Internet vicia em qualquer idade, aponta HC

O Estado de S.Paulo - Quinta-feira, 17 de maio de 2007

qui, 17/05/2007 - 13h02 | Do Portal do Governo

O Estado de S.Paulo

Análise com grupo de usuários compulsivos da web mostra resultados diferentes do padrão americano

O Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas derrubou o mito de que surfar durante horas na internet é uma mania exclusiva de jovens estudantes. Mostrou que a compulsão pela web pode atingir homens e mulheres, de qualquer idade, classe social e nível cultural. A conclusão surgiu a partir da análise do primeiro grupo de voluntários do projeto de Dependentes de Internet do Ambulatório Integrado dos Transtornos dos Impulsos.

Os candidatos do primeiro grupo – 15 integrantes, de 18 a 73 anos -, clinicamente diagnosticados como compulsivos pela internet, submeteram-se às sessões de análise cognitiva (terapia focal) durante seis meses. E só agora os resultados começam a ser divulgados. Na segunda-feira, o ambulatório abriu inscrições para o segundo grupo (que podem ser feitas pelo telefone 3069-6975).

“Fiquei surpreso com os resultados. Apesar de o grupo ser pequeno, eles vão contra as estatísticas americanas que servem de base no mundo inteiro”, diz Cristiano Nabuco, coordenador do projeto. Isso porque o estudo brasileiro mostrou que aqui a dependência não é um problema exclusivo dos jovens.

O acesso compulsivo à rede é diagnosticado como um distúrbio psiquiátrico do mesmo patamar que as dependências do álcool, do jogo e das compras. Nos Estados Unidos, de 6% a 10% dos 189 milhões de internautas sofrem desse mal. No Brasil, os estudos ainda são tímidos.

“Montei o primeiro grupo de tratamento no Hospital das Clínicas no meio do ano passado, quando as queixas em relação ao uso abusivo da internet passaram a ser mais constantes no meu consultório particular”, diz Nabuco. O Núcleo de Estudos em Psicologia e Informática da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) também dá orientação a pacientes que não conseguem desgrudar do computador. Atualmente 15 internautas são monitorados pelos especialistas. “Fazíamos uma orientação pontual até começar a receber vários pedidos de ajuda”, diz Andrea Nolf, de 36 anos, uma das psicólogas do núcleo.

A PUC presta orientação – ironicamente, via e-mail. “Não queremos que a internet desapareça da vida das pessoas. O objetivo é fazer com que os usuários consigam ter controle sobre o uso da ferramenta”, justifica Andrea. Psicólogos e paciente trocam um par de e-mails por semana. Nas mensagens, o paciente é convidado a pensar em pontos importantes da vida, como trabalho e relacionamentos, freqüentemente prejudicados com a obsessão pela web.

Vários fatores são levados em conta até que um internauta receba o diagnóstico de viciado em internet. “Um dos sinais de alerta é, por exemplo, o paciente deixar de trabalhar para ficar na internet”, diz Nabuco. “Temos no grupo, um executivo, com doutorado, que fica trancado na sala da empresa em que trabalha, durante todo o dia, acessando sites de pornografia. Quando chega em casa, não quer saber da mulher.” Segundo Nabuco, no grupo há ainda uma aposentada que cai em depressão quando fica longe do computador.

“A maioria desses internautas está insatisfeita com a própria vida”, afirma Kimberly Young, autora do livro Caught in the Net (numa tradução livre, Fisgado pela Rede), resultado de três anos de pesquisa. “Antes de mergulhar no mundo virtual, o paciente costuma sofrer de distúrbios contemporâneos como ansiedade, depressão e stress.”