Fundação Procon mostra falta de informação e abusos em cartões

Valor Econômico - São Paulo - Sexta-feira, 10 de dezembro de 2004

sex, 10/12/2004 - 10h15 | Do Portal do Governo

Janes Rocha
De São Paulo

A maior parte dos usuários de cartões de crédito não recebe o contrato contendo propostas e regras do serviço ou só recebe depois de aderir. Além disso, os contratos são redigidos de forma que dificulta a compreensão por pessoas de menor grau de escolaridade e apresentam ‘indícios de cláusulas abusivas’ contra o consumidor. As constatações são de uma pesquisa da Fundação Procon, órgão vinculado à Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo, em cooperação com a Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Os resultados da pesquisa, realizada entre março e abril, com base nas reclamações contra as administradoras que chegaram ao Procon nos anos de 2002 e 2003, serão discutidos em uma reunião com a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito (Abecs), em data ainda não definida, disse Dante Kimura, diretor de Programas Especiais do Procon. Os nomes das operadoras com maior número de queixas serão mantidos em sigilo até que o assunto seja discutido com a Abecs, disse Kimura.

A pesquisa foi realizada em duas etapas. Na 1ª, as entidades ouviram 100 usuários de cartões, selecionados entre aqueles que registraram reclamações contra o serviço no Procon. A partir dos depoimentos, colhidos por telefone, os técnicos que trabalharam na pesquisa traçaram um perfil dos usuários dos cartões de crédito. Na 2ª etapa foram levantados os problemas mais freqüentes na relação com as operadoras. A maior parte dos usuários está na faixa entre 29 anos e 39 anos e tem ‘bom nível de formação escolar’ (29% têm ensino médio e 27% têm superior completo), distribuídos equilibradamente entre homens e mulheres. A maioria (62%) tem renda mensal média de até R$ 1,2 mil.

Os entrevistados disseram saber como funciona o cartão (70%) e em grande parte adquiriram o serviço através de ‘abordagem pessoal’ nas agências bancárias. Do total, 56% disseram ter recebido cópia do contrato, mas só 23% no momento da contratação, os demais não receberam ou só receberam depois. Dos entrevistados que disseram desconhecer o funcionamento do cartão de crédito, 58,3% disseram não ter recebido cópia do contrato. Além disso, ainda é ‘significativo’ (18%) o percentual de pessoas que aderem ao cartão enviado para a sua residência sem ser solicitado.

Kimura diz que a falta de informação é preocupante, especialmente no momento em que a base de cartões está crescendo em direção à população de mais baixa renda. ‘Não somos contra a disponibilização de cartões para as pessoas de baixa renda, mas o problema é a falta de informação sobre as taxas de juros cobradas, as condições de pagamento mínimo e a falta de clareza dos contratos’, afirmou.

Na segunda parte da pesquisa foram analisadas cópias dos contratos das operadoras com maior índice de reclamações. Segundo Kimura, foram identificados ‘indícios de cláusulas abusivas’ que devem ser revistas pelas operadoras. Alguns abusos são a operadora se rogar o direito de fazer descontos de eventuais débitos que não o débito automático da fatura e casos em que elas não se responsabilizam por eventuais restrições ao uso do cartão na rede credenciada – por exemplo, quando o comerciante diz que só aceita o cartão para pagamento de compras acima de determinado valor. ‘A menos que o comerciante prove que isso está em contrato, não é permitido e a responsabilidade é da operadora que o credenciou’, explica Kimura.