Nossa Caixa planeja nova oferta

Valor Econômico - Segunda-feira, 26 de dezembro de 2005

seg, 26/12/2005 - 12h55 | Do Portal do Governo

Canal Aberto
Governo do Estado de São Paulo pode vender mais 20% da participação já em 2006.

Por Adriana Cotias

 De São Paulo

Primeiro banco brasileiro a ingressar no Novo Mercado da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), a Nossa Caixa dá os primeiros passos como empresa de capital aberto e já planeja uma nova oferta pública de ações em 2006. Para o pequeno investidor, o chamariz não é só pelo potencial de valorização das ações, que já subiram 14,8% desde que estrearam na bolsa, em 28 de outubro, como também pelos dividendos que vêm por aí. Tão logo saiam os resultados de 2005, entre fevereiro e março, o banco paulista convocará assembléia de acionistas para aprovar a distribuição de 35% do lucro, acima dos 25% estabelecidos pelo estatuto.

Com a venda de mais de R$ 950 milhões em ações ordinárias (com direito a voto), na virada de outubro para novembro, a instituição controlada pelo governo do Estado de São Paulo começou bem. A demanda superou em sete vezes a operação, o varejo levou só uma pequena fatia do que reservou acima do mínimo garantido, de R$ 5 mil, e ficou no ar a sensação de que haveria fôlego para mais.

Ciente da demanda reprimida e com a finalidade de dar mais liquidez para os papéis, o diretor de Finanças e Relações com Investidores do banco paulista, Rubens Sardenberg, confirma que a intenção da Secretaria da Fazenda de São Paulo é vender uma segunda tranche de papéis já no ano que vem, se as condições de preços e de mercado estiverem favoráveis.

Tal prerrogativa já esta garantida pelo legislativo desde 2001, que tinha autorizado o governo a se desfazer de até 49% do capital no mercado. A primeira operação envolveu 28,7% da participação do Estado na instituição e há, portanto, uma parcela remanescente superior a 20%.

Os planos para 2006 incluem a venda da subsidiária de capitalização já no primeiro semestre, da empresa de consórcios e da área de ramos elementares em seguros. À frente da diretoria de Finanças desde que deixou o cargo de secretário-adjunto do Tesouro Nacional, no fim de 2002, Sardenberg conduziu não só o processo de abertura de capital como também a reorganização societária do banco paulista. Hoje, ele acumula a função de diretor de Relações com Investidores. A seguir, os principais trechos da entrevista concedida ao Valor.

Valor: A oferta pública do banco teve 70% das ações absorvidas por investidores estrangeiros, com um rateio que atendeu só 5% das reservas acima do mínimo para o varejo no Brasil. Não faltou papel?

Rubens Sardenberg: Quando se pensa numa oferta pública, a tentativa é fazer uma combinação entre investidores de longo prazo, que retenham o papel porque acreditam na história da empresa, e aqueles que vão dar liquidez para a ação. Este é o equilíbrio. O investidor de varejo, de forma geral, não é visto como de longo prazo. Mas, a operação da Nossa Caixa foi a mais pulverizada deste ano em número de CPFs (7,3 mil investidores).

Valor: O governo do Estado colocou quase 29% do capital no mercado, mas tem autorização para vender até 49%. Há planos para oferecer o lote restante já em 2006 ?

Sardenberg: Apesar da autorização, nessa primeira etapa, o objetivo era atingir os 25% do “free float” (o capital em circulação) necessário para o Novo Mercado. Foi isso mais o “green shoe” (o lote extra). Durante o “road show”, o secretário (da Fazenda, Eduardo Guardia) disse ter a intenção de vender o restante, passado o prazo legal de 180 dias, mas o governo não tem nenhuma obrigação de fazer isso dado que a situação fiscal é confortável e não há necessidade desses recursos. Mas ele mencionou que, conforme as condições do mercado, se entender que o preço dos papéis é bom para a venda da segunda tranche e se não for complicado do ponto de vista do mercado, a intenção é fazer a oferta do lote adicional em 2006. A vantagem é que isso aumenta a liquidez do papel, que pode ser incluído nos índices. E fazer em duas etapas também é uma boa demonstração de compromisso com a companhia.

Valor: A Nossa Caixa é o primeiro banco no Novo Mercado. O investidor atribui maior valor às empresas comprometidas com regras de transparência e boa governança ?

Sardenberg: Quando se pensa num banco privado, o dono está lá, defendendo os interesses da companhia, mas numa instituição pública isso é mais difuso. No momento em que o banco passa a ser acompanhando por analistas e passa a ser comparado, ele tem de melhorar progressivamente a qualidade da gestão. E no Novo Mercado tudo isso é potencializado: há padrões de governança, há a necessidade de um conselho com integrantes independentes, a prestação de informações tem de ser aprimorada. Nos “road shows”, percebemos que a questão Novo Mercado é, hoje, fundamental. É um selo. Quando se faz apresentações fora do Brasil, e uma empresa informa que vai abrir o capital no Novo Mercado ela já poupa uma discussão enorme e economiza, pelo menos, uma hora de reunião. E esse é um valor que aparece na hora de avaliar as ações. E o fato de vender ações com voto, cedendo aos minoritários o prêmio de controle de forma antecipada, também fica incorporado nos preços.

