Truta grande e com cor de salmão

O Estado de São Paulo - Quarta-feira, dia 26 de abril de 2006

qua, 26/04/2006 - 10h59 | Do Portal do Governo

Lecitina de soja misturada à ração dá a cor laranja à carne do peixe, que pesa até 1,3 quilo vivo

João Carlos de Faria

As águas frias de Campos do Jordão, na Serra da Mantiqueira paulista, abrigam recentes novidades da criação de trutas. Após 15 anos de estudos, pesquisadores da Estação de Salmonicultura, vinculada ao Pólo Regional do Vale do Paraíba, da Agência Paulista de Tecnologia e Agronegócios (Apta) da Secretaria de Agricultura paulista, conseguiram desenvolver a truta salmonada de grande porte e a um custo muito mais barato, acessível a pequenos criadores. A salmonada é uma truta cuja carne, em vez da cor branca característica da espécie, adquire a cor típica do salmão, daí o nome truta salmonada.

O segredo é a alimentação dada à truta, um peixe da família dos salmões. Na natureza, o salmão adquire a cor alaranjada porque consome pequenos animais, especialmente crustáceos e moluscos, com alta concentração de carotenóides – são os carotenóides que também dão a cor vermelha, laranja ou amarela a vegetais, como tomate, cenoura e até a soja.

RAÇÃO

Já o salmão criado em cativeiro – as grandes criações estão no Chile – é alimentado com ração e a substância misturada à ração para dar a cor alaranjada à carne é a astaxantina, que é muito cara, porém, para ser adotada nas pequenas criações de trutas no Brasil. “A astaxantina é produzida sinteticamente e custa cerca de R$ 400 o quilo”, diz a a veterinária Yara Aiko Tabata, responsável pela pesquisa.

O “pulo do gato” para pequenas criações de trutas ocorreu com a lecitina de soja. “É o produto mais adequado para pigmentar a ração e, conseqüentemente, a cor da carne da truta”, diz Yara. Aliada à salmonização, o produtor também faz a reversão sexual das trutas – peixes fêmeas recebem uma injeção de hormônio para que virem machos e, conseqüentemente, engordem mais, em menos tempo, e adquiram um tamanho maior, pesando até 1,3 quilo. “A truta normal pesa cerca de 300 gramas”, diz Yara. “A técnica permite reduzir o período de fornecimento de ração de sete para quatro semanas.”

Aliando as duas técnicas, mas principalmente a salmonização com lecitina, o produtor agrega até 100% no preço de venda, gastando apenas 30% a mais, segundo a pesquisadora.

IMPULSO

Essas boas novas podem dar um grande impulso na truticultura, principalmente na região serrana do Vale do Paraíba, que concentra 20 dos 25 criadores estimados para o Estado de São Paulo e soma 90% da produção anual de 600 toneladas de trutas. A região é pioneira na atividade, pois foi para o município de Bananal que o Ministério da Agricultura trouxe as primeiras trutas, em 1953, soltando-as nos rios da Serra da Bocaina.

PIONEIRO

Há 23 anos, em Campos do Jordão, o dono do restaurante Terraço Itália, Evaristo Comolatti, em parceria com o técnico Kyoshi Koike, iniciou a primeira criação comercial do Brasil. “Essa é uma opção que começa a despertar o interesse dos criadores, mas por enquanto, porém, ainda não há nada em escala comercial”, ressalta Yara, destacando, além disso, que já há grande procura da truta salmonada por parte dos restaurantes.

Conforme dados oficiais, 80% dos truticultores do Vale do Paraíba são considerados pequenos, avaliados pela capacidade de produção, calculada com base no volume médio de 100 metros cúbicos de água por segundo. “Nossos rios são pouco volumosos e o que determina a produção é a capacidade de vazão por minuto. O criador grande no Brasil é pequeno, se comparado com outros países”, explica Yara.

Há exceções, como a N. R. Truticultura, de Sapucaí Mirim (MG), entre as cidades paulistas de São Bento do Sapucaí e Santo Antônio do Pinhal, que tem vazão de 1.500 metros cúbicos e produção de 480 toneladas/ano, considerada a maior do Brasil. Ainda na divisa dos dois Estados fica a Fazenda do Charco, em Delfim Moreira (SP), única que, por ter água mais fria e controlar a luz que incide sobre os ovos, consegue induzir a desova e ter alevinos o ano todo.