Polícia Militar atua muito além da segurança

A Tribuna - Santos - Quarta-feira, 11 de agosto de 2004

qua, 11/08/2004 - 9h12 | Do Portal do Governo

Da Reportagem

Cláudia Duarte Cunha, editora de Projetos Especiais

Com a proposta de afastar as crianças das ruas e, consequentemente das drogas, o Projeto Esculpir, desenvolvido por voluntários da Polícia Militar, é um exemplo de trabalho a favor da cidadania.

Na iniciativa, jovens de 7 a 16 anos recebem reforço escolar e têm a oportunidade de aprender dança de rua, capoeira, artesanato, teatro, ensino religioso, noções de como nagevar na internet, moral e civismo.

Segundo o coronel Perrenoud, coordenador do projeto, a ação tem como objetivo oferecer atividades culturais e educativas, visando enfatizar valores éticos, morais e cívicos aos pequenos frequentadores da casa. ‘‘Além disso, o trabalho permite que a gente se aproxime das crianças mostrando um outro lado da polícia’’.

A idéia do Esculpir surgiu há cerca de três anos e inicialmente era um trabalho voltado aos próprios PMs — numa época em que o Corpo de Saúde da Polícia Militar de Santos observou um aumento nos atendimentos decorrentes de doenças psicossomáticas, a maioria ligada ao estresse provocado pelo dia-a-dia do policial.

Esgotado, desmotivado e, em alguns casos, desvalorizado, o policial entrava em depressão e, consequentemente era afastado da rua por doenças provocadas pelo estresse.

Foi a partir daí que a PM resolveu adaptar uma área própria de 400 metros quadrados livres, para atender esses profissionais. No entanto, o espaço térreo, colorido e alegre acabou atraindo a criançada da região. Hoje, ele abriga 87 crianças, que permanecem nas atividades ali desenvolvidas nos períodos da manhã e tarde.

Aulas despertam o gosto pela religião nos jovens

Com toda a programação diária desenvolvida pelos voluntários, o Esculpir preenche o tempo livre dos menores carentes da região. Conforme a cabo Lídia Freitas do Nascimento, voluntária e uma das idealizadoras do projeto, o desenvolvimento das crianças compensa todo o esforço.

‘‘Nosso trabalho investe na base, ou seja, na educação desde a infância. Não temos infratores em nossa turma, mas muitos vivem em situação de risco. É melhor cuidar dos menores agora do que correr atrás deles no futuro’’. A policial ainda ressalta a necessidade de reforço da equipe de voluntários. ‘‘Estamos precisando de colaboradores, para qualquer que seja a atividade’’.

Susan Kelly, professora de religião, frequenta a casa duas vezes por semana e garante que a fé e o interesse das crianças pelas aulas é uma prova de que o trabalho está valendo a pena. ‘‘Eu ensino música para eles, conto histórinhas e falo sobre a importância que cada um tem perante a Deus. As crianças se mostram bem receptivas e querem conhecer mais sobre Jesus. Muitas desejam ter um relacionamento com Ele e pedem para que eu as ensine a rezar’’.

Comunicativa, Aline Carolina dos Santos tem 8 anos e participa de várias atividades. ‘‘Gosto de ler, desenhar, fazer lição e de jogar bola com os meninos. Sinto muita falta quando não dá para eu vir’’.

Já Waldir Pereira Nostardes, de 11 anos, adora jogar ping-pong. ‘‘Aqui tenho vários amigos’’. O mesmo acontece com Isaac dos Santos, com 10 anos. ‘‘Temos muitas brincadeiras e as tias ainda ajudam a gente nos trabalhos da escola’’.

Espaço ainda oferece alfabetização para adultos

Ao se integrar com a população, por intermédio do projeto, a polícia pode conhecer de perto os principais problemas sociais enfrentados pelas crianças e adolescentes da região.

Apesar das dificuldades, os resultados são conferidos na própria fisionomia da garotada. De acordo com a voluntária Lídia Freitas, no início do trabalho muitas crianças nem sequer olhavam nos olhos dela. ‘‘Alguns se escondiam debaixo da mesa. Hoje, eles conversam e se relacionam melhor, inclusive, com os próprios colegas’’.

As mudanças nos desenhos também foram observadas pela voluntária. ‘‘Eles usavam muito preto e vermelho. Chegavam, inclusive, a desenhar armas de fogo. Hoje, para nossa satisfação, as pinturas estão bem mais leves e coloridas’’.

As perspectivas para o futuro também estão bem mais otimistas, conforme Lídia. ‘‘Algumas crianças queriam ser presas, para ficarem na cadeia junto com os pais. Hoje, eles falam que vão ser policiais, bombeiros ou se mostram interessados por outras profissões’’.

A pedagoga Marinei Guerra, voluntária responsável pelas aulas de reforço escolar, ressalta que o programa não se restringe ao que é dado na escola. ‘‘A gente aproveita todos os momentos para transmitir noções de cidadania. Sinto que a cada dia conquistamos mais o carinho e a confiança das crianças’’.

Parceira de Marinei no trabalho pedagógico, a professora aposentada Denise Maria Peres explica que elas dividem as turmas de acordo com a faixa etária. ‘‘Distribuímos atividades específicas para cada grupo. Observamos as carências de ensino de cada um e procuramos trabalhar em cima disso. Às vezes fico cansada porque eles são muito levados, mas a satisfação supera tudo. Gosto muito do que faço e me identifico demais com as crianças’.

A cabo Lúcia Domingos atua no Esculpir há dois anos dando aulas de artesanato. ‘‘Fico lá todos os dias, das 8 às 11 horas. Muitos, no início se mostram desinteressados e sem vontade de aprender. Aos poucos, nosso trabalho aumenta a auto-estima deles e os resultados vão aparecendo. Para mim, o que eu dou para essas crianças não é nem metade do que elas me oferecem. Aprendo muito, inclusive quando faço visitas na casa de alguns dos alunos’’.

Além de atender os menores carentes da região, o Esculpir está com vagas para o curso de alfabetização de adultos. As aulas gratuitas, com material didático incluído, acontecem diariamente, das 17 às 19 horas.

Em parceria com a Fundação Renascer, o método de alfabetização, também aplicado por voluntários, tem metodologia aprovada pelo MEC. Após 12 meses, os alunos recebem diploma de conclusão do ensino básico e estão aptos para se matricular no fundamental.

Perfil

Nome: Projeto Esculpir.

O que faz: Baseado em conceitos de cidadania, a iniciativa, coordenada pela Polícia Militar, oferece atividades de lazer, cultura e educação para crianças carentes.

Há quanto tempo: Cerca de três anos.

Endereço: Rua Sete de Setembro, 65 – Santos – Telefone 3224-3818.