SUS e a busca da eficiência

Jornal da Tarde - Opinião - Quinta-feira, 12 de maio de 2005

qui, 12/05/2005 - 9h45 | Do Portal do Governo

Na saúde, o que prevalece é a chamada ‘cultura da ambulância’: os municípios mandam seus pacientes para hospitais de referência

Luiz Roberto Barradas Barata e José Manoel de Camargo Teixeira

A relação entre médicos e pacientes deve ser, sempre que possível, de proximidade. O profissional de saúde, ao acompanhar a vida do cidadão, conhece seu histórico médico, hábitos, costumes e possíveis reações a medicamentos, dentre outros itens. E o brasileiro, em particular, gosta de fazer seu tratamento perto de casa, de preferência com um médico em quem confie.

O Sistema Único de Saúde SUS contemplou, desde sua concepção, a descentralização do atendimento e as atribuições das três esferas de governo para assegurar o direito constitucional do cidadão de acesso gratuito aos serviços de saúde. Passados mais de 15 anos da implantação do SUS, a constatação é que, em que pesem os avanços, está mais do que na hora de corrigir algumas distorções que tornam, muitas vezes, o atendimento básico na rede pública lento e burocrático.

Quando se vêem hospitais de ponta, como o Hospital das Clínicas HC de São Paulo, sobrecarregados, com espera para marcação de consultas e exames, certamente a conclusão é de que algo está errado. Entretanto, a raiz do problema está longe de ser o HC, que é reconhecido pela excelência de seus serviços, equipamentos, corpo clínico, pesquisas e programas pioneiros.

Para identificar a causa da superlotação de hospitais regionais de nível terciário e quaternário no Estado de São Paulo basta olhar as placas de estacionadas ao redor do Hospital das Clínicas. A maioria é de locais distantes do interior, por vezes até de outros Estados. Há pacientes que vêm do Norte e Nordeste do País para se tratar aqui não exatamente porque queiram viajar centenas de quilômetros, mas porque em São Paulo encontram o que há de mais moderno em tecnologia e serviços hospitalares.

Evidentemente que a referência para os casos mais complexos são unidades como os Hospitais das Clínicas de São Paulo, Campinas e Ribeirão Preto, por exemplo. Mas os pacientes com problemas simples devem ser atendidos nos próprios municípios ou regiões de origem. Estudos revelam que cerca de 80% dos problemas de saúde se referem a casos de baixa complexidade, que podem ser solucionados com uma boa estrutura de atenção básica, atribuição essa que está a cargo dos municípios.

O que prevalece, no entanto, é a chamada ‘cultura da ambulância’, ou seja, municípios que não investem na construção de postos de saúde ou na contratação de clínicos gerais e mandam seus pacientes para hospitais de referência em média e alta complexidades, sobrecarregando os ambulatórios de especialidades médicas e os setores de emergência dessas unidades.

Em Campinas, o HC da Unicamp sentiu a necessidade de reorganizar o atendimento no PS e ambulatório, justamente por conta do excessivo número de pacientes com doenças simples que chegavam à porta da unidade – 80%, conforme cálculos da própria direção. No ano passado, a Unicamp estabeleceu um programa denominado ‘classificação de risco’, priorizando o atendimento das urgências médicas. Com isso, o HC de Campinas pôde direcionar mais recursos para os procedimentos considerados estratégicos, como transplantes, cirurgias de obesidade mórbida e oncologia.

Não deve demorar muito para que outros hospitais de perfil terciário e quaternário do Estado adotem medidas semelhantes não com o objetivo de negar assistência médica, mas, primordialmente, de estabelecer um fluxo racional de referência e contra-referência para garantir o efetivo e pronto atendimento da população.

Urge, portanto, que as prefeituras dos 645 municípios paulistas atentem para essa questão crucial, trabalhando em redes integradas e compartilhando responsabilidades para tornar o SUS de São Paulo mais rápido e eficiente.

Luiz Roberto Barradas Barata é médico sanitarista e secretário de Estado da Saúde de São Paulo

José Manoel de Camargo Teixeira é superintendente do Hospital das Clínicas de São Paulo