Fiscalização identifica esquema do IPVA

Folha de São Paulo - Domingo, dia 11 de junho de 2006

dom, 11/06/2006 - 11h50 | Do Portal do Governo

Secretaria da Fazenda de SP aponta indícios de sonegação por donos de veículos com a ajuda de despachantes do PR

Ao menos 250 proprietários utilizam endereços de quatro escritórios no Estado vizinho, onde pagam quase a metade do imposto

FÁTIMA FERNANDES

CLAUDIA ROLLI

DA REPORTAGEM LOCAL

A Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo identificou pelo menos quatro despachantes no Paraná que estariam possibilitando fraude no pagamento do IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores). Eles teriam montado um “esquema de sonegação” ao cederem endereços de escritórios e residências a proprietários de veículos de São Paulo para possibilitar a transferência de registros de carros para o Estado do Paraná.

Em São Paulo, o IPVA corresponde a 4% do valor venal do veículo de passeio a gasolina. No Paraná, a 2,5%. Isso permite que o dono de um carro no valor de R$ 100 mil pague R$ 2.500 de imposto no Paraná e R$ 4.000 em São Paulo.

Pelo menos 250 proprietários de veículos (pessoas físicas e jurídicas) utilizam endereços -três em Curitiba e um em Londrina- de quatro despachantes de forma irregular, segundo informa a Fazenda paulista, que identificou esses casos a partir de investigações feitas no Paraná por agentes do seu serviço de inteligência.

São donos de carros que têm residência e empresas com sedes no Estado de São Paulo, mas declaram ao Detran do Paraná domicílio naquele Estado.

O Código de Trânsito Brasileiro estabelece que o veículo deve ser registrado no município onde mora o dono.Endereços

Em abril deste ano, fiscais da Fazenda paulista encontraram 69 veículos registrados no endereço onde funciona o “Despachante Altemar”, no bairro de Bacacheri, em Curitiba (PR). O escritório, segundo fiscais, está situado em um imóvel residencial -uma pequena placa anuncia o estabelecimento.

Nesse mesmo endereço também estariam estabelecidas uma filial de uma locadora de veículos -a Córsega Ltda.- e a filial de uma empresa de informática -a Masterlease Locação e Informática Ltda.

Duas pessoas físicas que residem em Campinas (SP) também declararam o endereço desse despachante para registro de seus veículos no Paraná.

A Córsega e a Masterlease têm sedes e filiais no Estado de São Paulo, informa a Fazenda paulista. Procurados, os responsáveis pela locadora e pela empresa de informática não atenderam a reportagem. O despachante Altemar Roberto Domingues diz que é representante da locadora de veículos e que age de acordo com a lei.

Em Londrina (PR), fiscais da Fazenda paulista identificaram 25 pessoas físicas que declararam ao Detran endereço de residência onde funciona o Despachante Oscar -localizado em um pequeno centro comercial, que reúne nove lojas.

Mais de 90% dos veículos dessas 25 pessoas, segundo informa a Fazenda paulista, são importados. Elas pagariam cerca de R$ 13 mil de IPVA, se seus veículos estivessem cadastrados no Detran de São Paulo.

Apesar de os donos desses veículos declararem residência em Londrina, parte desses carros tem levado multas de trânsito em várias cidades paulistas onde os proprietários desses veículos residem -um deles é um empresário milionário do interior paulista, segundo a Folha apurou. Procurado várias vezes, o despachante Oscar Silva Engmann não ligou de volta.Dados cruzados

Para identificar os escritórios de despachantes que teriam esquema para sonegar o pagamento do IPVA, a Fazenda paulista cruzou informações de vários bancos de dados -cadastros da Receita Federal, do INSS, do Detran (onde o dono do carro tirou a carteira de habilitação), da zona eleitoral e do próprio banco de dados de contribuintes do IPVA. Também verificou os locais em que esses donos de carros pagam contas telefônicas e de energia.

“Além de escaparem do pagamento do IPVA em São Paulo, esses motoristas procuram fugir de punições, como multas de trânsito [isso porque nem todas as cidades estão incluídas no Renainf -Registro Nacional de Infrações de Trânsito]. No caso dos carros de luxo, a razão principal da transferência do registro para o Paraná seria evitar pontos na carteira de habilitação”, diz Antonio Carlos de Moura Campos, diretor-adjunto da Deat (Diretoria Executiva da Administração Tributária) da Fazenda paulista.

Os proprietários de carros que estariam participando de esquema para fraudar o pagamento do IPVA serão intimados pela Fazenda paulista.

“Eles vão ter de comprovar que têm domicílio fora do Estado de São Paulo, no Paraná. Se não, terão de transferir o registro dos carros para São Paulo.”

Se não for comprovado o domicílio no Estado do Paraná, o proprietário terá de pagar o imposto devido, acrescido de correção monetária e multa, que pode chegar a até 5% do valor venal do veículo.

O relatório dessa investigação feita pelos fiscais da Fazenda paulista será entregue nos próximos dias às autoridades policiais do Detran paulista para abertura de inquérito policial. “Houve crime de falsidade ideológica para escapar do pagamento do IPVA em SP. Esse é um expediente fraudulento”, diz Campos. A lei 8.137, de 1990, estabelece que é crime contra a ordem tributária “fazer declaração falsa (…) para eximir-se total ou parcialmente do pagamento de tributos”.

De dezembro de 2005 a março deste ano, 43,5 mil carros foram transferidos de São Paulo para outros Estados. Desse total, 22 mil veículos foram para o Paraná, segundo informa a Fazenda paulista, que estima perda da ordem de R$ 100 milhões por ano de IPVA devido à transferência de veículos para outros Estados e de R$ 300 milhões nos últimos cinco anos. Em 2005, a arrecadação do imposto no Estado de São Paulo foi de R$ 4,65 bilhões.