Sem alarde, estaduais de TI ganham força

Valor - Segunda-feira, 29 de agosto de 2005

seg, 29/08/2005 - 10h16 | Do Portal do Governo

Serviços

Informatização crescente nos governos dá impulso às companhias de processamento de dados

João Luiz Rosa e Ricardo Cesar
De São Paulo

Elas não são conhecidas da população como outras empresas públicas, a exemplo do Metrô ou das companhias de fornecimento de água, caso da Sabesp em São Paulo. Mas, nos últimos anos, à medida que a tecnologia da informação (TI) ganha força em todos os lugares – e o governo não é exceção -, as empresas estaduais de processamento de dados tornaram-se uma espécie de força invisível, porém inegável, na administração pública.

Sem elas, os serviços dos departamentos de trânsito, os pregões eletrônicos de compras, o processamento das folhas de pagamento dos servidores públicos e a emissão de documentos aos cidadãos – serviços cada vez mais dependentes da tecnologia – simplesmente não aconteceriam. Ou, no mínimo, estariam em um estágio bem menos desenvolvido.

Há 26 empresas estaduais de tecnologia no país. Juntas, nove das principais ouvidas pelo Valor prevêem encerrar o ano com um faturamento de R$ 968 milhões. Se fosse uma única companhia, o grupo seria uma das maiores empresas brasileiras de tecnologia, à frente de nomes como a holding Totvs, que reúne as fornecedoras de sistemas de gestão Microsiga e a Logocenter, ou a integradora CPM, por exemplo.

Mesmo isoladas, essas empresas demonstram uma força insuspeita. A paulista Prodesp – a maior delas -, deu um salto de 356,5% em seu lucro líquido entre 2003 e o ano passado, quando obteve ganhos de R$ 8,9 milhões. Em 662º lugar no ranking principal do Valor 1000, que lista as mil maiores companhias do país, a empresa prevê encerrar o ano com receita de R$ 420 milhões. ‘Em 2005, a estimativa é ultrapassar os R$ 550 milhões’, diz Paulo Sérgio Varella, diretor-presidente da Prodesp.

Os motivos que explicam o crescimento das estaduais de TI estão literalmente na ‘cara’, ou no logotipo, de algumas dessas companhias. A Prodesp trocou sua marca – um ‘P’ e um ‘D’ entrelaçados, em referência à velha expressão processamento de dados – pelo ‘T’ e o ‘I’, de tecnologia da informação. A Prodemge mantém a sigla, mas seu nome oficial é Companhia de Tecnologia da Informação do Estado de Minas Gerais.

As mudanças ilustram como uma atividade restrita e de aplicação técnica como o processamento de dados – a origem dessas companhias a partir da década de 70 -, expandiu-se para o uso da informática como uma ferramenta para o governo melhorar o planejamento estratégico e comunicar-se com os cidadãos.

‘Hoje, não basta ao administrador público bons projetos e articulação política’, diz Varella, da Prodesp. ‘É preciso também capacidade de planejamento e controle da execução, tarefas que encontram na TI um aliado estratégico.’

É nesta direção que vai boa parte dos projetos em andamento nas estaduais de TI. A Companhia de Processamento de Dados do Estado da Bahia (Prodeb), por exemplo, inaugura em outubro um data center – uma área que reúne grandes computadores para processar e armazenar dados e sistemas – avaliado em R$ 20 milhões. Com a nova estrutura, a empresa espera imprimir maior velocidade e segurança a seus serviços, como rodar a folha de pagamento de 200 mil servidores públicos do Estado.

Em Pernambuco, a Agência Estadual de Tecnologia da Informação (ATI) está licitando uma rede multidigital, que fará todo o transporte de dados dos órgãos do Estado, com capacidade para transmitir voz e conteúdo multimídia. A carioca Proderj conduz um projeto semelhante: o Infovia.RJ, uma rede que interliga 68 municípios e tem previsão de ser ampliada para 92 cidades até o fim do ano.

