Milena: do Projeto Guri para a Suíça

Jornal da Tarde

ter, 20/10/2009 - 8h25 | Do Portal do Governo

Revelada pelo projeto, que dá aulas a carentes, a violoncelista vai estudar música na Europa 

A violoncelista Milena Salvatti, de 25 anos, é uma daquelas pessoas capazes de transformar o astral de um ambiente, mesmo antes de começar a tocar. Talvez seja esse bom humor que tenha chamado a atenção das pessoas que a ajudaram a realizar seus sonhos. O apoio foi longe, mas exatamente até Basel, na Suíça, para onde a paulistana embarcou anteontem, para aprender alemão e, na sequência, fazer mestrado. 

Filha de pais separados, Milena foi criada pela mãe e os avós no bairro Jardim São Paulo, na zona norte da cidade. Apesar das dificuldades financeiras, desde pequena se mostrou interessada e estudou desenho e balé – seu primeiro contato com a música. O segundo e definitivo ficou por conta do irmão superdotado, que a levou para ver uma orquestra. “Quando vi o violoncelo achei maravilhoso. Começaram a tocar e me lembrei do som que ouvia nas aulas de dança. Tive certeza: eu quero fazer isso pelo resto da minha vida”, disse em entrevista ao JT, um dia antes de viajar. 

O primeiro contato com o instrumento ocorreu no Projeto Guri, que busca a inclusão social por meio da música (leia mais abaixo), aos 17 anos. “Lembro a primeira aula, um desastre”, ri. 

De lá pra cá, Milena fez seis anos de aula prática e teórica, com o professor de violoncelo Itagyba Abondanza, prestou e passou no vestibular da Unesp (Universidade Estadual de São Paulo), estudou com o violoncelista Ricardo Fukuda e teve como mestre o músico polonês Zygmunt Kubala, que morreu em 2007. 

O golpe de sorte definitivo veio no fim do ano passado, quando foi indicada para substituir um músico da Ensemble Ópera Nova Zurich, a Orquestra de Zurique. “Eu estava terminando a faculdade, o Fukuda me indicou para ficar no lugar do celista, que não pode vir ao Brasil. Fiquei nervosa, mas eles gostaram tanto que me levaram para a Argentina”, diz. Por lá, mais um susto: “Não é que o músico tinha marcado de dar um workshop?”. Milena assumiu o compromisso do rapaz, e não deu uma aula, mas sim duas, tudo na base do ‘portunhol’. “Foi daquele jeito, coloquem o ‘dedito’ no ‘celito'”, brinca. 

Depois das apresentações, o diretor da orquestra convidou Milena para entrar para o grupo. “Me chamaram para fazer um teste na universidade de Basel, consegui o apoio do Guri para fazer a viagem”, conta a jovem. Lá, ela surpreendeu a banca. “Perguntaram com quantos anos eu havia começado a tocar, respondi 17, mas eles entendiam 7. Tive que corrigir várias vezes, eles ficaram espantados (com o fato de ela ter começado tarde, na visão deles).” 

Milena passou, mas havia ainda um empecilho: a língua. “Eu não sabia que precisava falar alemão”. Até que o destino deu um jeito. “Ganhei uma bolsa para estudar o idioma, tenho de aprender a falar até abril. Depois, faço um novo teste para começar o mestrado”. 

Projeto tem planos para ajudar ex-alunos 

O Projeto Guri iniciou suas atividades em 1995, pela Secretaria de Cultura. Em 1997, foi criada a Sociedade Amigos do Projeto Guri, que hoje coordena o programa em parceria com o governo. Atualmente, são atendidos 40 mil alunos, que frequentam gratuitamente cursos de instrumentos musicais, aulas de canto e coral, teoria e iniciação. 

O projeto conta com 362 polos (sedes), sendo 316 abertos à comunidade em todo o Estado de São Paulo, e 46 instalados em unidades da Fundação Casa(antiga Febem-SP). “O único requisito é estar matriculado na escola”, explica Alessandra Costa, diretora executiva do Guri. 

Além de Milena, a associação mantém no exterior a ex-aluna de violino Anna Murakawa, que está na Academia Nacional de Música Pancho Vladigerov, em Sofia (Bulgária). A iniciativa faz parte do novo Fundo de Bolsas, que tem o objetivo de ajudar ex-alunos. “A formação no Guri é básica, a ideia agora é prestigiar ex-alunos que desejam continuar os estudos. Muitos alunos se formam e acabam vindo dar aula no projeto”, diz Alessandra.