Valor: O que ainda falta fazer em termos de governança ?

Sardenberg: O banco já fez os ajustes no estatuto, já conta com conselheiros independentes na administração. Os pilares já estão colocados, mas com o capital aberto também terá um comitê de auditoria a partir do primeiro trimestre de 2006. Mas antes disso, a instituição já contava com membros independentes no seu conselho de administração. Há nomes como o do economista José Monforte, do professor da USP Nelson Carvalho e do ex-secretário de Economia e Planejamento Andrea Calabi, que foram indicados pelo controlador, mas não são membros do governo. E cada vez mais o padrão das informações tem de ser aprimorado, para permitir que os analistas façam uma avaliação correta da companhia e, ao mesmo tempo, ter um grau de “disclosure” que preserve a instituição financeira.

Valor: Como será a política de distribuição de dividendos ?

Sardenberg: O estatuto diz 25%, que é o mínimo legal, mas o conselho de administração aprovou a distribuição de 35% do lucro em juros sobre capital próprio e dividendos, mas isso precisa ainda ser aprovado pela assembléia de acionistas, provavelmente após a divulgação dos resultados do exercício de 2005. Esse é um número considerado adequado para remunerar o investidor e, ao mesmo tempo, garantir o crescimento da companhia. Ainda está aberto se a distribuição será semestral ou trimestral. Atualmente é anual, mas haverá alguma alteração, com certeza.

Valor: O lucro do banco no terceiro trimestre foi inflado por alguns efeitos não recorrentes, como a venda da área de Vida e Previdência, mas mesmo sem eles a rentabilidade sobre o patrimônio atingiu 20%, ante 18% de 2004. Esse é um novo patamar conquistado ?

Sardenberg: A Nossa Caixa colocou como objetivo aumentar a oferta de produtos, as operações comerciais do banco e o lucro do terceiro trimestre mostra isso. Em nove meses, ampliou a carteira de crédito em 28%, aumentou as receitas com tarifas e colocou mais produtos na rede. O ano de 2006 também deve vir nessa linha. A carteira de crédito deve crescer 25%, mais nas operações destinadas a pessoas físicas do que a jurídicas. Para as receitas com prestação de serviços, a estimativa é de um aumento entre 15% e 20%. Para nós, isso representa um esforço dobrado porque esses números são de crescimento orgânico, não tem aquisição, e a atividade é concentrada em pessoas físicas e pequenas e médias empresas. São operações pulverizadas e, portanto, é mais difícil ganhar volume. Mas 2006 deve ser bom para o banco. A recuperação da renda costuma ser boa para as pequenas e médias empresas, especialmente àquelas ligadas ao setor de consumo.

Valor: Com que cenário macroeconômico o banco trabalha?

Sardenberg: Usamos o consenso do mercado como guia. A economia deve crescer 3,5% em 2006, um pouco mais ou menos. A inflação deve ficar no intervalo da meta, entre 4% e 4,5%, com menor pressão dos preços administrados. O dólar, num intervalo de R$ 2,40 a R$ 2,50 e a taxa de juros declina para 15,5%, mas acho que essa projeção está um pouco otimista e a Selic pode ser de 16%, 16,5% ao ano. O importante é que há uma tendência de queda, há um movimento claro nessa direção. Não parece que haverá nenhuma mudança significativa na economia, mesmo sendo ano eleitoral. Os riscos são mais externos do que locais. Se surgir algum problema lá fora que interfira no fluxo e que afete a liquidez e houver alguma pressão no câmbio, daí o Banco Central pode reagir. A rigor, o Brasil melhorou muito, o risco diminuiu, a balança comercial e as reservas estão num nível confortável e o câmbio é flutuante. E a política do BC de reduzir o endividamento em dólar é muito importante. Isso corta o canal de transmissão das turbulências para as finanças públicas. Quando o Brasil tinha aquele endividamento, a desvalorização do real tinha de ser equilibrada com a alta dos juros.

Valor: Em que estágio está a venda da recém-criada subsidiária de capitalização ? E quando o banco começa a vender apólices de ramos elementares (veículos, residência)?

Sardenberg: Estamos trabalhando para que o processo seja concluído no primeiro semestre, mais para o primeiro trimestre do que para o segundo. Embora mais simples do que a venda da

Nossa Caixa Seguros e Previdência

, é sempre bom prever algum tipo de adiamento por conta de liminares. Na área de ramos elementares já temos um acordo para começar a vender produtos de terceiros na rede e até o fim do ano que vem, o controle da empresa também deve ser vendido.

Valor: E quais são os planos para a área de gestão de recursos ?

Sardenberg: A área já conta com uma diretoria independente. E no BC há um processo que consolida isso, com o pedido de autorização para a criação da DTVM, para que a empresa seja uma “asset”, aos moldes do Banco do Brasil. A intenção é ampliar a gama de produtos. A operação ainda está concentrada no setor público e a idéia é aumentar a participação do varejo.