USP abre curso para ensino indígena

O Estado de S. Paulo - Terça-feira, 16 de Agosto de 2005

ter, 16/08/2005 - 10h15 | Do Portal do Governo

Iniciativa, a primeira do tipo no Sudeste, será voltada para os 81 profissionais que já dão aulas nas 28 aldeias do Estado

Renata Cafardo

O governo do Estado e a Universidade de São Paulo (USP) começaram no fim de junho a oferecer o primeiro curso superior para professores indígenas da Região Sudeste. O currículo foi elaborado pela Faculdade de Educação da USP apenas para profissionais que já dão aulas nas escolas em 28 aldeias do Estado, por isso não houve vestibular para preencher as 81 vagas. Atualmente, os professores têm apenas formação em nível médio ou magistério, o que, a partir de 2007, poderia os impedir de continuar lecionando, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).
Apesar de o curso já ter começado, a iniciativa só será anunciada amanhã pelo governador Geraldo Alckmin, porque a Secretaria Estadual da Educação ainda finalizava sua estruturação. O Estado investirá R$ 7,215 milhões no curso, chamado de Magistério Intercultural Superior Indígena, além das despesas com transporte e hospedagem dos índios durante as aulas na USP. A formação durará três anos e equivale a um curso de Pedagogia. Parte dele é presencial e parte feito na aldeia, com pesquisas culturais dos povos. É o terceiro curso com esse perfil no País.

São Paulo tem hoje 26 escolas indígenas – em 14 cidades -, que atendem 1.026 alunos em ensino fundamental, apenas de 1ª a 4ª série. Depois do curso, os professores estarão habilitados também a dar aulas a alunos de 5ª a 8ª série, o que pode incentivar a abertura dessas classes. Segundo os indígenas, esse é um dos piores entraves para se manter a tradição e a cultura dos povos, já que as crianças precisam estudar em escolas fora da aldeia se quiserem concluir o ensino médio.

A índia Catarina Delfina dos Santos, da Aldeia Piaçagüera, em Peruíbe, litoral sul do Estado, conta que teve dificuldade em ensinar alunos indígenas que já haviam tido aulas com professores brancos. A escola na sua aldeia, da qual hoje é vice-diretora, começou apenas em 2002. ‘A gente queria trabalhar música, dança, andar no mato e eles reclamavam.’

Hoje, a professora Miriam Itamirim, de 26 anos, que é aluna do curso na USP, já tem mais facilidade para intercalar palavras em tupi-guarani e em português durante as aulas. ‘Meu pai quase não fala em tupi-guarani comigo’, reclama Leonardo dos Santos Silva, de 8 anos, que na escola ganhou o nome de Awa Kwaray (Homem do Sol). Cada um tem um apelido em tupi-guarani, dado pela professora, mas nem todos se lembram ou conseguem pronunciá-lo.

Miriam conta que a alfabetização é feita em português e o tupi fica apenas para a linguagem falada. A intenção do governo do Estado e também do Ministério da Educação (MEC) é incentivar e formar os professores para uma educação indígena bilíngüe. Depois do curso, a USP deve elaborar com os alunos um material didático específico para índios, hoje inexistente no Estado.

Mesmo com estrutura precária – há apenas uma sala na escola, as turmas de 1ª e 2ª séries são juntas, parte da iluminação não está terminada e falta material – as professoras acreditam que a escola indígena é uma melhores maneiras de manter a cultura dos povos. São Paulo tem hoje índios de cinco etnias: guarani, tupi-guarani, kaingang, terena e krenak.