Malha fina do Detran

O Estado de S.Paulo - Terça-feira, 11 de março de 2008

ter, 11/03/2008 - 11h36 | Do Portal do Governo

O Estado de S.Paulo

O Departamento Estadual de Trânsito (Detran) de São Paulo apanhou em malha fina 19 mil motoristas de todo o Estado e 200 auto-escolas da região metropolitana de São Paulo e da cidade de Santos suspeitos de envolvimento em fraudes para a renovação ou obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Finalmente as autoridades parecem determinadas a iniciar um combate mais efetivo contra a máfia que infesta um setor marcado por escândalos. E a operação começou no foco gerador dessa máfia: as auto-escolas, agora batizadas de Centros de Formação de Condutores.

Num país onde ocorre anualmente mais de 1,5 milhão de acidentes, que provocam a morte de 35 mil pessoas, a capacitação do motorista é fundamental para a redução da violência no trânsito. Mas a venda de carteiras de motoristas e a ‘facilidade’ com que qualquer pessoa despreparada se habilita a dirigir um veículo num dos trânsitos mais caóticos do mundo têm anulado os efeitos disciplinadores de uma legislação formalmente cada vez mais rígida.

Nos últimos anos, o Código de Trânsito Brasileiro e a Resolução 168 do Conselho Nacional de Trânsito foram marcos importantes na evolução das regras para a obtenção e renovação da CNH. A legislação tornou obrigatória para os candidatos a motoristas a freqüência comprovada a 15 horas-aula práticas e 30 horas-aula teóricas antes das provas. Para os motoristas habilitados antes de 1999 a renovação da carteira ficou condicionada à participação no Curso de Primeiros Socorros e Direção Defensiva ou à realização de uma prova, por meios eletrônicos, sobre esses temas.

Para controlar a freqüência nos cursos e a realização das provas de acordo com as novas normas, foi criado o Sistema de Gerenciamento Eletrônico de Formação dos Condutores. Médicos, psicólogos e funcionários de auto-escolas credenciadas pelo Detran alimentam um banco de dados com cadastros de candidatos a motoristas ou à renovação do documento. Sistemas de biometria e monitoramento eletrônico também passaram a fazer parte do esquema de controle da formação dos motoristas.

Mas alguns donos de auto-escolas se dedicaram a encontrar brechas nas leis e na tecnologia para manter seus esquemas fraudulentos. E conseguiram. Em novembro de 2005, o próprio sindicato das auto-escolas denunciou a falcatrua: para anular o controle tecnológico, donos de auto-escolas enquadravam seus candidatos a motoristas na categoria ‘exceção digital’, condição que deveria ser usada apenas para quem tivesse impressões digitais pouco profundas. Sem o controle biométrico, perdia-se o único sistema que poderia comprovar a freqüência nos cursos ou a identidade de quem realizava as provas.

Depois disso, vieram os dedos de gesso ou silicone para burlar a biometria e até um software-robô, programado para alimentar o banco de dados central com as informações das pessoas que deveriam estar em aula. Assim, dedos falsos e robôs respondem à chamada em nome de quem deveria estar em aula ou realizando as provas teóricas e práticas.

Nos últimos seis meses, das 1.218 auto-escolas da capital, 182 tiveram as atividades suspensas porque vendiam laudos médicos e realizavam outras falcatruas para burlar os resultados de provas. A investigação realizada pelo Detran inclui médicos, psicólogos, funcionários das Circunscrições Regionais de Trânsito e policiais suspeitos de envolvimento no esquema.

No âmbito administrativo, essas auto-escolas poderão perder a licença de funcionamento caso as fraudes sejam comprovadas. Criminalmente, os proprietários responderão por falsidade ideológica e falsificação de atestados médicos.

As autoridades bloquearam as habilitações dos motoristas suspeitos de se beneficiarem de processos irregulares. Comprovada a fraude, serão indiciados em inquérito policial por falsidade ideológica.

A operação iniciada pelo Detran precisa ser permanente e rigorosa, para evitar que proprietários de auto-escolas e motoristas inescrupulosos colaborem para tornar o trânsito de São Paulo ainda mais perigoso e caótico.