Presídio usa capoeira para reintegração

Correio Popular - Campinas - Sexta-feira, 14 de maio de 2004

sex, 14/05/2004 - 9h09 | Do Portal do Governo

Na Penitenciária do São Bernardo, ‘batizado’ de 12 detentos vira show durante evento educacional

Bargas Filho, da Agência Anhangüera

Quando projetou o corpo no ar durante um “salto mortal”, o detento Dênis de Lima mostrou aos demais sentenciados que se aglomeravam em seu redor a possibilidade de sentir a sensação de liberdade mesmo estando atrás das grades. O vôo de Dênis ocorreu ontem durante o batismo na capoeira de 12 detentos na Penitenciária do São Bernardo, no bairro São Bernardo, em Campinas. O presídio abrigava ontem 728 homens condenados e 37 deles participam do “academia” de capoeira, uma das atividades do projeto de ressocialização desenvolvido pela diretoria da unidade.

“O esporte e as atividades culturais amenizam a nossa situação atrás das muralhas”, disse Dênis, que é cordão verde-amarelo-azul-branco em capoeira, portanto, capacitado para dar aulas. Ontem, dia da Abolição da Escravatura, foi a data escolhida pelos detentos para o “batismo”. “A capoeira é uma cultura afro-brasileira e a data é propícia”, disse Roberto Santos Bueno, cordão azul-amarelo, que está há 18 meses no presidio e foi um dos introdutores da capoeira. “É um pouco da fuga do ócio da cadeia. É uma higiene mental, uma atividade para aquele que procura uma melhora”.

Os 37 praticantes formaram um círculo no centro da quadra e jogaram capoeira para marcar a entrega dos cordões. Oito detentos receberam o cordão verde, que é o primeiro grau da capoeira, outros dois o cordão amarelo e dois o cordão azul. A maioria dos detentos assistiu o batismo na quadra.

“Conseguimos chegar a esse ponto. Aqui estão os detentos, funcionários e a imprensa. Em outros tempos, seria impossível permitir que alguém entrasse aqui”, explicou Luciano Dias da Silva, diretor de disciplina e segurança da penitenciária. Há dois anos não ocorre rebelião na unidade, que possui capacidade para 540 presos.

Escola

Na penitenciária existe uma escola de cabeleireiro que irá formar uma turma de 13 detentos no próximo mês. “Também temos a escola de Ensino Fundamental e Médio além de atividades culturais como um concurso de poesia”, disse o diretor geral da unidade, Luciano César Orlando. Ele estima que pelos menos 60% dos detentos participem das atividades de ressocialização. “Ainda pretendemos fazer muitas ações. Porém, nos falta espaço físico”, comentou o diretor.

“Estamos preparando o sentenciado para o retorno à sociedade. Quando receberem o direito de saírem do sistema penitenciário é preciso que estejam preparados profissionalmente e conscientizados”, completou Orlando.

Avaliação

A assistente social Eliéde Momesso e as professoras que acompanharam ontem o batismo do grupo de capoeira avaliaram a atividade como positiva. “Percebemos a evolução do estado emocional do sentenciado. Ele sente-se útil e produtivo aqui dentro. É fundamental para a recolocação na sociedade”, explicou a assistente social.

Todo o trabalho desenvolvido na penitenciária do São Bernardo tem a supervisão da Regional Campinas da Fundação de Amparo ao Preso Professor Doutor Manoel Pedro Pimentel. A realização das atividades no sistema prisional são feitas por meio de parcerias com a iniciativa privada.

A apresentação de capoeira dos 37 praticantes e dos dois professores arrancou muitos aplausos. Dênis repetiu várias vezes seu salto mortal. “A cadeia está na paz. Queremos mostrar com o esporte que a gente não está aqui só pensando na maldade, no crime. A gente quer praticar um esporte e até fazer uma exibição para as visitas”, disse Dênis que voou e deu piruetas recebendo saudações.