O caipira do Brasil

Correio Braziliense

ter, 22/12/2009 - 8h05 | Do Portal do Governo

Livro recupera o mito do humor brasileiro que é Mazzaropi, que conseguia bancar seus próprios filmes

Assim como grande parte dos comediantes brasileiros, Amácio Mazzaropi sentiu na pele o desprezo da crítica que sempre olhou com desdém o humor. É um estigma que acompanha a classe há tempos atingido como um soco direto nomes como Ankito, Oscarito, Grande Otelo e Os Trapalhões, trupe comandada por Renato Aragão nas décadas de 1970 e 1980. Mas todos, sem exceção, tiveram como consolo o amor incondicional do público, que abraçou o talento singular de cada um. Não seria diferente com o velho Mazza, que tem sua trajetória resgatada com o livro Mazzaropi – Uma antologia de risos, projeto que acaba de ser lançado pela Imprensa Oficial, dentro da coleção Aplauso.

“Dei o nome de Antologia de risos ao meu livro, porque acredito que o legado que Mazzaropi deixou com seus filmes, é o legado da alegria. O riso, a satisfação popular”, acredita o diretor de televisão e cinema, roteirista, produtor, escritor e músico Paulo Duarte. “Ele era amado pelo povo e me parece normal que fosse desprezado pela crítica que não conseguia enxergar além das camadas superficiais em seus filmes e por uma parte dos cineastas brasileiros que não conseguiam falar a língua do povo como ele”, critica Duarte, também um dos responsáveis pelo lançamento em DVD dos filmes do artista. Foram ao todo 34 títulos produzido ao longo de 29 anos.

“Costumo dizer que fui o cara certo na hora e nos lugares certos, pois além do interesse normal pela história do Mazzaropi, tive o privilégio de ter contato com as pessoas que detinham os direitos sobre seus filmes e fui o centralizador do interesse dessas pessoas sobre a exploração das obras dele, de maneira que posso dizer que aproveitei isso a favor da preservação da obra do artista”, destaca o autor. “Na ocasião não tínhamos nenhuma foto do Mazza e nem havíamos mapeado os verdadeiros detentores de seus filmes”, lembra.

O trabalho de 340 páginas, uma edição especial no formato, já que, tradicionalmente, os demais lançamentos da Imprensa Oficial são em pocket, conta com um valioso trabalho iconográfico, além, é claro, acompanhado de textos que narram sua trajetória no teatro, nos rádios, cinema e televisão. Mazzaropi tem presença garantida também em trabalhos que comentam algumas produções suas. “No início, diziam que eu fazia um caipira estilizado. Não é estilizado, não. Eles que não têm conhecimento da realidade brasileira”, comentou o comediante, referindo-se à caracterização do personagem criado por Monteiro Lobato em Urupês, e levado por Mazzaropi às telas em 1959. “O Jeca do Mazzaropi era um caipira em fase de transição para os tempos modernos, não em conflito, mas em adaptação a um novo mundo e as transformações da sociedade. Abria uma discussão para assuntos polêmicos, como divórcio (A banda das velhas virgens), preconceito racial (Jeca e seu filho preto), sincretismo religioso (O Jeca macumbeiro) entre outros assuntos”, analisa Paulo Duarte.

Para aqueles que sustentam o discurso de que o artista era dono de uma cinematografia simplória, quase monotemática, destituída de ousadias estéticas, o autor defende. “Acredito que ele desenvolveu uma “fórmula de sucesso” que deu certo o tempo todo. Como homem de negócio, preferiu seguir o dito popular onde ‘time que está ganhando não se mexe'”, rebate.

Fascinação

Filho de imigrantes italianos, como o próprio sobrenome acusa, Mazzaropi, nascido na grande São Paulo, demonstrou interesse para às artes ainda criança, ao se encantar vendo o avô tocar viola em público. “Ele ficou fascinado com o poder que uma pessoa podia ter em cima do palco. Dali não demorou muito para que ensaiasse e, mais tarde, com o consentimento dos pais, a dar início à carreira”, detalha Duarte. As primeiras apresentações foram pelo interior paulista, em pavilhões improvisados como teatro. Mais tarde, seguiu para o circo, escola que o levou ao teatro profissional. A próxima etapa seria o rádio, onde faria o programa Rancho alegre. “Programa que depois teve sua versão na tevê. Aliás, esse programa registrou pela primeira vez a estreia de um comediante na televisão. Portanto, Mazzaropi é o patrono dos cômicos da tevê”, chama atenção Duarte.

