Preso grupo que explorava compra de remédios caros

O Estado de S.Paulo - Terça-feira, 2 de setembro de 2008

ter, 02/09/2008 - 8h26 | Do Portal do Governo

O Estado de S.Paulo

A polícia de São Paulo prendeu ontem um grupo acusado de participar de um esquema que obrigaria o governo do Estado a bancar remédios de alto custo não previstos na lista de distribuição gratuita. Até agora, o valor confirmado do “prejuízo” causado pela ação do grupo – formado por advogados, um médico, administradores de uma ONG e três funcionários de laboratórios multinacionais – está estimado em R$ 900 mil e envolve 15 pacientes. Alguns tiveram a saúde prejudicada.

A Secretaria de Estado da Saúde, porém, estima que sejam cerca de 2.500 pacientes envolvidos no esquema, com custo total estimado em R$ 63 milhões. Os representantes das farmacêuticas Mantecorp, Wyeth e Serono são acusados de pagar propina para que advogados movessem ações judiciais desnecessárias em nome de pacientes.

Na operação, deflagrada ontem, nove pessoas foram detidas. Segundo a polícia, a fraude era centrada em quatro cidades do interior paulista: Quatá, Marília, Bauru e Ribeirão Preto. A quadrilha teria agido da seguinte forma: a ONG Associação dos Portadores de Vitiligo e Psoríase de São Paulo, em Marília, selecionava pacientes e os encaminhava para a clínica particular do dermatologista Paulo César Ramos. O médico não cobrava pelas consultas e emitia laudos – segundo a polícia usando documentos falsos – afirmando que os pacientes precisavam dos medicamentos Etanercept, Infleximabe e Efalizumab, fabricados pelos três laboratórios e indicados para o tratamento de artrite reumatóide e da doença rara de Kron, mas usados também para tratar a psoríase (doença auto-imune que provoca feridas na pele).

As farmacêuticas teriam coberto os custos dos processos judiciais movidos por três advogados e teriam pago R$ 150 por pessoa atendida pelo doutor Ramos. Tudo isso para lucrar com a compra via ação judicial das três drogas. “Foram 15 pessoas beneficiárias das ações judiciais. Nenhuma delas sabia que era autora de um processo jurídico, portanto são vítimas também”, afirma o secretário de Estado da Saúde, Luiz Roberto Barradas Barata. “Dos pacientes envolvidos, três nem eram portadores de psoríase e, por causa da ingestão desnecessária de medicamentos, tiveram o sistema imunológico alterado e desenvolveram tuberculose”, disse.

Segundo o delegado da seccional de Marília, Fábio Alonso, que organizou a operação, os envolvidos no esquema vão responder por “formação de quadrilha, uso de documento falso, falsidade ideológica, emissão falsa de atestado médico e perigo para a saúde de outrem”. Somadas, as penas em regime fechado chegam a dez anos. “Abrimos o inquérito policial há 70 dias e, por meio de escutas telefônicas autorizadas pela Justiça, comprovamos a fraude”, disse Alonso. “Só na sede da ONG, apreendemos R$ 500 mil em medicamentos estocados, além de laudos médicos em branco, mas já assinados pelo médico.”

Para o governador José Serra (PSDB), o alcance das fraudes é muito maior. “Hoje, no Brasil, há uma indústria de ações judiciais”, disse. Ele afirmou que a operação de ontem foi apenas “a ponta do barbante de um nó que precisa agora ser desatado.” “Trata-se de uma forma de corrupção mórbida que envolve a saúde das pessoas”, disse.

Atualmente, são atendidos por medicamentos fornecidos por ações judiciais 3.200 pacientes com psoríase. No início do ano, o delegado Alexandre Zakir foi escalado para atuar só na investigação de fraudes de ações judiciais. “Já abrimos inquérito em várias cidades do Estado, envolvendo outros laboratórios nacionais e internacionais”, afirmou Zakir.

No ano passado, o Estado bancou R$ 400 milhões com remédios via Justiça. “Estimamos que R$ 200 milhões sejam em decorrência de fraudes”, avaliou Barradas, ao citar o aumento explosivo das verbas para custear ações. Em 2003, foram R$ 44 milhões, um crescimento foi de dez vezes.

“Já temos fortes indícios. Exemplo: 100% das ações para compra de insumos para paraplégicos foram de laudos emitidos por um só médico. Já para um tipo de câncer, 70% dos laudos são de autoria de um médico paulistano”, explicou.