Grafite de SP nos muros do mundo

O Estado de São Paulo - Terça-feira, dia 4 de julho de 2006

ter, 04/07/2006 - 11h13 | Do Portal do Governo

Osgêmeos, sucesso nos EUA e no Japão, vêem a cidade como uma galeria a céu aberto

Carla Miranda

Boa parte da tinta vinha de uma funilaria e o spray, de uma gráfica. As telas? Um muro aqui, outro adiante, principalmente no Cambuci, zona sul, onde nasceram e cresceram. Hoje, Gustavo e Otávio Pandolfo estão bem longe das dificuldades de 20 anos atrás. Viraram Osgêmeos, sucesso em muros e galerias dos Estados Unidos ao Japão, mas sem esquecer das origens – e das improvisações. “O lado bom de improvisar é desenvolver um estilo próprio”, explica Gustavo.

Nos EUA, já foram tema de reportagem no New York Times e chegaram a vender telas por mais de US$ 19 mil. A galeria que representa os gêmeos idênticos de 32 anos é outra prova do estrelato: a Deitch Project também é responsável pelas obras de Jean Michel Basquiat, ícone maior dos artistas de rua.

Os dois só ficam dois meses por ano no Brasil e estão de malas prontas para um giro que começa em agosto pela Alemanha, continua na Holanda e termina só no ano que vem.

Em São Paulo, uma galeria a céu aberto para eles, é possível encontrar seus grafites embaixo do Viaduto do Glicério, em estações da CPTM, como Ipiranga e Lapa, ou num muro qualquer perto da sua casa. “O melhor daqui é que em 15 minutos andando de carro você encontra um bom lugar para pintar”, diz Otávio. Como é esse lugar? “Uma das coisas que mais contam é pensar que ali não vão apagar. A gente gosta de andar pelas ruas e ver o que a gente pintou”, afirma Gustavo. Aliás, nas conversas, um sempre completa a frase do outro. Isso quando os dois não falam juntos.

Reconhecer o grafite dos irmãos é simples: as figuras se sobressaem, diferentes de tudo que há nos muros da cidade. A começar pelo tipo de tinta com que são feitas. Em vez de utilizarem o tradicional spray, Osgêmeos fazem a maior parte do trabalho com látex. As latinhas só entram para contornar as ilustrações, mesmo assim algo bem sutil, numa técnica desenvolvida por eles.

“Fomos aprendendo em casa, estudando e pintando na rua. Como não havia muitas referências de grafite no Brasil, isso nos forçou a criar uma linguagem diferente”, diz Gustavo. “Hoje, qualquer adolescente vai na internet e vê todos os tipos de grafite, as tintas, os melhores sprays. Quando começamos, qualquer revista que saísse um grafite lá no fundinho a gente já achava sensacional.”

As figuras humanas representadas pelos dois têm cabeça levemente desproporcional, com braços e pernas finos. Nas roupas, todos os detalhes possíveis: estampas, imitações de lantejoulas e cores formam um tecido de sonho nos muros.

“Nossa pintura é uma mistura de tudo o que a gente vê, ouve, sonha”, diz Otávio. “É o nosso dia-a-dia. Tem coisa que é muito nossa, outras que são brincadeira e também mensagens do cotidiano”, completa Gustavo.

O mais recente trabalho dos dois é modificar a cara da Galeria Fortes Vilaça, na Rua Fradique Coutinho, Vila Madalena. A casa vai virar uma enorme cabeça para a exposição O Peixe que Comia Estrelas Cadentes, a primeira de Osgêmeos no Brasil. “Quem for visitar vai entrar dentro do nosso pensamento, que durou apenas um segundo”, diz Gustavo.

Na mostra, que abre no próximo dia 27, eles dizem que o público não deve esperar grafites. “Para a gente, grafite é o que está na rua, com toda a surpresa. Na galeria, fazemos pintura e escultura, de forma planejada”, diz Gustavo.