Neschling mostra disposição e ressalta brilho de Tchaikovski

Folha de S.Paulo - Terça-feira, 8 de julho de 2008

ter, 08/07/2008 - 10h59 | Do Portal do Governo

Folha de S.Paulo

O programa tinha um carioca e um paulista, mas bom mesmo foi o russo. Uma execução vigorosa da pouco conhecida sinfonia “Manfred”, de Tchaikovski, foi o ponto alto da apresentação da Osesp na abertura do 39º Festival Internacional de Inverno de Campos do Jordão, no sábado. Regente assistente da orquestra, o chileno Victor Hugo Toro empregou o que tinha de convicção e energia para dar vida a “Desenredo”, do carioca João Guilherme Ripper, compositor residente do festival. Com colorido “nordestino” e permeada por citações que iam de Piazzolla a Wagner, a obra, em três movimentos, deveria concentrar seu interesse maior no movimento final, que, emulando os desafios entre os cantadores sertanejos, reproduzia o embate estético entre nacionalismo e dodecafonismo que caracterizou a música brasileira do pós-guerra. O problema é que Ripper sobrecarregou a textura orquestral, condenando os esforçados solistas (Anderson Luiz de Souza, tenor, e Vitor Ladeira, barítono) à inaudibilidade; o texto, à ininteligibilidade; e o público, ao tédio. Em seguida, Toro deu lugar ao titular John Neschling, para o “Choro para Clarineta”, do paulista Camargo Guarnieri, em seu primeiro concerto desde a oficialização de sua saída do cargo, em 2010. Apesar do empenho da orquestra, do maestro e do excelente clarinetista Sérgio Burgani, a obra, embora não desprovida de mérito, não deixou de suscitar a impressão de “monotonia” já apontada por Caldeira Filho em crítica de 1959. O melhor, felizmente, ficou para o final. Desde a reformulação da Osesp por Neschling, em 1997, o grupo vem sendo integrado por boa quantidade de músicos da Rússia e de outros países eslavos de enorme afinidade com a produção de Tchaikovski e seus compatriotas. Com a ambição de descrever quatro cenas de um drama em versos de Lord Byron carregado de fantasmagoria, incesto e culpa, “Manfred” tem uma hora de retórica arrebatada e orquestração grandiosa, cujo brilho foi ressaltado pela leitura idiomática e empenhada de Neschling e seus comandados. Influiu decisivamente no resultado a boa disposição do regente. Dizem que Neschling vai ao festival contra a vontade, mas o que se viu foi um maestro concentrado e estimulado, que parecia mais leve depois de acertar sua saída da orquestra. Não que deixasse de haver tensão no ar. O Auditório Claudio Santoro fervilhava com boatos dando conta de que a Secretaria Estadual de Cultura estaria exercendo, para remover Clodoaldo Medina, diretor executivo do evento, e Roberto Minczuk, diretor artístico, o mesmo tipo de pressão política que fez para forçar a saída de Neschling da Osesp.

O jornalista IRINEU FRANCO PERPETUO viajou a convite do festival. FESTIVAL DE INVERNO DE CAMPOS DO JORDÃO – ABERTURA

Avaliação: bom

Programação: veja os próximos concertos em www.festivalcamposdojordao.org.br; até 27/7