Mais R$ 900 milhões para o SUS

O Estado de S. Paulo - Domingo, 1º de agosto de 2004

seg, 02/08/2004 - 14h01 | Do Portal do Governo

Luiz Roberto Barradas Barata

Por determinação constitucional, o SUS (Sistema Único de Saúde) atende a todos os brasileiros, independentemente de quaisquer quesitos. Uma realidade que, se ainda longe do seu ideal ponto de maturação, é infinitamente mais democrática e abrangente do que o período anterior à Constituição de 1988, quando apenas os trabalhadores que contribuíssem com a Previdência Social tinham garantidos o direito aos serviços da rede pública de saúde.

Em que pesem as deficiências e obstáculos inerentes a um sistema de saúde em construção e que não faz distinção de classes sociais, o fato é que todo cidadão brasileiro tem acesso garantido ao SUS, inclusive os 38 milhões de usuários de planos de saúde.

Os principais hospitais do Brasil, como o Hospital das Clínicas de São Paulo, Incor, rede Sara, Dante Pazzanese, Santa Casa de Porto Alegre, Hospital das Clínicas da Unicamp e Hospital Albert Einstein, apenas para citar alguns, realizam atendimento gratuito pelo SUS e dispõem de médicos, equipamentos e serviços de ponta, comparáveis aos países mais desenvolvidos e com qualidade muitas vezes superior à maioria dos hospitais da rede particular.

Vivemos um momento crucial para a consolidação do SUS como um dos melhores e mais justos sistema de saúde do mundo. E, nesse sentido, dois aspectos são fundamentais: o correto gerenciamento da saúde e a ampliação dos recursos financeiros para custear o sistema, uma vez que cada vez mais brasileiros procuram atendimento no SUS desejando viver mais e melhor.

Embora atendam apenas 22% da população do país, não são raras as vezes em que os planos de saúde deixam de corresponder às expectativas de seus beneficiários. O assunto está na ordem do dia, depois dos extraordinários reajustes de até 82% propostos pelas seguradoras aos clientes com contratos anteriores a 1999, e que têm sido alvo de liminares por todo o país impedindo aumentos superiores a 11,75%.

Além disso, o cidadão que paga mensalmente por um convênio médico vez por outra é surpreendido por uma negativa e descobre que seu plano não cobrirá uma internação mais prolongada ou o tratamento de doenças complexas como câncer, hepatite C, Mal de Alzheimer, Aids e insuficiência renal crônica.

As dificuldades se estendem ao atendimento de urgência e emergência. Qualquer vítima de acidente ou infarto, por exemplo, é encaminhado ao hospital mais próximo. Em boa parte das ocorrências, o paciente, mesmo tendo plano de saúde, é atendido pelo SUS. E a seguradora, nesse caso, não desembolsa um centavo pelo atendimento prestado ao usuário, em contrapartida à mensalidade paga ao longo de anos. Sem contarmos a generalizada inexistência de assistência farmacêutica no âmbito dos convênios médicos, o que obriga seus dependentes a procurar os remédios de que necessitam na rede pública do SUS.

Hoje, operadoras e seguradoras são obrigadas, legalmente, a ressarcir o Sistema Único de Saúde nos casos de internação hospitalar, mas isso não vem ocorrendo, pois as empresas alegam que o atendimento feito pelo SUS é um dever do Estado e que, portanto, não haveria razão para o ressarcimento.

O número cada vez maior de cidadãos migrando para a rede pública de saúde é um fenômeno que deve se ampliar ainda mais, à medida em que se melhore a qualidade dos serviços oferecidos, com a redução das filas e tempos de espera. Consequentemente, o SUS passa a ser pesada e significativamente onerado, necessitando, mais do que nunca, de novas fontes de recursos para garantir o atendimento médico-hospitalar gratuito a todos os brasileiros.

Dessa forma, julgamos conveniente iniciar o debate nacional em torno de uma nova proposta, que prevê o ressarcimento, ao Fundo Nacional de Saúde, de R$ 2,00 do valor de cada mensalidade paga pelos 38 milhões de usuários dos planos. De imediato, a medida representaria um incremento anual de R$ 912 milhões para o SUS.

Importante ressaltar que não se trata da criação de um novo imposto, mas de racionalizar a forma como as seguradoras podem ressarcir o sistema público pelo atendimento prestado aos beneficiários de planos privados de saúde. E, evidentemente, não há qualquer justificativa para que a contribuição de R$ 2,00 por mensalidade seja repassada pelos planos a seus clientes.

Conquista de todos os brasileiros, o Sistema Único de Saúde é a única alternativa para 142 milhões de pessoas que não podem pagar um plano particular. Como não nega atendimento a quem quer que seja, o SUS e o Brasil merecem, das operadoras e seguradoras, o devido e justo ressarcimento que estamos propondo.

Luiz Roberto Barradas Barata, 51, é médico sanitarista e secretário de Estado da Saúde de São Paulo