Mostra cria cantinhos em plena Oca

Folha de S.Paulo - Segunda-feira, 7 de julho de 2008

seg, 07/07/2008 - 9h57 | Do Portal do Governo

Folha de S.Paulo

Como preencher 8.000 metros com algo que é um cantinho, um violão, só bim bom, bim bom, bim bim, e não tem mais nada não? A resposta da exposição “Bossa na Oca”, comemoração dos 50 anos da bossa nova que será inaugurada hoje para convidados e abre amanhã para o público, não está nos Dolby Surround e Imax da vida contemporânea, mas em várias áreas para poucas pessoas, onde se pode ouvir (e ver) música em baixo e bom som, ou até escutar o silêncio.

Os curadores Marcello Dantas e Carlos Nader são os responsáveis por fazer o grande se render ao mínimo, algo coerente, aliás, com a arquitetura de Oscar Niemeyer, que projetou a Oca. O evento conta com 240 caixas de som, mas, se tudo der certo, cada visitante só ouvirá o que está bem perto dele.

“Tudo reverbera na Oca. Seria impossível ouvir bossa nova de outro jeito”, explica Dantas. “O ajuste é delicado. Se errar o ponto, vira pizzaria”, diz Nader.

Mas “Bossa na Oca” vai bem além de escutar músicas já extremamente conhecidas. A visita começa, no térreo, com fotos de personagens e acontecimentos de 1958 (Niemeyer, Brasília, Pelé, a viagem da cadela Laika à lua etc.), para mostrar que, no ano em que João Gilberto gravou “Chega de Saudade”, havia muito mais coisas no ar do que os aviões de carreira. “O mundo estava mudando e precisava de uma trilha sonora.

João Gilberto entrou num quarto em que havia um botijão de gás e riscou o fósforo”, diz Dantas, numa metáfora explosiva para a suave bossa nova.

Princípio intimista

No mesmo andar, há seis estações de áudio que estão sendo chamadas de jukeboxes. O visitante escolhe na tela a música que quer ouvir, e o som não vaza para o vizinho. Toda a exposição segue esse princípio. No subsolo, dez minidocumentários passam simultaneamente sem que um interfira no outro. Estão neles imagens raras do célebre concerto de 1962 no Carnegie Hall, em Nova York, e do show “A Noite do Amor, do Sorriso e da Flor”, realizado no Rio, em 1960.

No primeiro andar, há três ambientes em que são exibidos “Vou Te Contar”, curta-metragem de Dora Jobim sobre o avô; “Vinicius de Moraes”, edição feita por Miguel Faria Jr. de cenas que ficaram de fora do seu filme “Vinicius”; e uma versão reduzida de “7 x Bossa Nova”, série dirigida por Belisário Franca. Cada espectador tem a sua própria caixinha de som.

Nos 15 minutos editados por Dora, o público poderá ver um Tom ainda acanhado em programas de TV nos EUA -explicando “Garota de Ipanema” em português mesmo- ou íntimo em cartas para a família ou para o amigo Vinicius.

“Acho que ser neta dele já é um filtro gigante na hora de selecionar as imagens, de editar e procurar retratá-lo. [Contou] meu envolvimento, o amor por ele, a intimidade com os arquivos da família”, diz Dora. Será difícil não sentir falta de imagens em movimento de João Gilberto. Mas é que ele não autoriza o uso de praticamente nenhuma. É o caso, por exemplo, do concerto que fez com Tom Jobim em 1992, no Teatro Municipal do Rio.

“Mas ele está em todo lugar”, afirma Dantas. “O silêncio dele é ensurdecedor”, diz Nader. Silêncio mesmo se dá na câmara anecóica [sem eco] do primeiro andar, onde se escuta só o próprio corpo. O silêncio é um dos elementos fundamentais da bossa nova, e, se Caetano Veloso estiver certo, só João pode ser melhor do que ele.

BOSSA NA OCA

Quando: ter. a dom., das 10h às 21h; de amanhã a 7/9

Onde: Oca (av. Pedro Álvares Cabral, s/nº, portão 3 do pq. Ibirapuera; tel. 0/xx/11/4003-2050; livre)

Quanto: R$ 20; grátis às terças