Os serviços ao público são outra tendência crescente nessas companhias. A Celepar, do Paraná, participa ativamente de programas de inclusão digital e de informatização de escolas públicas. Já a Prodesp gerencia os Poupatempo, uma rede de postos que emite documentos de identidade e carteira de trabalho, entre outros serviços.

Em São Paulo, a tecnologia está mudando até a rotina das prisões. A novidade mais recente é um sistema de videoconferência desenvolvido pela Prodesp para que o juiz possa tomar o depoimento de um preso sem que este tenha de sair da cadeia. ‘O processo elimina o risco de fuga, libera o contingente policial e acelera o processo penal’, observa Varella.

Juntas, as companhias governamentais de tecnologia formariam uma das maiores empresas do setor no país

A outra vantagem óbvia do sistema é a economia proporcionada aos cofres públicos. No primeiro semestre, o vai-vem dos detentos no Estado envolveu 96 mil policiais. Foram 46 mil escoltas, que transportaram 124 mil presos e rodaram 3,3 milhões de quilômetros. O custo de tudo isso? R$ 5,8 milhões. A videoconferência não vai substituir integralmente o processo tradicional, mas pode ajudar a cortar parte dos gastos.

Economia, aliás, é a palavra-chave quando se fala do impulso recebido pelas estaduais de TI. O objetivo, em geral, não é transformá-las em fonte de lucro, desde que elas funcionem como uma tesoura nas despesas de outras áreas.

Em São Paulo, o governo economizou R$ 95 milhões em 2004, com o uso de uma bolsa eletrônica de compras. Foram 11 mil negócios. Na semana passada, o projeto foi ampliado e os pregões on-line passaram a não ter limite de valor.

‘As empresas estaduais de TI devem atuar para racionalizar a demanda e atendê-la no governo’, diz Mauricio Azeredo Dias Costa, presidente da Prodemge. ‘A grande sacada da integração dos sistemas de tecnologia é permitir à administração controlar os seus gastos.’ Atualmente, a Prodemge trabalha na unificação de três sistemas centrais em Minas Gerais.

Em São Paulo, o Sistema Estratégico da Informação unificou os cadastros de serviços prestados ao governo, com informações de 39 mil contratos fechados a partir de 1995. ‘Desses, só cinco mil estão vigentes, mas as informações possibilitaram melhores condições na hora de fechar um contrato’, diz Varela. A economia calculada, nesses dez anos, é de R$ 10,5 bilhões.

Ao unificar o processo de compras de TI do governo, as companhias estaduais também ganham poder de negociação frente aos fornecedores. A Prodesp estimava pagar R$ 842 milhões em links de telecomunicações nos próximos cinco anos. Fez um leilão que recebeu 92 lances de três empresas – Telefônica, Telemar e Embratel -, e conseguiu reduzir o valor para R$ 245 milhões.

Nem tudo, claro, é tranqüilo na condução dessas companhias. Há críticas da iniciativa privada em relação ao papel dessas empresas. As estatais concorreriam em condição privilegiada pelos contratos públicos, reclamam alguns empreendedores.

Além disso, há uma discussão acalorada sobre dois modelos antagônicos de funcionamento – um centralizador e estatizante e outro que colabora ativamente com a iniciativa privada.

Apesar dessa divergência, as empresas têm buscado formas de colaboração. A tarefa fica a cargo da Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Tecnologia da Informação e Comunicação (Abep), presidida por Tereza Porto, que também está à frente da Proderj, no Rio de Janeiro.

O principal papel da Abep é evitar que um Estado gaste tempo e dinheiro para desenvolver algo que já foi feito em outro lugar. São organizadas reuniões trimestrais de presidentes, diretores técnicos e administrativos. ‘O Rio Grande do Norte, por exemplo, fez um sistema de gestão do Detran muito interessante, no qual outros Estados estão interessados’, diz Tereza. ‘Os softwares públicos podem ser aperfeiçoados e compartilhados. Todos os Estados ganham.’