O cinema seria um caminho natural e o primeiro projeto viria em 1952, na Vera Cruz, com Sai da frente. Depois de três projetos na mítica companhia e mais quatro filmes pela Cinedistri, resolve vender tudo que conquistou até então na vida para produzir em 1959 Chofer de praça. “O risco foi motivado depois que ele observou que seus filmes formavam enormes filas”, comenta Dutra. “Chofer de praça foi o primeiro filme auto bancado, se ele tivesse dado errado, Mazzaropi provavelmente não teria continuado no cinema e sido fenômeno que foi”, aposta.

O ótimo desempenho do filme de estreia lhe deu estabilidade financeira para montar a PAM Filmes (Produções Amácio Mazzaropi), empresa que produziu outros 24 projetos para o cinema, todos grande sucessos nas bilheterias como Tristeza do Jeca (1961), O corintiano (1966), Betão Ronca Ferro (1970) e Portugal, minha cidade (1974).

Empreendedor e astuto administrador, dá início um ano depois, em Taubaté (SP), na construção de um enorme complexo cinematográfico que abriga locações, cenários, estúdio, além de hotel para os artistas do elenco de suas produções. “Em um país que até hoje se esmera em criar uma utópica indústria do cinema e não consegue, Mazzaropi foi o único que conseguiu criar isso na prática. Ele fazia com que um filme bancasse a produção do outro, ou seja, tinha um modelo de negócio sustentável, não dependia do governo. Desta maneira mostrou que realmente era um ótimo administrador já que tudo girava em torno de seus próprios projetos”, destaca.

Confira a entrevista completa com o autor:

De onde o interesse pela vida e obra de Mazzaropi?
Eu costumo dizer que fui o cara, certo na hora e nos lugares certos, pois além do interesse normal pela história do Mazzaropi, tive o privilégio de ter contato com as pessoas que detinham os direitos sobre seus filmes e fui o centralizador do interesse destas pessoas sobre a exploração das obras dele de maneira que posso dizer que aproveitei isso a favor da preservação da obra do artista. No início desta década, eu fui contratado para realizar a negociação (produção executiva)e a direção do projeto para o lançamento em DVD dos filmes do Mazzaropi. Na ocasião não tínhamos nenhuma foto do Mazza e nem havíamos mapeado os verdadeiros detentores de seus filmes, uma vez que havia muitos que se diziam donos de filme e não tinham direitos nenhum, da mesma maneira que algumas pessoas se dizem filhos do Mazzaropi e ele não possui nenhum filho legítimo, e seus protegidos já haviam sumido. Desta maneira após muito tempo chegamos aos detentores e a negociação foi muito complicada porque muitas pessoas tinham papéis que provavam a detenção dos filmes mas não tinham os filmes, o que nos levou ao próximo estágio que era o de encontrar as melhores matrizes possíveis para realizar uma masterização, já que seria inviável o restauro de 3 dezenas de filmes. Nesta epopéia, tive o prazer de conhecer pessoas muito importantes para a preservação da memória do Mazzaropi como Claudio Marques, Arthur e o Neto do Instituto Mazzaropi que tem um trabalho muito bonito e honestíssimo em Taubaté, também alguns pesquisadores sérios como a Profa. Olga Rodrigues na época na UNITAU e muitas pessoas que haviam trabalhado com o Mazzaropi. neste árduo caminho e das mais diversas e inimagináveis fontes e acervos, encontrei um material fotográfico maravilhoso, que após alguns anos deu origem ao livro que lanço agora.

Pode nos traçar, em rápidas pinceladas, um esboço da trajetória artística de Mazzaropi?
Ainda criança, Mazzaropi começou observando seu avô tocar viola em público e ficou fascinado a respeito do poder que uma pessoa pode ter em cima de um palco. Dali não demorou muito para que ensaiasse às escondidas e depois com o consentimento dos próprios pais e começou sua carreira nos chamados Pavilhões que eram teatros precários que percorriam todo o interior de São Paulo. Mazza passou pelo circo, foi parar no Teatro profissional, de lá chegou ao rádio onde fez o programa Rancho Alegre, programa que depois teve sua versão na TV, aliás, no dia da estréia da televisão foi o primeiro cômico a se apresentar, portanto é o patrono dos cômicos da TV. De lá, chegou ao cinema pela Vera Cruz, a maior companhia de cinema da época, e após 4 filmes foi convidado pela Cinedistri a realizar mais quatro no Rio de Janeiro. Após observar atentamente as filas que os seus filmes faziam e o peso de seu nome para a bilheteria, ele não chega a fazer o quarto filme, pelo contrário, ele resolve, vender tudo o que tinha e com o dinheiro faz o filme “Chofer de Praça”, o filme foi um sucesso estrondoso e nascia ali, a PAM Filmes, Produções Amácio Mazzaropi, onde faria 24 filmes, todos enormes sucessos e dominaria as bilheterias por 3 décadas até sua morte em 13 de junho de 1981.

