Quixotes de Portinari voltam à luta

Folha de S. Paulo - Quarta-feira, 28 de abril de 2004

qua, 28/04/2004 - 9h08 | Do Portal do Governo

CASSIANO ELEK MACHADO, DA REPORTAGEM LOCAL

De todas as mais de 5.000 obras que o prolífico Candido Portinari espalhou em telas, papéis e até em murais no prédio das Nações Unidas, em Nova York, um conjunto de 21 desenhinhos elaborados com lápis de cor desses que se compra na esquina ficam em seu pedestal particular.

As ilustrações que o artista de Brodósqui fez em 1956 inspirado no ‘Dom Quixote’, de Miguel de Cervantes, eram suas obras mais queridas. A ‘confidência’ foi feita à Folha pela viúva do artista, Maria Portinari, em 1997.

A partir de hoje, qualquer um pode ter o conjunto completo dos ‘prediletos’ do pintor modernista. Uma dobradinha da Fundação Memorial da América Latina, que comemora 15 anos, e do Museu de Arte Contemporânea da USP, em parceria com a Imprensa Oficial de São Paulo, resultou no álbum ‘D. Quixote – Portinari’, que será lançado hoje.

Evento que fecha as comemorações do centenário de Portinari (1903-1962), coordenadas pela fundação que leva o nome do artista, o lançamento será feito em um cenário especial: o Salão de Atos Tiradentes do Memorial, espaço projetado por Oscar Niemeyer, amigo de Portinari, onde fica o grandioso painel portinariano ‘Tiradentes’, de 18 metros.

Feita em 1948, essa obra é oito anos mais jovem do que a série de desenhos apresentada no catálogo. Feitos a pedido do editor José Olympio para ilustrar a segunda edição da primeira tradução brasileira de ‘Dom Quixote’, os desenhos começaram a ser feitos em 1956 (motivo pelo qual Antonio Callado dizia: ‘No ano de 1956 Candido Portinari sagrou cavaleiro o lápis de cor’).

Os rabiscos ágeis e coloridos de Portinari só ganharam as livrarias no final de 1972, após a morte do artista. Foram lançados no álbum de luxo ‘D. Quixote: Cervantes, Portinari, Drummond’, acompanhados de textos deste último, no dia em que o poeta mineiro completou 70 anos.

Como escreveu Drummond, sobre o ‘Quixote portinariano’, que ‘enche de felicidade os olhos que o contemplam’, os desenhos foram feitos em um momento difícil do artista, quando ele não podia pintar. ‘Os sais de chumbo das tintas envenenavam-no lentamente, e o médico lhe recomendou que parasse’, escreveu Drummond em 73. ‘Portinari, que não fazia outra coisa senão pintar, refugiou-se no desenho.’

O Cavaleiro da Triste Figura, que o ‘pintor de lápis em riste’ riscou, volta a sair do refúgio.


D. QUIXOTE DE PORTINARI.
Lançamento do livro: hoje, às 19h30.
Onde: Memorial da América Latina (av. Auro Soares de Moura Andrade, 664, São Paulo, tel. 0/xx/11/ 3823-4600). Grátis.