Inspeção Técnica Veicular

Folha de S.Paulo - Segunda-feira, 26 de dezembro de 2005

seg, 26/12/2005 - 14h04 | Do Portal do Governo

Inspeção Técnica Veicular

RUBENS LARA e OLIMPIO DE MELLO ALVARES JR.

Em artigo publicado pela Folha, o presidente da Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo (CET), Roberto Salvador Scaringella, lembrou mais uma vez da “Urgência da inspeção veicular”. Nunca será demais ressaltar os prejuízos que incidem sobre os brasileiros com a ausência desse programa, especialmente em comunidades com grande concentração de veículos, sempre mais expostas às ameaças das frotas que circulam livre e impunemente em péssimas condições de manutenção, apesar das ações de fiscalização exercidas pela Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental) no Estado de São Paulo. Reiteramos essa urgência, mas gostaríamos de acrescentar alguns pontos para reflexão.

Há doze anos, amparados em proposta elaborada pela Cetesb, os órgãos ambientais locais foram autorizados pelo Conama (Conselho Nacional de Meio Ambiente) a implantar regionalmente programas de inspeção das emissões de gases, fumaça preta e ruído de veículos. Em 1995, o Contran (Conselho Nacional de Trânsito) regulamentou a inspeção de segurança que permitia aos governos estaduais implantarem a Inspeção Técnica Veicular (ITV) de caráter integrado, envolvendo aspectos de segurança e emissões de gases poluentes.

No entanto, depois de idas e vindas, essa inspeção foi revogada pelo Contran, gerando instabilidade institucional. Essa deliberada paralisia da autoridade máxima de trânsito resultou na transferência da definição das regras da ITV para o Congresso, onde um ambicioso e polêmico projeto de lei tramita há quatro anos, concentrando o poder da execução da inspeção veicular em toda extensão do território nacional no Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) -vinculado desde 2003 ao Ministério das Cidades.

Nunca será demais ressaltar os prejuízos que incidem sobre os brasileiros com a ausência desse programa

Devido a essa demora para início efetivo da ITV, milhares de vidas são lesadas ou perdidas, causando prejuízos sociais de bilhões de dólares.

Quanto às causas da poluição, sabe-se que a falta de manutenção da frota, as conversões inadequadas de motores para uso de gás natural e o uso de catalisadores de reposição falsos comprometem os pesados investimentos que os órgãos ambientais, a indústria automobilística, os refinadores de petróleo e os consumidores de veículos fizeram nos últimos 18 anos, desde o início do Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores.

A Cetesb constatou recentemente em medições de emissões reais, realizadas em parceria com a Fundação Hewlett em 114 veículos leves de passageiros escolhidos ao acaso, que os sete mais poluentes emitiam a mesma quantidade de poluentes que os 107 demais; ou seja, 6% desses veículos produziam 50% de toda a poluição gerada na amostra, demonstrando um grande impacto na saúde pública. O que fazer?

Considerada como a medida de maior eficácia no combate à poluição do ar no curto prazo, a ITV identificaria com facilidade esses poluidores, obrigando-os a corrigirem suas desconformidades, sob pena de não obterem a licença de circulação. Os veículos pesados e leves excessivamente barulhentos (incluídas as motocicletas), que somam cerca de 10% da frota, seriam, da mesma forma, impedidos do licenciamento anual até a correção dos problemas.

Além da redução da poluição atmosférica e sonora, os benefícios da ITV são ainda mais amplos: aumento da fluidez do tráfego, com reduções adicionais das emissões; diminuição de até 5% no consumo global da frota -ajudando no controle do lançamento de gases do efeito estufa; geração de dezenas de milhares de empregos diretos e indiretos; total controle sobre a frota inspecionada -cadastro geral, quilometragem por categoria e ano-modelo, veículos clonados etc.; geração de um poderoso banco de dados sobre defeitos e falhas por ano-modelo, oferecendo transparência aos consumidores sobre a qualidade dos veículos; melhoria do padrão de qualidade dos serviços da rede de assistência técnica e maior tranqüilidade nas transações de veículos usados.

Entretanto, as experiências de sucesso e fracasso da ITV em outros países alertam que esses benefícios dependem da cuidadosa definição do modelo de gerenciamento, de rigorosa auditoria e da correta execução operacional dos programas, bem como da atualização permanente dos procedimentos de inspeção, compatíveis com a evolução tecnológica da frota. Somente a execução regionalizada da ITV favoreceria todos esses requisitos.

Rubens Lara, 62, mestre em direito, é presidente da Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo) e secretário-geral da Abema (Associação Brasileira de Entidades de Meio Ambiente).

Olimpio de Mello Alvares Jr., 48, formado em engenharia mecânica pela Escola Politécnica da USP, especializou-se em emissões veiculares na Suécia e Japão e trabalha no setor de Operações, Programas e Regulamentos da Cetesb.