Segunda fase de PPPs traz oportunidades em áreas alternativas

Valor Econômico - Terça-feira, dia 18 de julho de 2006

ter, 18/07/2006 - 11h00 | Do Portal do Governo

Marta Watanabe e Samantha Maia

Nem só de infra-estrutura viária vivem as Parcerias Público Privadas (PPPs). Estados como São Paulo, Minas Gerais e Ceará estão propondo projetos que fogem das estradas e metrô e englobam investimentos diversos, que vão desde a montagem de um campus universitário, construção de centro de convenções até reforma de ginásios esportivos e identificação de pessoas pela impressão digital. Pioneira entre os municípios, a prefeitura de Porto Alegre deve oferecer ao setor privado a construção de um centro de processamento de dados e informações.

Ao contrário das obras de infra-estrutura viária, esses projetos têm um atrativo diferenciado: no lugar da remuneração com tarifas, esses investimentos incluem, além da realização da obra, a gestão da iniciativa privada e a participação na venda de serviços a terceiros, o que privilegia mais a eficiência na estrutura e condução dos negócios. Quanto mais receita com venda de serviços a terceiros a parceria render, mais ganham o poder público e a iniciativa privada.

Quem construir o campus para a universidade estadual de Minas Gerais (Uemg), por exemplo, terá pelo menos 30% do terreno da cidade universitária para explorar com estacionamentos, restaurantes, locação de espaços para comércio, agências bancárias e até um shopping. De forma semelhante, no Ceará, a empresa – ou grupo de empresas – que construir o novo centro de convenções na capital terá o direito de explorar eventos, locar o espaço, além de administrar um entorno que poderá ter comércio, estacionamento, restaurantes e talvez um hotel.

Em São Paulo, o investidor que reformar e ampliar o Complexo Constâncio Vaz Guimarães, centro esportivo localizado junto ao ginásio do Ibirapuera, terá participação na receita com estacionamento e bilheteria. Em todos os casos, as receitas serão divididas com o poder público. O percentual de participação de cada parte ainda não está definido e provavelmente será alvo das propostas das empresas.

“Não há razão para o município investir sozinho numa estrutura que servirá a terceiros. Além disso, a PPP faz com que o projeto seja pensando nos moldes da iniciativa privada, que visa resultados, o que infelizmente não ocorre com obras públicas”, explica André Imar, presidente da Companhia de Processamento de Dados do Município de Porto Alegre (Procempa).

Imar se refere ao projeto que dará ao parceiro privado, na construção do centro de processamento e armazenamento de dados, a oportunidade não só de fornecer ao município como de participar nas receitas de vendas desses serviços a terceiros. Para o engenheiro Rubens Alves Teixeira, especialista em PPPs e consultor do Albino Advogados Associados, a participação privada em projetos como esse eleva a eficiência do serviço.

As iniciativas dos Estados e de Porto Alegre seguem o curso natural das PPPs, segundo os especialistas. “Na Inglaterra, os serviços são representativos entre as parcerias, representando de 50% a 60% do total”, diz Marcelo Fernandes, gerente de corporate finance da Deloitte Touche Tohmatsu.

“Essa é a tendência das PPPs. É natural que as atenções iniciais no Brasil estejam voltadas para a infra-estrutura porque há uma demanda muito grande na área. Mas já há muitos projetos que utilizam uma forma que alia as obras à exploração de serviços com possibilidade de receita extra na venda a terceiros”, diz o consultor Paulo Dal Fabbro, da área de PPP e project finance da PricewaterhouseCoopers. “Isso amplia o campo de investimento via PPP.”

Silvio Lombardi, diretor de projetos especiais da Griaule, empresa especializa em sistemas de identificação digital, acompanha passo a passo um dos projetos PPP divulgados pelo Estado de São Paulo: o arquivo detido pela Secretaria de Segurança Pública contendo nome, número de RG, filiação, foto e digitais dos que detém a carteira de identidade no Estado. Atualmente só é possível fazer buscas por meio do nome ou número de RG da pessoa, o que dificulta a identificação de alguém sem referências. O Estado quer implantar, por meio de PPP, um sistema que faça a busca via impressão digital.

A Griaule já implantou o sistema no Estado de Tocantins e para a identificação de passaportes na Costa Rica. Nos dois casos, porém, explica Lombardi, o serviço se esgota praticamente na implantação do sistema. “A vantagem da PPP seria o fluxo de receitas por um longo período de tempo”, diz. Além disso, a parceria com o Estado, diz, dá mais credibilidade ao sistema e facilita a venda do serviço.

O secretário de Planejamento do Estado de São Paulo, Fernando Braga, considera a participação do parceiro privado essencial. “Esse projeto junta uma necessidade do governo de acesso aos dados com a possibilidade de exploração comercial que o Estado não saberia fazer”, disse. O projeto prevê que o parceiro privado participará da receita com a venda de serviços de confirmação de identidade online. “Para o comércio, é um sistema eficiente para saber se o comprador que paga com cheque ou cartão é realmente quem está se apresentando”, diz Lombardi

Os valores de investimento nas “PPPs alternativas” são tão variados quanto os projetos. O centro de armazenamento de dados desenhado pela prefeitura de Porto Alegre deve demandar investimento total de R$ 20 milhões – o mínimo estabelecido pela lei de PPP. O novo centro de convenções de Fortaleza, porém, está estimado em R$ 235 milhões.

“A construção do novo centro de convenções de Fortaleza é um projeto que já existia antes da PPP e foi retomado agora para estudar sua viabilidade no modelo de parceria. O projeto tem investimento muito alto e é inviável sem os recursos do setor privado”, diz o coordenador de captação de recursos da Secretaria do Planejamento do Estado do Ceará, Francisco Assunção e Silva. “A idéia de dar ao parceiro privado o direito de participar das receitas de exploração do centro e seu entorno é uma forma de viabilizar mais rapidamente o retorno do investimento. A remuneração do Estado não seria suficiente.”

Em São Paulo, o investimento previsto para o projeto de identificação digital, de R$ 600 milhões, é alto inclusive na comparação com o orçamento de R$ 70 milhões que a Secretaria de Segurança Pública tem para investir em tecnologia. A PPP, segundo a Secretaria, possibilita ao governo antecipar o investimento no sistema.

Apesar das expectativas em torno das “PPPs alternativas”, Maurício Endo, diretor de projetos de PPP da KPMG, chama a atenção para discussões que já aconteceram na Europa e que poderão surgir no futuro. “É preciso ver com cuidado os projetos que trabalham com uma tecnologia de ponta. Os saltos tecnológicos são freqüentes e rápidos e isso pode inviabilizar o projeto como PPP, já que exigirá um investimento constante.”

Braga, secretário de Planejamento, disse que o Estado de São Paulo já considerou essa situação no projeto de identificação digital. “Se houver necessidade de modificação da tecnologia, faz-se uma negociação com a empresa e renova-se a concessão”, explicou.