Pesquisa valoriza a maneira de falar dos caipiras

Jornal da Tarde - São Paulo - Quinta-feira, 16 de dezembro de 2004

qui, 16/12/2004 - 8h50 | Do Portal do Governo

Cientistas estão montando um banco de dados sobre o modo de falar dos moradores da região de São José do Rio Preto. Para acabar com o preconceito

CHICO SIQUEIRA

Uma pesquisa inédita levanta as características da linguagem falada pela população de sete cidades do Interior de São Paulo. O objetivo é formar um banco de dados para dar suporte a estudos sociolingüísticos sobre o modo de falar dos moradores da região de São José do Rio Preto. Com as informações do banco, será possível saber, por exemplo, se o uso do erre retroflexo, aquele de ‘porrrta’, que caracteriza o chamado dialeto caipira, tem alguma interferência na vida dos moradores ou se o preconceito lingüístico em torno do sotaque interiorano influencia o seu comportamento ou as suas condições de vida.

A pesquisa, feita por professores e alunos do curso de Letras da Universidade Estadual Paulista (Unesp), de Rio Preto, e financiada pela Fapesp e pela Unesp, é a primeira em grande escala que levará em conta o português falado no Interior do Estado.

Os pesquisadores já gravaram narrativas de 152 moradores de São José do Rio Preto e outras seis cidades fronteiriças: Cedral, Bady Bassity, Guapiaçu, Ipiguá, Mirassol e Onda Verde. O término está previsto para fevereiro de 2006 – as gravações começaram em fevereiro de 2004 -, quando o banco estará à disposição de pesquisadores e da população.

Os entrevistados foram escolhidos por faixas de escolaridade, sexo, renda e idade. Cada um faz cinco narrativas, que são gravadas em som digital e, depois de transcritas e transferidas para o computador, farão parte do banco de dados para futuras pesquisas na área.

O coordenador dos trabalhos, professor Sebastião Carlos Leite Gonçalves, diz que o projeto, batizado de Amostra Lingüística de Rio Preto (Alirp), poderá ajudar na luta para acabar com o preconceito que afeta os moradores do Interior de São Paulo desde o início do século, quando o comportamento do homem do campo passou a ser associado a uma imagem de pobreza e ignorância.

A pesquisa ocorre no momento em que essa linguagem oral, chamada popularmente de caipirês, é desprezada até mesmo por quem a usa. ‘Encontramos muitos interioranos que recusam o próprio sotaque, o erre caipira, apelando para a linguagem falada nas capitais na tentativa de fugir de uma estigmatização injustificada por parte de setores da sociedade’, explica o professor.

Segundo ele, essa situação pode levar ao desaparecimento do sotaque com o tempo. ‘Estigmatizar um homem por causa do seu sotaque é uma atitude de falta de cultura por parte de algumas faixas da sociedade’, completa.

Mas, por outro lado, o caipirês é exaltado pela intelectualidade do Interior, por meio de movimentos nas regiões de São José do Rio Preto, São Luís do Paraitinga, Botucatu e Piracicaba.

‘Trata-se de uma necessidade de recuperar as tradições culturais que estão desaparecendo’, diz o jornalista Edmilson Zanetti, do Centro de Tradições Caipiras, de São José do Rio Preto, e diretor da Folha Caipira, jornal de pautas com temas do Interior que circula nas cidades da região.