discurso. Austeridade fiscal é pressuposto de qualquer governo, não opção política.

Que cenário o senhor vê para a oferta de crédito imobiliário nos próximos anos?

O problema de falta de financiamento para o setor não é juro alto, mas a baixa renda do trabalhador, além da burocratização. Com o crescimento da economia, isso vai melhorar. Há alguns vícios que criam distorções e precisam ser corrigidos. É o caso do crédito dirigido e da obrigatoriedade de se usar pelo menos metade dos recursos do FTGS para a compra de imóveis novos. Isso cria uma espécie de reserva de mercado para as construtoras. Quando uma pessoa vende um imóvel, ele vai comprar outro. Então, os recursos do Fundo devem ser usados para compra de imóveis, usados ou novos. Para os bancos seria ótimo que esse crédito crescesse. Não há nada melhor para a fidelização de clientes que um financiamento de 10, 15 anos.

Aluísio Alves