Que paralelo é possível fazer entre o Jeca Tatu, de Monteiro Lobato, e o caipira construído por Mazzaropi?
O Jeca de Lobato era mais “bicho do mato”, sem instrução, doente, meio burrinho, chegou inclusive a ser considerado como uma manifestação de preconceito do autor por parte da crítica na época. O de Mazzaropi era um caipira em fase de transição para os tempos modernos, não em conflito mas em adaptação a um novo mundo e as transformações da sociedade o que além do superficial, abria uma discussão para assuntos polêmicos como divórcio (A banda das velhas Virgens), preconceito racial (Jeca e Seu Filho Preto), sincretismo religioso (O Jeca Macumbeiro) entre outros assuntos.

Quais as maiores influências recebidas por Mazzaropi?
Mazzaropi era fã de Genésio e Sebastião Arruda, pioneiros na formação popular da figura artística do caipira. Essa é a base para o caipira que ele criaria. O teatro ítalo brasileiro, na mistura da comédia e do dramalhão foi outro fator essencial na formação da dramaturgia mazzaropiana. No cinema, ele não era fã declarado de ninguém, mas observava tudo o que acontecida e em muitas ocasiões aproveitava certos fenômenos de bilheteria para realizar suas próprias comédias, como foi o caso de “Jeca Contra o Capeta”, abertamente influenciado pelo sucesso do filme “O Exorcista”, este é um exemplo, mas não é um caso isolado, ele tinha o faro para o que o público gostava de ver. Mas ao contrário do que se imagina, ele era fã incondicional do teatro paulista, Gianfrancesco Guarnieri, não perdia os shows de Elis Regina e além da MPB, era fã de rock e música clássica. Aliás, talvez a única frustração de Mazzaropi era não ser um instrumentista muito bom, ele arranhava alguns instrumentos de sopro e cordas.

Como explicar o desdém da crítica em relação a Mazzaropi?
Em um país que até hoje se esmera em criar uma utópica indústria do cinema e não consegue, Mazzaropi foi o único que conseguiu criar isso na prática. Ele fazia com que um filme bancasse a produção do outro, ou seja, tinha um modelo de negócio sustentável, não dependia do governo, era amado pelo povo e me parece normal que fosse desprezado tanto pela crítica que não conseguia enxergar além das camadas superficiais em seus filmes e por uma parte dos cineastas brasileiros que não conseguiam falar a língua do povo como ele. Existe sim, uma separação do cinema como indústria de entretenimento (o que no Brasil fora casos raríssimos e únicos como o de Mazzaropi, não existe) e de cinema como arte e estudo de linguagem, o que na maioria das vezes pelos simbolismos e excesso de signos não penetra na massa. Diante disso e some-se a isso o ego enorme da classe artística e fica fácil de entender porque ele era amado pelo público e desprezado pela crítica.

Ao criar a PAM Filmes, Mazzaropi mostrou que era possível fazer cinema em nosso país sem subsídios governamentais, batendo de frente com as constantes reivindicações de nossos cineastas mais influentes sobre a falta de apoio estatal para suas produções. Como o empresário Amazzio Mazzaropi obteve tal êxito?
Mazzaropi era um midas, tudo o que tocava virava ouro e antes do cinema foi assim no teatro, no circo, na rádio e na tv. Quando chegou ao cinema, seus primeiros filmes foram um aprendizado pra ele, mas logo em seguida ele dominou o ofício também e basta dizer que ele começou como funcionário da Vera Cruz, a Vera Cruz fechou e tudo o que a Vera Cruz sonhava em conseguir do ponto de vista “industrial” Mazzaropi, que seguiu em frente, foi quem conseguiu. Aliás, uma parte enorme de equipamentos, máquinas e pessoal foi contratado pelo próprio Mazzaropi. Já a questão de o cinema ser bancado pelo governo é um tema delicado, mas que sempre levará ao entendimento de que o cinema nacional não se sustenta por si, e enquanto depender de investimentos do governo, será sempre mais arte do que negócio. basta ver que um percentual mínimo de filmes produzidos hoje conseguem sequer empatar o custo com a bilheteria. Mazzaropi colocava fiscais nas portas dos cinemas para não ser enganado, Mazzaropi negociava o filme novo, se o exibidor garantisse que passaria ainda o filme anterior, vendia o colorido mais caro que o preto e branco, fazia pré-estréias sempre na mesma época do ano , não se expunha na tv, as pessoas para vê-lo tinham que ir ao cinema, escolhia os temas em voga nas conversar populares em cada ano, falava a língua do povo e o povo se via refletido na tela. O artista e o homem de negócios caminhavam juntos.

