Quarenta quilômetros pelo custo de dezesseis

Valor Econômico - 13/5/2002

seg, 13/05/2002 - 10h24 | Do Portal do Governo

‘Não foi necessário um empréstimo novo para as obras no Tietê.’

O governador de São Paulo Geraldo Alckmin teve, em 10/4, o privilégio de dar início a uma das mais extraordinárias obras contra enchentes na região metropolitana de São Paulo: a segunda etapa do aprofundamento da calha do Rio Tietê.

Na realidade, este programa, que é o mais audacioso contra enchentes em toda a história de São Paulo, iniciou-se em 1995, quando o governo Covas assinou com o Overseas Economia Cooperation Found, hoje JBIC, órgão do governo japonês, um financiamento para um conjunto ambicioso de obras portentosas: a construção de duas grandes barragens no Alto Tietê, (Biritiba e Paraitinga), a canalização de 10,3 quilômetros do Rio Cabuçu de Cima, na divisa entre São Paulo e Guarulhos, e no aprofundamento da calha do Tietê, em uma primeira etapa, entre a barragem de Edgar de Souza, em Santana do Parnaíba e o Cebolão, numa extensão de 16 quilômetros. A obra, que aprofundou o canal em 2,5 metros, em média, já possibilitou aumentar em 70% a capacidade de vazão do Tietê neste trecho.

Concluídas as obras desta primeira etapa em dezembro de 2000, que evidentemente começaram pelo ponto mais baixo, a jusante, em Santana do Parnaíba, é preciso continuá-las, no trecho de maior visibilidade e de maior impacto hidráulico, entre o Cebolão e a Barragem da Penha, numa extensão de 24,5 quilômetros. Esta intervenção, com duração prevista de 30 meses, consiste não apenas no aprofundamento da calha do Tietê, mas também no seu alargamento (até o ponto onde as marginais o permitam) e no aumento da declividade do fundo do rio, o que irá dobrar sua vazão. Em outras palavras, irá permitir que onde hoje passa um rio Tietê haja espaço para dois Tietês, o que vai não só eliminar iluminadas as enchentes nas marginais, como também contribuir para que os afluentes tenham mais facilidade em jogar sua águas no Tietê, evitando inundações nos trechos mais próximos de suas desembocaduras. Além disso, esta segunda etapa da obra também contará com a construção de uma esclusa, sob o Cebolão, o que tornará o Tietê navegável em São Paulo.

Para prosseguir com estas obras, após a conclusão primeira etapa, é normal que se solicite ao órgão financiador um novo empréstimo. No entanto, não foi o que ocorreu. Não foi necessário um novo financiamento: esta nova etapa será custeada com o saldo da primeira etapa. Em 1995, no primeiro ano do governo Covas, os valores do empréstimo assinado com o governo japonês para construir as duas barragens, canalizar o Cabuçu e aprofundar 16 quilômetros da calha do Rio Tietê, foram baseados em cálculos feitos no governo anterior. Aproximadamente 800 milhões de reais.

Com base nesse orçamento, pleiteou-se o empréstimo e este montante, no seu equivalente em ienes, foi autorizado pelo governo japonês. Neste valor foi assinado o financiamento. Com licitações abertas, sem cartas marcadas, as empresas vencedoras apresentaram preços que, em média, mesmo incluindo aditamentos necessários, ficaram 40% abaixo dos valores inicialmente previstos. Isso gerou um saldo, que amplificado pela desvalorização de 250% do real, no período de 1995 até hoje, perfaz quase R$ 500 milhões. Pleiteou-se então a autorização do governo japonês para usar esses recursos, acrescidos de R$ 200 milhões correspondentes à contrapartida nacional, para a segunda etapa das obras de aprofundamento da calha. Portanto, não foi necessário um empréstimo novo. O orçamento é decorrente da economia que foi conseguida na primeira etapa das. Com estes recursos, será possível aprofundar mais 24,5 quilômetros do Tietê, entre o Cebolão até a Penha. É fato inédito: 40 quilômetros de aprofundamento e alargamento da calha do Tietê serão feitos com os recursos previstos para 16 quilômetros. E estes 24,5 quilômetros ficam na área onde estão as principais interferências e por onde transitam 700 mil veículos por dia, já que as marginais, ligando 10 das mais importantes rodovias do país, hoje fazem o papel que será futuramente exercido pelo Rodoanel.

Além disso, há um outro excepcional ganho. O ganho de tempo. As obras desta segunda etapa de aprofundamento da calha do Tietê ficarão prontas dois anos antes. Isto porque dois anos é o prazo mínimo para se conseguir aprovação de um novo empréstimo internacional, cuja liberação depende do Ministério do Planejamento, da Fazenda, do Banco Central e do Senado Federal. Como não se pediu um novo empréstimo e vai se utilizar o saldo do financiamento anterior, ganha-se esse prazo. As obras que ora se iniciam só poderiam vir a ter seu lançamento, no melhor das hipóteses em 2004.

Mas as obras não serão suficientes para eliminar totalmente as mudanças ao longo da extensão completa dos afluentes, o que depende de trabalhos das Prefeituras. É importante esta ressalva para não criar falsas ilusões. A solução completa para o problema de enchentes em são Paulo foi apontada pelo Programa de Macrodenagem, que prevê duas linhas de atuação: a jusante, o aprofundamento do Tietê, e a montante, a construção das duas barragens e de piscinões ao longo dos afluentes.

A Região Metropolitana de São Paulo é a primeira do Brasil e da América Latina a ter um plano de macrodrenagem, o que permite avaliar o impacto das intervenções, de forma global e não pontual. O plano de macrodrenagem dá subsídios para evitar intervenções como ocorriam no passado, quando a única solução para as enchentes era canalizar o rio, ribeirão ou riacho e exportar o problema para um ponto mais abaixo, a jusante. Permite também visualizar, no seu conjunto as obras necessárias e quais dependem de uma iniciativa do Estado e das Prefeituras. Aliás, dessa ação conjunta do Governo do Estado com as Prefeituras depende da solução completa do problema das enchentes. O Estado tem feito sua parte. Aliás, a parte mais difícil e dispendiosa.

Antonio Carlos de Mendes Thame

Antonio Carlos de Mendes Thame é deputado federal e ex-secretário estadual de Recursos Hídricos, Saneamento e Obras de São Paulo.