Febem abre unidade para mães adolescentes

O Estado de S. Paulo - Segunda-feira, 8 de março de 2004

seg, 08/03/2004 - 9h42 | Do Portal do Governo

Espaço permitirá que jovens que derem à luz durante a internação fiquem com os filhos

ADRIANA CARRANCA

A adolescente L. completa 16 anos quarta-feira. Só irá comemorar, no entanto, dez dias depois, quando entra no 7.º mês de gestação. ‘Não vejo a hora de o bebê nascer. É tudo o que sempre sonhei’, diz, com sorriso no rosto, segurando um brinquedo, que até parece ser dela própria, de tão menina. Além da precocidade, a gravidez de L. tem outro agravante: ela está internada na Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem), que inaugura hoje a Casa das Mães.

A unidade foi criada por causa do aumento de casos de gravidez entre adolescentes, já registrada pelo Censo 2000 – de 14,17% no número de crianças nascidas de mães entre 15 e 19 anos, desde 1980 – e que se reflete agora na Febem. Em números absolutos, são apenas dez meninas, mas já representam cerca de 15% do total de internas da unidade da Mooca, onde a Casa das Mães funciona a partir de hoje. Nos dois quartos destinados à unidade, as camas são intercaladas a berços. A pintura infantil nas paredes e nas cortinas coube às próprias internas. Os brinquedos e roupas de bebê foram doados por moradores da Mooca.

Apesar das dificuldade, L. está feliz. Terá seu bebê por perto, por pelo menos seis meses, tempo ideal para amamentação, segundo especialistas. O bebê já tem nome e é duplo: Kettellin, escolhido por ela, com ‘dois t’s e dois i’s para ficar mais bonito’, e Inara, dado pelo pai, morto por traficantes aos 22 anos, quando L. já estava na Febem. A notícia da morte do namorado, com quem morava havia nove meses, e o resultado do exame de gravidez vieram ao mesmo tempo. ‘Fiquei perdida. Mas agradeci a Deus por estar presa, porque se estivesse lá fora poderia estar morta’, diz L., abraçando a barriga. ‘Hoje, me sinto vitoriosa, porque serei capaz de trazer uma pessoa ao mundo.’

‘A menina quando se descobre grávida vive um drama. Na Febem, essa questão é muito mais complicada. Em geral, trata-se de uma gravidez indesejada, aliada a um passado complicado e ao sofrimento da privação de liberdade. São meninas ainda em desenvolvimento, encontrando seu caminho, e gerando ao mesmo tempo’, diz a coordenadora das unidades femininas da Febem, Maria Aparecida de Souza Tonet.

Até então, a medida de internação era suspensa e elas eram atendidas por uma ONG por até quatro meses. Depois disso, se o juiz determinasse a volta para a Febem, o destino do bebê era definido por uma assistente social – um parente ou instituição de atendimento a crianças abandonadas.

‘A volta era muito complicada. O contato com o mundo lá fora aliado ao sofrimento da separação provocavam revolta e havia um retrocesso no processo de recuperação’, diz Maria Aparecida. ‘Trata-se de uma ruptura extremamente prejudicial no trabalho socioeducativo. Era preciso começar tudo de novo.’

Foi o que aconteceu com D., de 17 anos, mãe de Guilherme, agora com 1 ano e 9 meses. ‘Quando a assistente social veio buscar o meu bebê, eu entrei em desespero’, diz ela, internada desde os 15. O bebê foi entregue à avó, mãe de D., que teve de voltar à unidade, depois de dar à luz. ‘Coloco as fotos dele na cama para, à noite, só pensar em reencontrar meu filho. Mas sei que estou perdendo os momentos mais importantes da vida dele, como vê-lo falar ou começar a andar.’

Com a Casa das Mães, as adolescentes ficarão com os filhos por seis meses,, prazo que pode ser estendido, caso a adolescente não seja desinternada durante o período – elas são avaliadas a cada três meses pela Justiça e o tempo máximo de internação é de três anos. Durante a gestação e o pós-parto, serão acompanhadas por médicos do Hospital Estadual Leonor Mendes de Barros.

O contato com as famílias também será estimulado. D.M., de 16 anos, está no 8.º mês de gravidez. O pai da criança, com quem morava havia oito meses, também está na Febem. Por carta, eles trocam notícias sobre a gravidez. Na última, ele aprovava o nome do filho, sugerido por internas: Michael Douglas. ‘Não me lembro dos filmes dele, mas achei o nome bonito.’