Realidade virtual a serviço da segurança

Jornal da Tarde - Segunda-feira, 31 de maio de 2004

seg, 31/05/2004 - 14h15 | Do Portal do Governo

Pesquisador da Escola Politécnica da USP recriou, por computação gráfica, uma cena que teria acontecido na casa da família Rugai. Agora, haverá mais colaboração da universidade com a polícia

MARINÊS CAMPOS

Na tarde de uma sexta-feira, no mês passado, o pesquisador Luciano Pereira Soares, 26 anos, foi procurado por um grupo de policiais no Laboratório de Sistemas Integráveis LSI da Escola Politécnica da USP. Os homens entregaram a ele algumas fotografias dos ambientes de uma casa do bairro de Perdizes, tiradas de vários ângulos; uma porta, onde havia a marca de uma pegada; e a foto do pé de um rapaz de 21 anos. E os policiais avisaram: tinham pressa.

Na segunda-feira seguinte, o gerente de projetos do Núcleo de Realidade Virtual do LSI foi até o Instituto de Criminalística da Polícia Civil, bem perto dali, na Cidade Universitária, e levou o trabalho encomendado. Soares entregou aos peritos a simulação, feita por computação gráfica, de uma cena que poderia ter acontecido naquela casa.

Lá, na noite de 28 de março, o publicitário Luiz Carlos Rugai e sua mulher, Alessandra Troitino, foram assassinados a tiros. E, tanto para a polícia como para o Ministério Público, o autor dos crimes é o filho de Luiz Carlos, Gil Rugai.

Para transformar o material recebido da polícia em uma animação gráfica, Soares usou a tecnologia desenvolvida na Escola Politécnica. ‘Com base nas fotos, reconstruímos o cenário em três dimensões, com um scanner 3D, e tentamos chegar perto da realidade ‘, explica o pesquisador. E, no ‘filme’ entregue aos peritos, um Gil Rugai virtual chuta a porta da sala de vídeo da casa, onde o pai teria se refugiado para escapar dos tiros.

‘Para que a cena se tornasse mais real, eu precisaria ter os dados do tomógrafo (uma tomografia mostrou que o pé de Gil sofreu lesões compatíveis com as causadas por um forte golpe na porta)’, diz Soares. ‘Mas tive apenas um dia para fazer tudo.’

Com as fotografias do pé de Rugai, de seu sapato e da pegada deixada na porta, o pesquisador fez a simulação gráfica: ‘A gente não pressupôs que ele chutou a porta. Mas, de acordo com as medidas da pegada, há um grau de coincidências muito grande.’

Simulação será avaliada por especialistas da polícia

Soares, no entanto, observa que seu trabalho não foi feito para reforçar ou suavizar a acusação contra o rapaz: ‘A perícia usa métodos tradicionais. Contribuímos com informações complementares. No computador, a imagem pode ser parada, vista em câmera lenta e por ângulos diferentes. A simulação abre a mente para outras possibilidades. Mas essa análise depende de especialistas da polícia.’

A rotina no LSI é a de desenvolver projetos de engenharia. Mas, a partir dessa colaboração com a polícia no caso Rugai, Soares acredita que o Núcleo de Realidade Virtual possa ser procurado outras vezes para ajudar na reconstituição virtual de crimes.

No laboratório, é usada a tecnologia de aglomerados de computadores. ‘Um computador convencional não conseguiria realizar certas tarefas’, explica Soares. ‘Por isso, usamos vários para tratar a informação de forma rápida.’

Outra experiência está sendo feita no LSI, na Caverna Digital – uma sala de realidade virtual, onde imagens tridimensionais são projetadas no chão e nas paredes. Essa tecnologia reproduz ambientes, que são vistos com óculos especiais, e dá a sensação a qualquer pessoa de estar participando de um videogame. Soares explica que, na Caverna, é possível ter uma noção exata da trajetória de um tiro, por exemplo, por meio de um rastreador eletromagnético.

Também no LSI, dirigido pelo professor João Antonio Zuffo, Soares consegue ampliar fotos aéreas ou de satélites – ele já tem as imagens das favelas da Rocinha e do Vidigal, no Rio de Janeiro -, que podem servir para o planejamento de operações policiais.

‘Ainda não podemos fazer isso em tempo real, mas dá para ver com nitidez onde estão as casas e as rotas de fuga’, aponta. ‘Se houver algum incidente, é possível saber a trajetória dos tiros.’

Militares do Exército estão interessados na tecnologia desenvolvida na Escola Politécnica. Tanto que, dias atrás, um grupo deles esteve no LSI especialmente para conhecer a Caverna Digital. Isso porque, além das imagens das áreas críticas do País, clareiras abertas na Floresta Amazônica, que servem como pistas clandestinas para aeronaves, também podem ser reveladas pelo equipamento.Pesquisador da Escola Politécnica da USP recriou, por computação gráfica, uma cena que teria acontecido na casa da família Rugai. Agora, haverá mais colaboração da universidade com a polícia.