Ao afirmar que “a Vera Cruz foi minha escola…para o bem e para o mal” o que terá pretendido dizer Mazzaropi?
Há uma história em que um grupo de investidores estrangeiros em visita à Vera Cruz não se interessaram por nenhuma produção, quando viram trechos de filmes do Mazzaropi, resolveram optar por investir em um filme dele. Isso exemplifica de uma maneira interessante de que a Vera Cruz tinha as melhores e maiores intenções artísticas, mas não sabiam nada do negócio de distribuição. Tanto que além de Mazzaropi, o maior êxito de bilheteria da Vera Cruz foi o filme “O Cangaceiro” de Lima Barreto, que para fazer o filme teve que lutar contra toda a diretoria da Vera Cruz para conseguir apoio, pois achavam o filme “brasileiro demais”, “popular demais”. Foi observando este tipo de coisa que Mazzaropi, com seu tino comercial extremamente aguçado, aprendeu principalmente com os erros fatais da Vera Cruz e aplicou esse “expertise” da melhor forma possível na sua própria produtora, a PAM FILMES.

O que terá levado um intelectual da estatura de Paulo Emílio Salles Gomes a afirmar, em relação a Mazzaropi, que “o melhor de seus filmes é simplesmente ele próprio”?
Porque creio que pela simples ida ao cinema e observando a reação do público, podia ficar claro que não importava o nome do filme, o tema do filme, a cor do filme, enfim, as pessoas queria ver “o filme do Mazzaropi”. O nome dele virou uma grife do cinema nacional, e ele soube como ninguém explorar isso. Tanto, que depois que morreu, o nicho do cinema rural, o cinema dos Jecas, não teve mais continuidade. Ele era único e não teve seguidores. Ele era o melhor de seus filmes mesmo. E como alguns atores não cansavam de dizer, eram todos coadjuvantes do Mazzaropi.

Considera acertado dizer que até hoje ainda há resistência nos meios acadêmicos em compreender a figura do nosso caipira, daí o fato de muitos ainda torcerem o nariz quando se fala em Mazzaropi?
Sim, acho que isso acontece no meio acadêmico, no meio artístico-cinematográfico e se tivesse que resumir em uma única palavra eu diria: Bu…rrice. Porque o grau de amplitude e profundidade da penetração da obra de Mazzaropi junto ao grande público como um dos elementos formadores de nossa cultura, de nosso folclore e de nossas manifestações populares é imensurável. Isso não pode simplesmente ser subestimado. Deve ser estudado, pensado, debatido, entendido. E aos meus colegas de profissão o que eu posso dizer é que alguns podem não sentir simpatia pelo personagem “Jeca” ou pela precariedade ou limitação de linguagem de seus filmes, mas ainda assim, Mazzaropi deve ser respeitado, reverenciado e analisado como o maior homem de cinema que o Brasil já teve. Um cara que ficou bilionário fazendo cinema no Brasil. O único que conseguiu isso. Por que conseguiu? O que ele fazia? Como administrava o negócio audiovisual que tinha, enfim, se o Brasil sonha em um dia ter uma indústria de cinema, não pode ignorar a história deste homem.

Qual terá sido o maior legado de Mazzaropi para o cinema nacional?
Dei o nome de Antologia de Risos ao meu livro, porque acredito que o legado que Mazzaropi deixou com seus filmes, é o legado da alegria. O riso, a satisfação popular. Recentemente assisti ao filme “This is It” sobre os ensaios da última tour de Michael Jackson e em certo momento ele diz a seus músicos “- O público quer fuga! Quer uma experiência de escapismo. Vamos dar a eles o que eles querem! ” . Aí eu pergunto: Por que será que Michael Jackson foi o artista mais popular de sua época? Maior vendedor de discos de seu tempo? Porque me parece que os grandes artistas, aqueles que chegam até o inconsciente coletivo de sua geração, são exatamente aqueles que tem a noção bem clara do que o grande público quer, o que o grande público precisa e com sua marca imprimem em sua arte formas de suprir esta necessidade, esta ansiedade da platéia. E isso explica o porque de serem tão bem sucedidos. E mesmo após a morte de artistas assim, suas obras permanecem e causam o mesmo efeito, o mesmo impacto e a mesma satisfação. Que possamos aprender com eles e agradecer pelo legado que nos deixam e que transcendem sua própria obra e o seu próprio tempo. E nada melhor que o tempo para nos ensinar o valor que as coisas realmente tem.

Por que será que ele tinha tanto medo de ousar esteticamente?
Eu não acredito que tenha sido um medo por parte dele, mas acredito que ele desenvolveu uma “fórmula de sucesso” que deu certo o tempo todo, e como homem de negócios preferiu seguir o dito popular onde “time que está ganhando não se mexe”.Ele tinha plena consciência de seu bom gosto pessoal e de seu papel popular. Não acreditava que o seu público o entenderia se ele mudasse radicalmente. Ao mesmo tempo, pelo menos na primeira metade de sua carreira, a começar pela Vera Cruz, sempre esteve rodeado dos melhores equipamentos e profissionais à disposição no momento e em certos momentos produziu obras muito bem acabadas do ponto de vista estético (inclusive aceito como tal pela crítica) como “Casinha Pequenina” (colorido) e momentos antológicos em preto e branco como as sequências de “Sai Da Frente” , “Chofer de Praça”, “As Aventuras de Pedro Malasartes” onde a cena abraçado ao garoto é nosso proporcional a Chaplin.

Na sua opinião qual é o filme mais importante do Mazzaropi?
Mais do que os filmes, o nome Mazzaropi era a coisa mais importante que Mazzaropi tinha.

Mas se tivermos que escolher um filme, das 3 décadas podemos citar “Chofer de Praça” como o mais importante para ele, pois foi o primeiro filme auto-bancado, se ele tivesse dado errado, Mazzaropi provavelmente não teria continuado no cinema e sido o fenômeno que ele foi.
Outro é “Jeca Tatu” já sob sua produção e após “Chofer de Praça” ele retoma a figura do caipira que lhe faria a fortuna no cinema.

Você não acha que ele aproveitou mal o grande pólo/complexo cinematográfico que construiu no interior de São Paulo?
Muito pelo contrário, foi a partir dele que ele pôde deixar de ter gastos com suas produções uma vez que as locações, cenários, estúdio, hospedagem e alimentação de elenco ficavam centralizados em um só lugar e sob um custo muito reduzido. Desta maneira ele mostrou que realmente era um ótimo administrador e sempre deixou claro que toda a estrutura era montada em torno de suas próprias produções, ele fazia um filme atrás do outro, todos os anos, e não havia tempo disponível sequer para locar a mesma estrutura para terceiros. Tudo girava em torno de seus próprios projetos.

Qual a importância desse projeto que sai agora pela Coleção Aplauso?
Em primeiro lugar, após o trabalho com os dvds, poder disponibilizar um acervo iconográfico riquíssimo de um grande artista popular brasileiro, que de outra forma não viria à público senão pelo livro. Por outro, dado o perfil de enorme prestígio que a Coleção Aplauso tem, não deixa de ser um reconhecimento bem-vindo à importância do artista Mazzaropi para nossa cultura. E do homem de cinema que ele foi para o audiovisual brasileiro.

Mazzaropi teve filhos, quem são seus herdeiros?
Ele teve alguns filhos adotivos (um deles,filho da empregada), mas nenhum reconhecido legalmente, Péricles, o mais famoso, sumiu no fim dos anos 80, e não se sabe o paradeiro dele, algumas pessoas dizem que foi para o exterior e outras que ele morreu. Fora ele, qualquer outro filho do Mazzaropi que possa aparecer por aí, são ações isoladas de algumas pessoas legadas ao anônimato, interessadas em explorar o espólio e a memória do artista. O fato é que ele não deixou herdeiros legais ou naturais e seria uma irresponsabilidade alegar o contrário.

Quem, no atual cenário cultural, é sucessor do estilo do Mazzaropi? Talvez o Pedro Bismark (Nerso da Capitinga)?
Apesar de excelentes comediantes como o Bismark terem seguido com personagens “rurais”, outro fato é que não existe um sucessor do estilo Mazzaropi, nem na frente das câmeras, nem por trás delas. Ele foi único. E não canso de falar que se os produtores atuais aprendessem um pouco mais com o homem de cinema que foi o Mazza, talvez o cinema nacional estivesse em situação muitíssimo melhor do ponto de vista financeiro. Hoje o único homem de cinema que tem esta veia, que sente o faro do público atende pelo nome de Daniel Filho, e aliás, começou no cinema, em um filme do Mazzaropi. Com produções voltadas ao grande público, não se assustem se este “herdeiro” do Midas Mazza no ano que vem bater todos os recordes de público (inclusive o de “Dona Flor”) com seu novo filme “Chico Xavier”.